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Há mercado para a maior fábrica de celulose do mundo no MS?

O grupo J&F, dono do frigorífico JBS, inaugura no dia 12 a maior fábrica de celulose do mundo. Será um festão. Mas há mesmo tanto assim a comemorar?


	Joesley Batista, da holding J&F: a maior fábrica de celulose do mundo é controlada pela empresa
 (Daniela Toviansky/EXAME.com/Exame)

Joesley Batista, da holding J&F: a maior fábrica de celulose do mundo é controlada pela empresa (Daniela Toviansky/EXAME.com/Exame)

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Da Redação

Publicado em 30 de janeiro de 2013 às 08h01.

São Paulo - Donos do maior frigorífico do mundo, o JBS, os irmãos Wesley e Joesley Batista estão prestes a adicionar outra marca superlativa à sua retumbante trajetória. Está marcada para 12 de dezembro a inauguração da maior fábrica de celulose do mundo, na cidade de Três Lagoas, no interior de Mato Grosso do Sul.

É a primeira unidade da Eldorado, empresa de celulose do grupo J&F, holding da família Batista que também controla o JBS. Será uma festança. Está prevista a presença da presidente Dilma Rousseff e o tenor italiano Andrea Bocelli dará uma canja. A fábrica tem capacidade para produzir 1,5 milhão de toneladas de celulose por ano, o que equivale a 10% da atual produção brasileira.

Foi erguida em tempo recorde — entre as primeiras medições do terreno e o processamento da primeira tora de eucalipto se passaram pouco mais de dois anos. O investimento também foi de impressionar: 6,2 bilhões de reais — dos quais 2,7 bilhões vieram de empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ­(BNDES).

Até aí tudo ótimo. O problema é que a Eldorado começou a funcionar no pior momento para o mercado de celulose em muito tempo. O preço da tonelada caiu da casa dos 1 000 dólares, em 2010, para 750 dólares. A previsão é que o patamar se mantenha por um bom tempo, já que as principais razões para a queda, entre elas a crise europeia, não devem ir embora tão cedo.

“Pensávamos em amortizar o investimento em cinco ou seis anos. Agora, já sabemos que será preciso entre dez e 12 anos”, diz o empresário Mario Celso Lopes, que tem 16% das ações da Eldorado (e acertou com os Batista sua saída do negócio até 2014).

Pensar pequeno não é o forte da família Batista, e sua investida na celulose segue o estilo que transformou o mercado brasileiro — e mundial — de carnes. Na última década, o JBS fez mais de 20 aquisições e aumentou suas­ vendas em 120 vezes. Hoje, é o maior processador de carnes do mundo.

Mas, apesar de ter faturado 70 bilhões de reais nos últimos 12 meses, lucrou apenas 970 milhões de reais — uma rentabilidade de 1,3%. No ano passado, deu prejuízo. Como seu crescimento foi impulsionado pelo BNDES e os resultados nunca foram tão bons quanto o esperado, o banco estatal acabou transformando sua dívida em capital e se tornou o maior acionista da empresa.

Para os irmãos Batista e seu sócio governamental, já ficou claro que, quanto maior, melhor. Mas esse modelo de negócios não vem convencendo os acionistas. O valor de mercado do JBS é de 20 bilhões de reais. A Brasil Foods, que fatura menos da metade, vale 60% mais.


Em celulose, o grupo também quer ser protagonista. Para apresentar o projeto a potenciais clientes, os Batista fecharam no início de novembro o museu britânico Tate Modern para um jantar com 80 convidados. A empresa planeja investir 18 bilhões de reais até 2020 em três fábricas em Três Lagoas. “Nossa ideia é abrir o capital em 2014 ou buscar um aporte para financiar a segunda linha de produção, que queremos inaugurar em 2017”, diz José Carlos Grubisich, presidente da Eldorado.

O otimismo contrasta com o humor do mercado. A queda da demanda na Europa e nos Estados Unidos derrubou a rentabilidade das principais concorrentes da Eldorado em 2012. A margem de lucro da Fibria caiu de 44%, em 2010, para os atuais 31%. No caso da Suzano, a queda foi de 37% para 25%.

“A expectativa era que a margem de lucro da Eldorado fosse de 45%”, diz Lopes, o sócio dos Batista. “Esse cálculo já não vale. Se soubéssemos que o mercado mudaria tanto, não teríamos entrado em celulose.” Hoje, os sócios sabem que a margem da fábrica será menor que a da Fibria.

Para complicar ainda mais as coisas, o freio na demanda acontece exatamente num momento de expansão da oferta. Além da unidade da Eldorado, em 2013 entrarão em operação dois projetos de Stora Enso e Suzano. Juntos representarão 8% do consumo mundial.

“O preço deve cair 9% em 2013”, diz Juan Tavarez, analista do banco Citigroup. Recentemente, Fibria e Suzano suspenderam dois projetos de capacidade equivalente ao da Eldorado. “Se a situação estiver como a de hoje até 2014, vamos cancelar novos projetos de expansão”, diz Ernesto Pousada, diretor executivo de operações da Suzano Papel e Celulose.

Além da virada no mercado, a Eldorado terá de conviver com desafios de lavra própria. Há um problemão logístico a resolver. Sua fábrica é considerada uma das mais modernas do mundo. A localização também é privilegiada. Três Lagoas fica próxima a ferrovias, rodovias e rios que facilitam o escoamento da produção. O problema é a distância das florestas de eucalipto.

A floresta própria da Eldorado fica a 150 quilômetros da fábrica e conseguirá suprir apenas 50% da demanda em 2013. O jeito foi comprar de produtores terceirizados, que ficam a até 500 quilômetros de distância. Isso encarecerá a produção. Grubisich afirma que investiu 900 milhões de reais em florestas e que, até 2015, terá madeira a 80 quilômetros da fábrica.

Investimentos desse porte, é verdade, são feitos para o longo prazo — quem se deixa levar pelo vaivém das cotações das commodities simplesmente não constrói uma fábrica de celulose. De qualquer forma, a mudança no cenário e a perspectiva de dar retorno em uma década não são boas para os Batista. Não ajudam em nada a concretizar o plano de abrir o capital, por exemplo, o que pode prejudicar os atuais planos de expansão. A festa em Três Lagoas está programada para o dia 12. A vida real começa no dia 13.

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