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A força mental faz cada vez mais diferença no tênis profissional

Em um mundo exposto pelas redes sociais, o controle emocional ganha cada vez mais importância no esporte

Alcaraz na final de Wimbledon deste ano: muito controle emocional (Shi Tang/Getty Images)

Alcaraz na final de Wimbledon deste ano: muito controle emocional (Shi Tang/Getty Images)

Ivan Padilla
Ivan Padilla

Editor de Casual e Especiais

Publicado em 28 de julho de 2023 às 06h00.

Ao lado da entrada do vestiário dos jogadores em Roland Garros, na parte de baixo da quadra principal Philippe-Chatrier, fica um discreto totem azul com a estampa do QR Code de um aplicativo chamado Bodygard.ai. Com a câmera do celular, os tenistas podem baixar o app, que remove automaticamente qualquer conteúdo tóxico de suas redes sociais. Por meio de inteligência artificial, a ferramenta identifica ofensas e comparações depreciativas. As mensagens são deletadas e os atletas nem sequer ficam sabendo.

Trata-se de uma tentativa de reduzir os impactos negativos na saúde mental dos jogadores. As redes sociais dissipam os limites entre o mundo físico e o universo virtual. Em casos extremos, permitem ataques anônimos, inclusive a personalidades públicas. Foi o que aconteceu no ano passado à bielorussa Aryna Sabalenka, que sofreu xingamentos e ameaças devido à participação de seu país na guerra na Ucrânia. Na segunda temporada da série Break Point, gravada no ano passado e que estreou em junho na Netflix, ela faz um desabafo. “Estou enlouquecendo na frente de todo mundo. Não quero jogar mais. Chega”, diz, em um dos episódios, aos prantos.

A atleta bielorussa vinha de uma campanha muito ruim, em que não venceu um torneio sequer, em boa medida devido à falta de estabilidade emocional. Ao contrário do que disse na série, Sabalenka continuou disputando o circuito e é a atual número 2 no ranking da WTA. Foi diferente do que aconteceu com Naomi Osaka. A tenista japonesa venceu duas vezes o US Open e duas vezes o Australia Open, chegou ao topo do ranking mundial, até que em 2021 decidiu não disputar Roland Garros, se afastar das quadras e tornar pública uma luta de anos contra a ansiedade e a depressão. Foi um marco no esporte. Pouco depois a ginasta Simone Biles desistiu de disputar os Jogos Olímpicos de Tóquio em nome de seu bem-estar mental. No momento, Osaka está grávida e já anunciou que deve voltar às quadras em 2024.

O controle mental de Alcaraz

O tênis é um esporte solitário. Em uma partida acirrada de cinco sets podem ser disputados mais de 400 pontos. Por vezes, um simples lance pode resultar em uma reviravolta no jogo. A concentração precisa ser máxima. Por isso, pede-se sempre silêncio nas quadras, uma regra nem sempre respeitada pelos torcedores. A modalidade sempre foi dividida entre tenistas frios e passionais. Björn Borg era conhecido pelo apelido Ice Borg. A escola sueca de Mats Wilander e Stefan Edberg prezava pela discrição. O tcheco Ivan Lendl nunca sorria. Já o americano John McEnroe tornou-se caricato pelas explosões na quadra, mas conseguia retomar o foco logo após os rompantes de fúria.

A diferença hoje é a exposição proporcionada pelas mídias sociais, que ajuda a dar visibilidade aos patrocinadores, aos torneios e aos jogadores, mas aumenta a pressão por resultados. Entre os big three, os três jogadores que dominaram o circuito masculino nos últimos 15 anos, Rafael Nadal se destaca pela força física; Roger Federer, pela versatilidade nas quadras; e Novak Djokovic, pela força mental. Mais do que isso, o sérvio estabeleceu um novo padrão de controle emocional.

O fenômeno Carlos Alcaraz reú­ne as qualidades dos três jogadores lendários. Não é raro o jovem tenista de 21 anos conseguir buscar forças para salvar match points e vencer jogos perdidos. Na final de Wimbledon deste ano, o espanhol bateu Djokovic em uma batalha de 4 horas e 42 minutos. Somente um game durou 26 minutos. Depois de 13 igualdades, Alcaraz quebrou o saque do sérvio. A partida só não foi mais longa do que a decisão de 2019 entre Djoko e Roger Federer, com 4 horas e 57 minutos.

Entre as mulheres, Iga Swiatek — atual número 1 do mundo ­— mostra um foco fora do comum. E não é por acaso. Desde que despontou no circuito, ao vencer Roland Garros em 2020, ela teve a ajuda de uma psicóloga em sua equipe, a também polonesa Daria Abramowicz. Aos 22 anos, com quatro títulos de Grand Slam, Iga parece ter encontrado um meio do caminho entre a concentração necessária nos momentos importantes sem o excesso de cobrança. “Quero buscar a excelência constantemente, ser uma versão melhor de mim mesma todos os dias”, disse Iga à EXAME. “Do meu ponto de vista, é possível fazer isso e ainda desfrutar do que estamos fazendo, encontrar alegria no processo. Procuro perseguir meus objetivos, trabalhar minhas habilidades, mas não focar muito a perfeição em si, porque isso pode levar ao esgotamento.”

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