Revista Exame

Com inflação e gastos, cheiro de enxofre no ar

A inflação e o descontrole dos gastos do governo rondam a nossa economia — e não vai ser com base em frases de efeito e clima de otimismo que as pragas serão extintas

O ministro Mantega: falar não basta, é hora de ação (Elza Fiuza/ABr)

O ministro Mantega: falar não basta, é hora de ação (Elza Fiuza/ABr)

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Da Redação

Publicado em 7 de julho de 2011 às 17h56.

São Paulo - O Brasil, de uns tempos para cá, voltou a sentir o cheiro de enxofre típico de duas antigas e conhecidas pragas que transformaram sua economia, durante décadas a fio, num deplorável vale de lágrimas.

Uma delas é a inflação — que ainda não está mordendo, mas já     começou a mostrar a sua cara feia. A outra é a perda de controle sobre o aumento do gasto público, que está aí há bom tempo e, na falta de um tratamento verdadeiro, vem sendo combatida com anestésicos.

A impressão geral, até o momento, é que governo, políticos, empresas, sindicatos e outros atores desse drama acreditam que ambos os problemas podem ser combatidos com otimismo. É mais do que sabido, pela experiência, que pensamento positivo, por si só, não é suficiente para resolver esse tipo de questão; ainda assim, a atitude predominante é assobiar no cemitério, na esperança de que, se ninguém se mostrar assustado com a inflação, ela vá embora sozinha.

Quanto à explosão das despesas do governo, volta a ser ouvida a conversa de sempre: cortes, em geral imaginários, no orçamento, supressão de despesas que ainda não foram feitas, “contingenciamento” disto ou daquilo etc. No mais, é continuar recorrendo à morfina para tratar da doença — ou seja, socar imposto na economia e disfarçar o desequilíbrio das contas com mais e mais arrecadação.

A economia brasileira se acostumou, nos últimos 17 anos, a viver sem inflação — ou, pelo menos, sem aquele tipo de inflação que transforma o país numa piada econômica, como era o Brasil até 1994, com os “fiscais do Sarney”, os planos “cruzado”, o inesquecível “ipon” do ex-presidente Collor e todas as demais tentativas de solucionar a degeneração monetária através da macumba e de outros truques.

É a essa estabilidade, com a manutenção dos índices inflacionários num patamar sempre administrável, que o Brasil deve o tamanho, os músculos e os horizontes que a sua economia apresenta hoje — e os benefícios que decorreram daí para a maioria de sua população.

Não é algo que se possa deixar escapar, mesmo porque esse vaso, uma vez quebrado, fica extraordinariamente difícil de consertar. O que se espera, nessas condições, é que se torne claro para todos que o combate à inflação é a prioridade máxima da ação econômica do atual governo.

Não é “cedo” para isso. Muita gente acha que a inflação, no momento, “não é problema”, ou “ainda não é problema”. Esquecem que inflação só tem duas fases: ou não existe, de verdade, ou já existe — e, neste caso, é tarde demais para tomar medidas preventivas.

Da mesma forma, só existe um tipo aceitável de declaração oficial sobre inflação: o anúncio de que ela está igual ou caindo em relação ao mês anterior. Quando porta-vozes do governo começam a dizer que a inflação deste mês se deveu a isso e a do mês anterior àquilo, pode-se ter certeza: no mês seguinte, vão dizer que ela se deverá a alguma outra coisa qualquer; o certo, aí, é que a casa caiu.

Na outra frente, a do gasto público que cresce sem parar, não há motivos para organizar algum tipo de pensamento otimista. Fala-se em “cortes” — mas não parece ocorrer a ninguém, no governo e nas vizinhanças, que não seria preciso fazer corte algum no orçamento se não tivessem permitido, em primeiro lugar, a criação de novas despesas e o aumento das velhas.

A história não melhora em nada, naturalmente, quando se examina a natureza das despesas fora de controle e se vê, quase sempre, que elas são o pior tipo de gasto que um governo pode fazer. Já seria ruim, é claro, se as contas públicas estivessem indo para o espaço por causa de investimentos — mas aí, pelo menos, o país receberia, em troca do rombo, portos, aeroportos, estradas, usinas e outros haveres em sua infraestrutura.

Mas as despesas descontroladas não são nada disso — basicamente, servem apenas para encher o bucho de políticos, empresários amigos e a companheirada em geral.

Até agora, a arrecadação crescente tem impedido o naufrágio. Continuará sendo assim?

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