Revista Exame

O governo Dilma vai segurar a gastança?

Com a escolha de um técnico, Alexandre Tombini, e da gerente Miriam Belchior para compor a equipe econômica, Dilma Rousseff emite um sinal que agrada a investidores

O veterano e os novatos: Mantega (à esq.), teve sua permanência confirmada na Fazenda junto com o anúncio de Miriam e Tombini no futuro governo (Rodrigues Pozzebom/AGÊNCIA BRASIL)

O veterano e os novatos: Mantega (à esq.), teve sua permanência confirmada na Fazenda junto com o anúncio de Miriam e Tombini no futuro governo (Rodrigues Pozzebom/AGÊNCIA BRASIL)

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h39.

Eleita sob o signo da continuidade, Dilma Rousseff herda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva uma boa parte de seu primeiro escalão. Na área econômica, estão confirmados o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e Luciano Coutinho, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Mas, ao contrário de Lula, que ao assumir o poder em 2003 apostou — e foi bem-sucedido — num médico sanitarista, Antônio Palocci, para a Fazenda, e num banqueiro sem experiência de governo, Henrique Meirelles, para o Banco Central, ao completar seu time econômico Dilma investiu em gente que já é do ramo.

Escalado para o BC, o economista gaúcho Alexandre Tombini é um caso ainda raro no país de funcionário público sem ligações partidárias que chega ao primeiro escalão pelos próprios méritos. Já para o Ministério do Planejamento, Dilma escolheu a engenheira paulista Miriam Belchior, uma petista histórica com oito anos de governo de lastro. Inicialmente responsável pelo comando do Bolsa Família, há sete meses Miriam vinha gerenciando o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que deverá continuar sob sua batuta no Planejamento. Por fim, para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, até o fechamento desta edição, em 6 de dezembro, o nome forte era o do mineiro Fernando Pimentel, também petista e amigo de Dilma desde os anos 60, quando ambos eram militantes trotskistas. Economista, Pimentel foi prefeito de Belo Horizonte e revelou-se um bom administrador. Ao assumir o poder, diversamente do início do governo Lula, quando o Brasil vivia uma crise de confiança resultante da eleição de um sindicalista de esquerda, Dilma herdará um país estável e em crescimento. O que está muito — muito — longe de significar um país sem problemas econômicos e regulatórios a resolver.

No front macroeconômico, a escalada da inflação — que deve fechar o ano perigosamente perto do teto da meta, de 6,5% — e a sobrevalorização cambial são prioridades inescapáveis. Apesar do aperto dado com a recente elevação do depósito compulsório dos bancos para drenar 61 bilhões de reais da economia, o BC deverá iniciar mais um ciclo de aumento da taxa de juro básica, a Selic. Como novo líder do Comitê de Política Monetária, o Copom, caberá a Tombini prosseguir com a política de metas da inflação que vigora há 11 anos. “A autonomia do BC é da natureza do regime de metas”, disse Tombini após sua indicação. Segundo Murilo Portugal, diretor-adjunto do Fundo Monetário Internacional, “ele está à altura da missão de controlar a inflação e manter a independência do BC”.


O batismo de fogo do novo presidente do Banco Central virá na primeira reunião do Copom no governo Dilma, no dia 19 de janeiro. Aos 47 anos de idade, casado com a americana Michelle e pai de dois filhos adolescentes, Tombini conquistou tanto o respeito de analistas ortodoxos quanto o da chamada ala desenvolvimentista do governo. Não passou pelo setor privado, mas sua formação acadêmica é considerada sólida, e ele foi um dos integrantes da equipe que elaborou o sistema de metas de inflação no governo Fernando Henrique Cardoso. Conhecido pelo bom-senso e cordialidade, é visto pelo mercado financeiro como capacitado para a função também por não nutrir as pirações políticas. “Creio que o Tom bini fará a lição de casa, aumentando os juros de início em 0,5%”, diz Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú-Unibanco. “Para evitar um cavalo de pau na economia, o ciclo de aperto monetário deve ser gradual, num horizonte de até dois anos.” É justamente com o passar do tempo — que fatalmente trará pressões contra o aumento da Selic — que Tombini será posto à prova. “Como o BC não goza de autonomia formal, sua independência deve ser conquistada no dia a dia”, diz Paulo Vieira da Cunha, diretor de mercados emergentes do fundo de investimento Tandem Global Partners. “A exemplo de Meirelles, a missão de Tombini será isolar o Copom de pressões políticas para um afrouxamento indevido da política monetária.” Tombini foi treinado por Meirelles para lidar com a ala gastadora do governo. Desde que passou a integrar o Copom, em 2006, era o responsável por explicar ao restante do governo as razões que guiavam o Comitê sempre que, por causa de viagens, Meirelles não podia comparecer às reuniões.

Se no âmbito da política monetária a indicação de Tombini acalmou os ânimos, no lado fiscal o cenário é mais nebuloso. “Dada a explosão dos gastos públicos, o clima de lua de mel do mercado com o Brasil passou e, em 2011, os investidores cobrarão a entrega de resultados fiscais consistentes”, diz o analista político Christopher Garman, da consultoria americana Eurasia. Para ele, o mercado olhará com lupa a capacidade de o governo resistir a pressões para aumentos do salário mínimo e dos ganhos do funcionalismo. De sua parte, depois de defender o aumento de gastos, agora o ministro Mantega fala que chegou a hora de apertar os cintos, o que incluiria cortes no PAC. Porém, em boa medida, caberá a Miriam Belchior, de 52 anos, zelar pela solvência do país. Cabe à sua pasta, o Planejamento, a gestão de 850 bilhões de reais da União. Em tempos de aperto, é também o Planejamento o responsável por cortar os repasses aos demais ministérios. A nova chefe das finanças públicas, com um perfil híbrido de gerente e política, terá o desafio de reduzir despesas sem comprometer o crescimento da economia. Em seu primeiro pronunciamento, Miriam Belchior prometeu “canalizar os recursos disponíveis para a erradicação da miséria e para a educação e a saúde de qualidade, a segurança pública e a infraestrutura, com foco nos resultados.” Miriam é conhecida por perseguir metas e cobrar resultados — o que leva a crer que sua passagem como coordenadora do PAC tenha sido um pouco frustrante diante do que foi entregue até agora. Ex-mulher de Celso Daniel, prefeito de Santo André assassinado em meio a um escândalo de arrecadação clandestina para o PT, ela será a figura mais próxima de Lula no time econômico.

A figura mais chegada a Dilma deverá ser seu amigo Fernando Pimentel. Sua indicação para o Ministério do Desenvolvimento faria parte da cota pessoal da própria presidente. Fontes próximas a ele dizem que, para o MDIC, Dilma teria definido que “o nome do jo go é competitividade”. Se confirmado no cargo, de saída Pimentel deve anun ciar medidas para re duzir o custo Brasil. Entre elas estaria a desburocratização das exportações e dos procedimentos de abertura e fechamento de empresas. Além de próximo de Dilma, Pimentel tem simpatizantes no setor privado. “Ele seria uma bela escolha para o MDIC, pois tem capacidade de gestão, articulação política e bom relacionamento com os empresários”, diz o também mineiro Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria. A maior preocupação do setor produtivo é a valorização cambial, em parte um efeito colateral dos juros altos. Mas a raiz do problema são os gastos públicos, que em 2010 cresceram 9% reais. Caberá ao veterano Mantega engajar-se no esforço fiscal e trabalhar em sintonia com os novos colegas — e não numa espécie de lado oposto, como muitas vezes fez com Henrique Meirelles.

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