Revista Exame

As ações da Bovespa ficaram baratas, e agora?

A bolsa brasileira está quase tão desvalorizada quanto em 2008 — pouco antes de subir 100% em menos de um ano. A dúvida é se vivemos um momento parecido

BMF%26Bovespa

BMF%26Bovespa

DR

Da Redação

Publicado em 6 de outubro de 2011 às 19h43.

São Paulo - Quem não comprou ações em outubro de 2008, quando o Ibovespa caiu abaixo dos 30 000 pontos, pode lamentar. De lá para cá, o índice chegou a passar dos 70 000 pontos — e, mesmo em meio ao caos das primeiras semanas de agosto, acumulava alta de 86% até o fechamento desta edição.

Há três anos, a quebra do banco Lehman Brothers fez os preços das ações desabar ao criar um cenário de total incerteza: com o futuro do sistema financeiro em xeque, ninguém conseguia fazer previsões para a economia mundial ou os resultados das empresas. Na dúvida, os investidores venderam como nunca.

Após o agravamento da crise nas últimas semanas, a pergunta é: será que não estamos passando por um momento parecido? Ou então: ainda que a situação dos países desenvolvidos seja crítica, as ações brasileiras não estão muito baratas? É hora de comprar? 

Por enquanto, é possível dizer que sim, as ações brasileiras estão baratas. Em média, os papéis de companhias locais estão sendo negociados com um desconto de 40% em relação aos de indianos e mexicanos e de 10% frente aos chineses. Entre os principais países emergentes, só a Rússia tem ações mais baratas.

Um levantamento feito a pedido de EXAME pela consultoria Economática mostra que 115 das 468 empresas de capital aberto da Bovespa tinham valor de mercado inferior a seu patrimônio em meados de agosto — o que, grosso modo, indica que os investidores acreditam que essas companhias valem menos que a soma de suas máquinas, equipamentos e imóveis. 

“Isso só faz sentido para empresas que destruam valor devido à baixa rentabilidade ou que sejam pouco negociadas em bolsa, o que faz com que seu valor de mercado não reflita sua real situação financeira”, diz Gustavo Pires, um dos responsáveis pela área de análise da corretora XP. Não é o caso de boa parte das empresas da lista, que inclui Gerdau, Klabin, Petrobras e a própria BM&F Bovespa.

Um indicador que compara o preço das ações com o lucro das empresas, conhecido como índice P/L, mostra que, nos últimos cinco anos, a bolsa só esteve mais desvalorizada do que hoje em 2008 — e não custa lembrar que, depois de atingir o fundo do poço, o Ibovespa subiu 100% em 11 meses.


Claro, esses números têm de ser constantemente revistos, já que uma nova recessão mundial tem potencial para reduzir o lucro de qualquer empresa — e é pensando nisso que os investidores mudam sua percepção sobre o valor de mercado das companhias. Mesmo assim, há indícios de que a desvalorização das ações entre julho e agosto foi exagerada.

Com o objetivo de medir o impacto que uma recessão global teria nos resultados das empresas do país e, portanto, nos preços das ações, o banco Geração Futuro projetou alguns “cenários de estresse” para as principais companhias da bolsa.

Simulou, por exemplo, que o Itaú teria um ano em que sua carteira de crédito diminuiria, suas receitas com serviços ficariam estáveis e suas despesas aumentariam. Ainda assim, nas contas do Geração, o banco teria um lucro de 9 bilhões de reais — e seu índice P/L seria um dos mais baixos da década.

Para o investidor, o problema é que nada disso garante que o mercado não vá cair mais daqui para a frente. “Há incertezas demais no horizonte, e os investidores estão reagindo violentamente a qualquer notícia”, diz André Jakurski, sócio da gestora JGP e um dos fundadores do banco Pactual.

Um bom exemplo do nervosismo que toma conta dos mercados ocorreu em 9 de agosto. A bolsa de Nova York abriu em alta, caiu 4% em poucos minutos durante a tarde, voltou a subir perto do fim do pregão e fechou com uma valorização de quase 5%. A Bovespa seguiu um comportamento parecido.

O solavanco ocorreu depois de Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve, o banco central americano, ter feito um pronunciamento sem anunciar uma nova injeção de dinheiro no mercado. A primeira reação dos investidores foi de pessimismo.

Mas, à medida que o discurso de Bernanke foi digerido, a avaliação passou a ser de que o BC americano decidiu não abrir o cofre porque a economia não está tão mal assim. Faz sentido? Pouco importa.

Num cenário tão incerto, é bem provável que momentos como esse ditem o rumo dos mercados nos próximos meses — já que ninguém espera uma solução rápida para problemas extremamente complexos como a crise da dívida europeia. 


Entre os executivos financeiros, a piora da situação dos países desenvolvidos no início de agosto está sendo chamada de “a crise da bolsa”: enquanto o caos está instalado nos pregões, outros mercados operam com bem menos turbulência. Os juros que os Estados Unidos pagam para rolar sua dívida ficaram relativamente estáveis, mesmo depois do rebaixamento do risco do país.

Diferentemente do que ocorreu em 2008, quando o crédito internacional secou, bancos e investidores estão financiando as empresas (ao menos por enquanto).

O Brasil continua recebendo recursos de estrangeiros, só que o dinheiro não vai para a bolsa, mas para a renda fixa, especialmente para títulos de dívida das empresas.

Hoje, os juros que as companhias pagam para se financiar são, em média, os mais baixos desde 2007, porque a procura por esses papéis vem crescendo.

“Não quero minimizar os problemas, que são sérios, mas os investidores de bolsa estão exagerando”, diz Gustavo Franco, sócio da gestora Rio Bravo e ex-presidente do Banco Central.

Investidores cautelosos

Alguns gestores de fundos têm aproveitado o vaivém da bolsa para comprar ações, mas, até agora, o movimento tem sido cauteloso. A Fundação Cesp, maior fundo de pensão privado do país, com 19 bilhões de reais sob gestão, aplicou apenas 150 milhões de reais no mercado em 8 de agosto, quando o Ibovespa caiu 8%.

“E só compramos nesse dia. Depois, paramos”, diz Jorge Simino, diretor de investimentos da fundação. “A bolsa continua barata, mas os riscos estão muito elevados.”

Estratégias parecidas têm sido adotadas pelos melhores gestores de fundos do país, selecionados com base numa pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas.


Mesmo casas com estratégias de investimento de longo prazo, como Dynamo, Geração Futuro, M Square e Rio Bravo, não têm feito compras agressivas.

“O Brasil tem uma história interessante: a economia doméstica é sólida, a renda está crescendo, o desemprego está baixo. Só que os resultados das empresas devem ser afetados pelo agravamento da situação global e, por isso, o melhor é ser conservador”, diz Masha Gordon, vice-presidente responsável pelos fundos de ações de países emergentes da gestora americana Pimco, que administra 1,3 trilhão de dólares. 

Por enquanto, a maioria dos bancos e corretoras não espera que os lucros das empresas caiam, mas que aumentem menos nos próximos meses — no Bank of America Merrill Lynch, a estimativa foi reduzida em cerca de 5%: agora, a instituição projeta uma alta de 17% dos ganhos em 2011 e de 13% em 2012.

Nesse cenário, claro, o mundo não entra em recessão e o PIB da América Latina cresce em torno de 4,5%. Se o pior ocorrer, os profissionais do banco preveem que os lucros poderão cair até 20% no próximo ano. Vale a pena investir na bolsa num ambiente assim?

A maioria dos especialistas ouvidos por EXAME diz que sim, desde que o investidor esteja, realmente, disposto a arriscar. Nesse caso, se a turbulência atual da bolsa for parecida com a de 2008, melhor.

Acompanhe tudo sobre:AçõesB3bolsas-de-valoresEdição 0998IbovespaImigraçãoMercado financeiro

Mais de Revista Exame

Linho, leve e solto: confira itens essenciais para preparar a mala para o verão

Trump de volta: o que o mundo e o Brasil podem esperar do 2º mandato dele?

Ano novo, ciclo novo. Mesmo

Uma meta para 2025