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"Não vou participar dessa crise", diz presidente da Totvs

Em sua primeira entrevista como diretor-presidente da Totvs, Rodrigo Kede Lima explica como pretende enfrentar a desaceleração no mercado de TI


	Rodrigo Kede Lima: antes de mudar para Totvs, ele era vice-presidente global de estratégia da IBM
 (Germano Luders/Exame)

Rodrigo Kede Lima: antes de mudar para Totvs, ele era vice-presidente global de estratégia da IBM (Germano Luders/Exame)

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Da Redação

Publicado em 2 de outubro de 2015 às 16h15.

São Paulo — Ainda era madrugada no brasil quando, num voo de São Paulo para Nova York no dia 18 de maio, o executivo carioca Rodrigo Kede Lima, vice-presidente global de estratégia da IBM, pegou o smartphone e enviou a mensagem: “Quero. Boa noite”.

Era uma resposta a um convite que Laércio Cosentino, presidente da Totvs, empresa com sede em São Paulo, líder no segmento de softwares de gestão, havia feito horas antes. “O Laércio falou: ‘Está na hora de você assumir o comando. Entra no avião, pensa e me liga. Só quero saber se você quer. O resto a gente acerta depois’ ”, diz Lima. 

Em junho, Lima já havia assumido o cargo de diretor-presidente da Totvs. O plano é que ele fique até três anos num processo de transição, período em que vai responder a Cosentino. Nesse primeiro momento, Lima cuida do dia a dia das operações e Cosentino continua trabalhando no planejamento e dando atenção à relação com clientes estratégicos.

Em sua primeira entrevista após a mudança, Lima fala sobre o desafio de assumir o novo cargo justamente num momento em que a economia brasileira caminha para uma forte retração, ninguém arrisca precisar quando voltará a crescer de forma sustentada e até mesmo o setor de tecnologia da informação começa a sentir os efeitos da de­sa­ce­le­ra­ção.

“Está caindo uma tempestade e, por mais que se tenha um guarda-chuva, todo mundo vai se molhar um pouco. Mas gosto de repetir: não vou participar dessa crise”, diz Lima.

Exame - O mercado de software e TI, que vinha registrando crescimento de dois dígitos até 2013, agora está sofrendo muito com a desaceleração da economia?

Lima - Claro que ninguém passa ileso. Está caindo uma tempestade e, por mais que se tenha um guarda-chuva, todo mundo vai se molhar um pouco. Na Totvs, estamos mais cautelosos nos investimentos. Nos últimos trimestres, tivemos uma desaceleração. Dito isso, não devemos sofrer um impacto significativo.

Continuamos fechando negócios e acreditando que dá para crescer. Gosto de repetir: não vou participar dessa crise. Quando a economia voltar a crescer de forma consistente, todo mundo vai ficar otimista de novo. Para sair na frente, é preciso ser otimista antes dessa hora.

Exame - Que tipo de medida o país deveria adotar para apressar a saída da crise?

Lima - A próxima onda de desenvolvimento terá de ser baseada na melhoria da competitividade e da eficiência do ­país. Além de portos, aeroportos e estradas, é necessário melhorar a infraestrutura ligada à tecnologia. Precisamos melhorar a banda larga fora dos grandes centros e as telecomunicações em geral. Isso vai, com certeza, tornar o país mais competitivo.

Exame - A Totvs é conhecida por ter crescido fazendo dezenas de aquisições. O senhor vai manter essa estratégia?

Lima - Isso não vai mudar. Nossos maiores concorrentes são empresas de nicho. Por isso, às vezes faz sentido comprar. São empresas com produtos competitivos, uma base de clientes boa e que chegaram ao limite do crescimento. Quando se integra uma empresa dessas na cadeia de distribuição da Totvs, o potencial aumenta. Atuamos em dez segmentos, do varejo à agricultura.

Exame - A Totvs não está contrariando a tendência mundial das empresas de tecnologia, que estão cada vez mais se especializando em poucos setores?

Lima - Apesar de a Totvs ter se diversificado, não fugiu de sua essência. Tudo o que a gente adquire é para aumentar nossa capacidade de atender nossos clientes. Não estamos entrando em outras ­áreas de tecnologia. A Totvs não quer ser uma provedora de computação em nuvem. Não quer ser uma empresa que vai prover mobilidade.

Exame - No ano passado, a Totvs reforçou a oferta de um novo modelo de comercialização de software. Além da venda de licenças, a empresa passou a oferecer assinaturas, pelas quais os clientes pagam uma mensalidade em vez de comprar os softwares. O senhor pretende rever esse modelo?

Lima - Não. Pelo contrário. Vamos acelerar esse processo. Num primeiro momento, esse modelo de assinaturas pressiona nossa receita para baixo. Isso porque o cliente que antes comprava tudo numa única vez passa a pagar menos mensalmente. Mas, por outro lado, a assinatura diminui a barreira de entrada para novos clientes. Ao oferecer as duas opções, nossa estratégia se fortalece no médio e no longo prazo.

Exame - Num momento em que não se vê o fim da atual crise, o que o faz pensar que os clientes vão se comprometer com um pagamento mensal?

Lima - No nosso modelo, o cliente pode entrar e sair na hora que quiser. Além disso, não estamos falando de algo supérfluo, como a assinatura de um serviço de música online. São soluções ligadas aos negócios da empresa.

Exame - A atuação da Totvs no exterior ainda é pífia — no ano passado, apenas 1,9% da receita veio de fora do Brasil. Isso vai mudar?

Lima - Nossa participação é pequena, mas já está quase o dobro desse 1,9%. Em breve, todos saberão o número exato. O mercado internacional cresceu mais do que o brasileiro. Claro que uma coisa é sair de 2% para 4% ou 5%.

Outra bem diferente é ter 30% do portfólio no exte­rior. Existe a vontade de sermos mais global e estamos atrás de oportunidades. Mas a Totvs não precisa disso para continuar sendo bem-sucedida.

Exame - Sua chegada representa uma mudança marcante: será o primeiro presidente da empresa depois do fundador, que está há 32 anos no cargo. Ajuda ou atrapalha o fato de a Totvs ter decidido que o senhor ainda responderá a Cosentino por um prazo de até três anos?

Lima - Substituir um presidente que ficou cinco anos na função é uma coisa. Substituir o fundador é outra. Já estou tocando a operação no dia a dia. O Laércio, por sua vez, está focando mais alguns redesenhos, planejamento e a relação com clientes estratégicos.

É importante que ele esteja por perto durante um período até eu me sentir confortável para assumir toda a operação. Quando esse momento chegar, o Laércio vai continuar como investidor, participando das decisões do conselho de administração.

Exame - Existe algum gatilho para que a transição ocorra definitivamente?

Lima - No dia em que conseguir desempenhar meu papel plenamente, acho que o Laér­cio vai dizer: ‘Não preciso estar mais aqui. Está na hora de ir para o conselho’.

Exame - Não gera confusão quando os diretores da empresa têm duas pessoas para se reportar?

Lima - Até agora não gerou nenhum tipo de dúvida. Temos uma relação de longa data. Antes de assumir o novo cargo, era conselheiro da Totvs. Já conhecia toda a equipe, já existia o respeito dos executivos. Mas, é claro, as pessoas podem falar com ele também.

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