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O entulho que Dilma I passará para Dilma II resolver

Passada a campanha eleitoral, agora que não há mais nada a ganhar mentindo ao público, o governo começa a falar em tomar medidas duras para lidar com todo o entulho que Dilma I passará para Dilma II resolver

Heranças: Lula tachou de maldito o legado que recebeu do antecessor; e Dilma, o que pode falar de seu próprio legado? (Divulgação)

Heranças: Lula tachou de maldito o legado que recebeu do antecessor; e Dilma, o que pode falar de seu próprio legado? (Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 19 de novembro de 2014 às 21h19.

São Paulo - Quem com herança maldita fere, com herança maldita será ferido. Eis aí a presidente reeleita Dilma Rousseff, a caminho de começar seu segundo mandato no Palácio do Planalto, na curiosa e talvez inédita situação de carregar nas costas o prejuízo que causou no primeiro — em vez de socar a fatura inteira no infeliz do sucessor.

É o que prescrevem, habitualmente, os roteiros de governos que dão errado: perdem as eleições porque foram mal e deixam para o adversário a tarefa de dar um jeito na desordem que criaram. Mas, no caso, Dilma foi mal e ganhou; é a sucessora de si própria e só pode passar a conta para ela mesma.

Há, como se pode ver, uma espécie de justiça poética nisso tudo. O criador da presidente reeleita, o ex-presidente Lula, inventou uma das mais espetaculares mentiras da história econômica do Brasil ao assumir seu primeiro mandato em janeiro de 2003 — revelou para o país e para o mundo que acabara de receber uma “herança maldita” de seu antecessor, Fernando Henrique, coisa que ninguém tinha percebido até então, e por isso já se considerava desculpado de qualquer coisa que desse errado no presente e no futuro de seu governo.

Dali para diante, até hoje, Lula, Dilma e o PT não mudaram de ideia e não mudaram de assunto. Há algum problema neste país? É culpa “do Fernando Henrique” e da herança maldita que deixou para quem veio depois dele — mesmo que já faça quase 13 anos que saiu do governo.

Mas aí está: o mundo gira e, no fim das contas, o que temos é uma herança maldita passada de Dilma Rousseff para Dilma ­Rousseff. O pior de tudo é que a “herança” de Fernando Henrique não tinha rigorosamente nada de “maldita” — ao contrário, foi o melhor legado econômico que um governo brasileiro jamais deixou para o sucessor, tanto que seus fundamentos foram mantidos e garantiram a sobrevivência do PT no comando do país.

Já a herança maldita que Dilma passa para Dilma é maldita mesmo — aliás, é o que há em matéria de maldição de altos teores.      

Nem o governo tem ânimo para fazer de conta que estamos navegando em mar de almirante. Também não tem motivo — afinal, a campanha eleitoral já acabou e não há mais nada a ganhar mentindo ao público sobre os problemas da economia.

Ao contrário. Está na hora de ir falando em “medidas duras”, de inventar explicações para elas e começar a fazer o que já deveria ter sido feito há muito tempo — e não o foi por causa da irresponsabilidade de uma administração perdida na própria inépcia, na soberba diante de seus fracassos e na insistência em subordinar a economia brasileira aos interesses políticos e eleitorais dos donos do governo.

Sabe-se muito bem quais são os itens desse entulho que Dilma I passará para Dilma II. A edição passada de EXAME, como a revista já fez em outras ocasiões, apresentou um inventário atualizado das dificuldades a ser enfrentadas na área econômica pelo poder público. É muita coisa, é coisa séria e não dá para ver, por parte do governo, um sistema de ideias para mudar o que tem de ser mudado.

Além disso, continua de pé a pergunta que não quer calar: se Dilma e sua equipe econômica, caso haja realmente alguma equipe econômica funcionando em Brasília, sabem o que vão fazer, por que já não fizeram nestes últimos quatro anos de performance abaixo do medíocre?

Há também, para tornar a ação do governo mais complicada do que já é, uma tempestade política em formação, com o manifesto do PT por mudanças radicais nas regras do jogo institucional — o partido, em nota oficial, declarou que passará a buscar a “hegemonia” na condução do Brasil.

Mais: pretende fazer isso por meio de iniciativas de “mobilização social”, já que suas lideranças consideram “praticamente impossível” atingir seus objetivos dentro dos limites da Constituição. Para onde leva essa conversa? Se for apenas palavrório “tático”, já atrapalha muito qualquer esforço de recuperação da economia. E se for mais que isso? Aí a discussão econômica, positivamente, passa a ser secundária.

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