Revista Exame

As 100 melhores cidades do Brasil para investir em negócios

Cada vez mais cidades planejam seu desenvolvimento com metas de longo prazo. Algumas das melhores para fazer negócio no país estão entre elas

Parque Ibirapuera, em São Paulo: a cidade conta com a melhor infraestrutura do país (Cris Faga/ NurPhoto/Getty Images)

Parque Ibirapuera, em São Paulo: a cidade conta com a melhor infraestrutura do país (Cris Faga/ NurPhoto/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 5 de outubro de 2017 às 05h55.

Última atualização em 5 de outubro de 2017 às 05h56.

Em março, a prefeitura de São Paulo lançou um site que perguntava aos paulistanos os sonhos que tinham para a cidade nas próximas décadas. O objetivo era colher ideias para nortear o desenvolvimento local até 2054, quando a metrópole completará 500 anos de fundação. O chamado recebeu mais de 23.000 colaborações escritas online nos dois meses seguintes. A maioria era sobre segurança pública e trânsito, problemas críticos na capital paulista, mas houve também sugestões de novos conjuntos habitacionais, postos de saúde, creches e centros de lazer.

Os dados foram tabulados por técnicos da prefeitura com assessoria da startup Colab, que mantém um aplicativo para as pessoas relatarem problemas urbanos, da organização social Comunitas e da consultoria de gestão McKinsey. As informações viraram pauta de audiências públicas, que sinalizaram quais projetos de melhoria urbana deveriam ser implantados pelo prefeito João Doria (PSDB) e o que deveria ficar para as próximas gestões. “Até o fim do ano, vamos lançar um livro que queremos que sirva de ‘manual de bordo’ para quem estiver à frente da prefeitura paulistana até 2054”, diz Paulo Uebel, secretário de Gestão de São Paulo, responsável pelo programa.

Algumas medidas já estão em vias de sair do papel. Em setembro, a prefeitura anunciou investimentos para equipar a Guarda Municipal, que vai reforçar as tarefas de ronda e policiamento ostensivo em lugares públicos — atualmente, a força tem como foco a proteção de prédios da própria prefeitura. Até o fim da gestão atual, em 2020, o objetivo é diminuir em 10% os crimes de oportunidade, como são chamados os furtos a pedestres, que subiram 10% nos cinco primeiros meses do ano.

São Paulo é referência em planejamento de cidades no Brasil, e isso garante a ela pontos extras em levantamentos sobre os melhores lugares para fazer negócio no país. Em 2008, os vereadores paulistanos foram pioneiros em aprovar uma lei que obriga os gestores públicos a demonstrar num programa de metas, logo no início de cada gestão, as prioridades para os quatro anos seguintes, os indicadores que atestarão se elas foram cumpridas e os recursos necessários para cada projeto. Na capital paulista, três prefeitos já passaram pelo sistema, que pressupõe demonstrar para a população de onde virá o dinheiro para cada novo investimento: Gilberto Kassab (PSD), Fernando Haddad (PT) e, agora, João Doria. O resultado disso é mais controle sobre as finanças públicas e menos risco de a prefeitura sofrer de má gestão fiscal. Em São Paulo, as dívidas municipais corresponderam a 90% das receitas em 2016, segundo dados levantados pela consultoria Urban Systems, especializada no desenvolvimento das cidades. No ano anterior, a proporção era de 180%. “São valores ainda altos, mas em trajetória de queda, o que demonstra uma cidade a caminho do equilíbrio fiscal”, diz Thomaz Assumpção, presidente da consultoria.

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Desde 2014, a Urban Systems elabora, a pedido de EXAME, um ranking dos 100 municípios brasileiros que reúnem as condições mais favoráveis para a instalação de empresas. São considerados os que têm mais de 100 000 habitantes. “Cidades em que a sociedade civil é provocada a pensar no futuro costumam ter bons indicadores sociais e ser bons locais para fazer negócio”, afirma Assumpção.

Neste ano, São Paulo tomou o lugar da bicampeã Barueri, localizada em sua região metropolitana. No levantamento da Urban Systems são checados 28 indicadores de desenvolvimento social, capital humano, infraestrutura e desenvolvimento econômico. A melhoria dos indicadores fiscais, somada à abundância de universidades e escolas técnicas e à maior oferta de transporte público no Brasil, deu a São Paulo o título de melhor cidade para fazer negócio.

Fábrica de celulose em Três Lagoas: a cidade sul-mato-grossense é um oásis de empregos | Fabiano Accorsi

INSPIRAÇÃO INTERNACIONAL

Há outros municípios brasileiros seguindo o exemplo de planejamento. Mais de 50 cidades no país instituíram por lei programas de metas como os de São Paulo, obrigando cidadãos, vereadores e gestores públicos a pensar no futuro das cidades. Em algumas delas, como Belo Horizonte e Niterói, além de apresentar os objetivos para a administração em andamento, os gestores também se propuseram a desenvolver planos estratégicos para 20 ou 30 anos à frente.

Entre as 100 maiores cidades brasileiras, a consultoria Macroplan mapeou 15 que já têm planejamento de longo prazo. “Quando há uma combinação de boa liderança e cobrança da sociedade, planos desse tipo dão muito resultado”, afirma Claudio Porto, diretor da Macroplan. A inspiração para as cidades brasileiras são as grandes metrópoles reconhecidas mundialmente pelos bons indicadores sociais e econômicos. Nova York, por exemplo, lançou um primeiro plano estratégico em 2007, durante a gestão do prefeito Michael Bloomberg. É uma tentativa de preparar a cidade para receber cerca de 1 milhão de novos moradores até 2030.

Uma série de objetivos foi estabelecida no PlanNYC, como construir moradias acessíveis e sustentáveis para os novos habitantes, assegurar que cada um deles more a uma distância de até 10 minutos de caminhada de uma área verde e reduzir 75% do descarte de lixo em aterros.

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Não é preciso ser uma metrópole como Nova York ou São Paulo para perceber a importância de planejar o futuro. Mesmo pequenas cidades do interior têm feito as primeiras investidas nessa direção. É o caso de Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, com seus 113 000 habitantes. A cidade é sede de duas das maiores fábricas de papel e celulose do país: a Fibria, que se instalou lá em 2009, e a Eldorado, três anos depois. Os investimentos tornaram Três Lagoas um oásis de geração de empregos em meio à crise econômica e dobraram o tamanho da população. Em 2016, o saldo de contratações foi de 3.500 postos de trabalho, o mais alto entre os municípios pesquisados.

O bom resultado se refletiu no levantamento da Urban Systems. Três Lagoas foi a melhor no quesito desenvolvimento econômico e subiu 16 lugares no ranking geral de melhores cidades para fazer negócio, chegando ao 62o lugar neste ano. Mas a expansão também trouxe problemas: a extensão da mancha urbana aumentou 36% nos últimos dez anos. Os novos moradores optaram por viver em casas construídas em loteamentos abertos às pressas e sem infraestrutura de asfalto, esgoto tratado e iluminação.

No ritmo atual, a mancha urbana aumentará em mais 50% até 2030, quando a cidade deverá ter 220.000 habitantes. O resultado de uma cidade espalhada é que o poder público precisa gastar mais para garantir qualidade de vida aos cidadãos — se a expansão continuar sem freio, será necessário 1,7 bilhão de reais extras nas próximas duas décadas para levar infraestrutura a toda Três Lagoas.

Por isso, desde o ano passado, mais de 1 000 moradores foram entrevistados sobre o que almejariam para a cidade até 2030, num projeto chamado de Três Lagoas Sustentável, financiado pelo Banco Mundial e por grandes empresas com operação local. As ideias que surgiram das entrevistas ajudaram a traçar cenários alternativos — e mais baratos — para a expansão urbana de Três Lagoas.

Num deles, em que a abertura de loteamentos seria limitada e a construção de prédios residenciais estimulada com leis de zoneamento mais flexíveis, o custo da prefeitura para universalizar os serviços públicos cairia para 700 milhões de reais até 2030. A pressão popular fez com que o material servisse de base para o novo Plano Diretor da cidade, aprovado no primeiro semestre deste ano. “Todos os estudos originados no projeto deverão nortear o planejamento e a melhoria da administração pública”, diz o prefeito Angelo Guerreiro (PSDB).

A criação de planos de longo prazo tem sido impulsionada também por iniciativas globais. No Brasil, o programa Cidades Sustentáveis, executado por entidades como a Rede Nossa São Paulo e o Instituto Ethos, estimula os municípios a desdobrar para si os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, lançados em 2015 pela ONU.

Trata-se de uma extensa lista de metas que cada país se comprometeu a perseguir para promover a inclusão social, o desenvolvimento sustentável e a governança democrática no mundo até 2030. “É preciso encontrar um elemento mobilizador como esse para encorajar os prefeitos a planejar”, diz Jorge Abrahão, coordenador do programa, que oferece orientação às cidades interessadas. “Adotar essa agenda significa melhorar a relação com a sociedade, evitar o desperdício de dinheiro e conseguir acesso a novas fontes de recursos.”

Avenida em Salvador: a capital baiana discute um plano para 2049, quando fará 500 anos | iStock Unreleased/Getty Images

Antever os problemas para solucioná-los de maneira ordenada é uma novidade na maioria das cidades. Nas mais jovens, como Sinop, em Mato Grosso, a resistência felizmente parece ser menor. Fundada nos anos 70, Sinop foi batizada com a sigla da Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná, que desenhou o traçado e desenvolveu a ocupação da região. “Somos uma cidade que nasceu do planejamento”, diz a prefeita Rosana Martinelli (PR). Mesmo assim, quando a administração decidiu elaborar o primeiro plano estratégico do município em 2012, foi preciso partir do básico — os funcionários da prefeitura desconheciam conceitos de gestão e não sabiam como acompanhar os resultados.

Para entender melhor como as coisas funcionam, a opção foi adotar um plano curto, com data marcada para acabar, em 2016. A ferramenta deu tão certo que, agora em outubro, a prefeitura deve lançar uma nova versão — desta vez, com um horizonte de 20 anos. O documento lista 13 objetivos, como garantir educação de qualidade, assegurar o crescimento urbano ordenado e elevar a receita do município, desdobrados em mais de 50 metas pontuais. Em cada uma delas, é apontado o indicador que deve ser monitorado para mostrar se os esforços estão funcionando ou não.

O desenvolvimento de um plano estratégico em Sinop foi parte de um programa de apoio aos municípios de iniciativa do Tribunal de Contas mato-grossense. “Fazemos planos estratégicos para o tribunal desde 2006. A melhoria em nossa gestão nestes dez anos foi tão grande que resolvemos apresentar a ferramenta também para as cidades”, diz Naíse Freire, coordenadora do projeto.

A primeira leva de municípios selecionados para participar abrangia os maiores do estado — com 135.000 habitantes, Sinop foi a terceira colocada no quesito desenvolvimento econômico do ranking da Urban Systems. Seus gestores receberam treinamento, acompanhamento de uma consultoria contratada pelo Tribunal de Contas e acesso gratuito a um sistema de controle das metas. Outras cidades foram acrescentadas ao grupo aos poucos — a ideia é chegar a 40 delas planejando o futuro.

Cada vez mais gestores públicos percebem que pensar no futuro é importante — mas qual é a chance de planejamentos de cidades serem efetivos, e não um mero amontoado de aspirações? Qual é o risco de as cidades planejarem demais — e executarem de menos? “A burocracia retarda as decisões porque quer ter todas as respostas antes. Mas um planejamento para uma cidade é, antes de tudo, um compromisso com a simplicidade e a imperfeição”, afirma Jaime Lerner, urbanista que tornou Curitiba uma cidade-modelo em planejamento urbano e mobilidade quando foi seu prefeito, nos anos 70.

Mais que uma montanha de dinheiro, a inovação, para acontecer, precisa ter espaço para começar. O caso dos corredores exclusivos de ônibus em Curitiba — hoje sendo implantados em mais de 250 cidades pelo mundo — é uma prova. “Na época, acreditava-se que uma cidade com 1 milhão de habitantes precisava ter um metrô, coisa que não tínhamos recurso para construir. O essencial foi começar com uma linha de ônibus para apenas 50 000 passageiros por dia, para entender que a solução mais simples também podia funcionar”, afirma Lerner.

Sinop, em Mato Grosso: a cidade, forte no agronegócio, começou a planejar seus próximos 20 anos

Em Salvador, a tentativa de planejar e agir ao mesmo tempo tem direcionado esforços da prefeitura. Está sendo elaborado um plano estratégico, o Salvador 500. Como no caso de São Paulo, a ideia é pensar a cidade quando ela completar 500 anos, em 2049. Seus objetivos são amplos, como tornar Salvador uma metrópole menos desigual, reestruturar a mobilidade urbana e promover a sustentabilidade.

Enquanto audiências públicas, diagnósticos e estudos acontecem de um lado, de outro a administração começou a trabalhar num plano para resolver uma série de pequenos gargalos institucionais rapidamente — o Salvador 360, como é chamado, abrange 360 ações e investimentos de 3 bilhões de reais que serão finalizados até 2020, quando termina a gestão do prefeito Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM).

“Adotamos um viés mais fazedor e menos aspiracional. Algumas ações são muito pequenas, e outras enormes, mas, se elas tiverem um impacto real na economia da cidade em dez ou 20 anos, entram no plano”, diz Guilherme Bellintani, secretário de Desenvolvimento e Urbanismo de Salvador. São iniciativas como a simplificação do sistema de licenciamento de obras, um mutirão de regularização fundiária e parcerias para oferecer microcrédito a empreendedores de baixa renda.

Assegurar a sobrevivência de planos de longo prazo é um desafio enorme num país como o Brasil, que ainda não conseguiu construir uma cultura de continuidade de gestões. “Em desenvolvimento de cidades, muito pouco se faz em uma só gestão”, diz o urbanista Carlos Leite, diretor de intervenções da SP Urbanismo, empresa ligada à prefeitura paulistana. Cidades colombianas, como Bogotá e Medellín, conseguiram sair do fundo do poço em duas décadas porque tiveram gestões seguidas que mantiveram os projetos, focados principalmente em mobilidade e segurança pública.

Nesse período, elas foram capazes de construir plataformas para que os cidadãos acompanhassem os resultados das intervenções e dessem visibilidade aos projetos. “A divulgação do trabalho foi tão grande que conquistou os cidadãos. Agora é difícil um novo prefeito simplesmente ignorar o que já está planejado”, afirma Leite. No Brasil, talvez seja hora de preparar a legião de cidadãos-fiscais para seguir de perto o que as prefeituras, com seus primeiros planos verdadeiramente de longo prazo, conseguirão entregar.

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