Revista Exame

Não dependa da intuição para tomar decisões

Para Daniel Kahneman, Nobel de Economia, é um grande risco tomar decisões usando a área preguiçosa e irracional do cérebro

Ilustração "Não dependa da intuição" (Francisco Martins/EXAME.com)

Ilustração "Não dependa da intuição" (Francisco Martins/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 20 de junho de 2012 às 06h00.

São Paulo - Suponha que em uma maternidade nasçam seis bebês em sequência. A probabilidade de nascer aleatoriamente meninos e meninas é menor, igual ou maior do que a de nascer somente meninos ou somente meninas? A maioria das pessoas costuma responder que a chance de nascer crianças dos dois sexos é maior.

A resposta é intuitiva, porém incorreta. A probabilidade de nascer seis homens é a mesma para seis mulheres, que também é a mesma para o nascimento de quatro mulheres e dois homens ou qualquer outra combinação.

A explicação é estatística: a chance de cada bebê gerado ser do sexo masculino ou do feminino é de 50%. Logo, não há como estabelecer um padrão mais provável para qualquer tipo de sequência.

O teste dos bebês, que costuma aparecer em provas de recrutamento em bancos, mostra como a intuição pode levar o ser humano a cometer erros nas decisões diárias. Outras dezenas de testes similares são apresentadas pelo psicólogo israelense Daniel Kahneman, de 78 anos, em seu livro Thinking, Fast and Slow (“Pensando, rápido e devagar”, numa tradução livre).

A obra, que deve ser publicada no Brasil no segundo semestre deste ano, abrange as principais fases das pesquisas de Kahneman, ganhador do prêmio Nobel de Economia em 2002 por seus estudos dedicados às finanças comportamentais. A maior parte do trabalho de Kahneman tem a coautoria do também israelense Amos Tversky, morto em 1996, vítima de câncer. 

Kahneman e Tversky foram cruciais para que houvesse uma importante mudança no estudo da economia. Historicamente, a teoria econômica se baseou no conceito do Homo economicus, segundo o qual as pessoas tomam decisões racionais motivadas pelos próprios interesses.

Diante de um ambiente de incertezas, os indivíduos analisariam as informações disponíveis com base em padrões estatísticos e escolheriam o melhor caminho possível.

O trabalho de psicólogos da linha cognitiva, como Kahneman e Tversky, ajudou a mostrar que as pessoas tomam decisões baseadas em questões objetivas, mas são igualmente influenciadas por suas emoções, crenças e intuições.

O que mais explicaria os casos de famílias que passam pela experiência de ver a renda diminuir drasticamente e, ainda assim, continuam comprando produtos caros no supermercado? Ou daquelas que ganham cupons de desconto de um supermercado distante, decidem dirigir até lá e acabam gastando em combustível um valor superior ao que vão ganhar na promoção? 


Foram justamente as pesquisas de Kahneman e Tversky que serviram de base para um novo entendimento dos mercados financeiros, com suas características flutuações que desafiam a lógica.

Um dos textos mais notáveis da dupla de pesquisadores foi escrito para a revista Science, em 1979, com o título “Teoria do Prospecto: uma Análise das Decisões em Situações de Risco”.

Nele, mostram que, intuitivamente, as pessoas sentem mais desprazer em perder determinada quantia de dinheiro do que prazer em ganhá-la. Com base em testes, eles mostraram que as pessoas normalmente aceitam fazer apostas se o valor que puderem ganhar for, em média, o dobro do que podem perder.

Feelings

A espinha dorsal de Thinking, Fast and Slow é a divisão que o autor faz da mente humana em dois componentes, chamados de sistemas. O sistema 1 toma decisões rápidas, de maneira intuitiva e sem esforço, baseadas em nossa memória associativa (é o Fast). Já o sistema 2, mais lento, é acionado quando nos encontramos em uma situação que exija concentração (é o Slow).

É o sistema 1 que nos faz, por exemplo, lembrar do número 4 quando vemos a operação 2+2= ?. Já o sistema 2 assume o comando quando nossa memória não tem recursos suficientes para dar uma resposta automática. É um sistema mais lento, que nos tira mais energia. Por exemplo, quando deparamos com a conta 17x24= ?.

Num teste com alternativas, o sistema 1 nos permite identificar que se trata de uma multiplicação e eliminar resultados extremos, como 12 609 ou 123. Mas é o sistema 2 que nos possibilita chegar ao resultado correto: 408. Como o sistema 2 deman­da esforço e concentração, em alguns casos delegamos ao sistema 1 a tarefa de resolver situações de conflito.

Mas, como logo aprendem os investidores que subestimam dados estatísticos por acreditar no feeling, a intuição é mais falível. Afinal, é tão provável o nascimento em sequência de cinco meninas do que as outras opções, embora isso não seja visível para a maioria.

Por isso, Kahneman avisa: “Aprenda a reconhecer as situações mais suscetíveis a enganos e evite a intuição se fizer uma aposta alta”. Siga a intuição — mas cuide de seu dinheiro.

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