Revista Exame

A legião estrangeira de private equity ataca o Brasil

Fundos internacionais de private equity aplicam bilhões de dólares no Brasil e passam a competir com as gestoras locais

Marques, da General Atlantic: com 1 bilhão de dólares aplicados aqui, ele não é mais confundido com um private bank (.)

Marques, da General Atlantic: com 1 bilhão de dólares aplicados aqui, ele não é mais confundido com um private bank (.)

DR

Da Redação

Publicado em 5 de agosto de 2013 às 06h44.

São Paulo - Há poucos anos, o mercado brasileiro de fundos de private equity, especializados em comprar fatias de empresas com o objetivo de revendê-las com lucro no futuro, era essencialmente local.

Boa parte dos investimentos saía do caixa das gestoras GP, Pátria e Gávea - a exceção estrangeira era o americano Advent, que chegou aqui na década de 90.

Com poucos fundos de fora interessados no Brasil, o volume de recursos aplicados aqui era quase irrisório na comparação com outros mercados emergentes.

Em 2005, os private equities investiram 158 milhões de dólares na compra de empresas brasileiras, cerca de um décimo do valor que fundos semelhantes aplicaram na China e na Rússia.

Nos últimos dois anos, o cenário mudou. Gestoras como Carlyle, General Atlantic, Apax e First Reserve fecharam alguns dos maiores negócios recentes do país.

Com a atuação dos recém-chegados, o total de investimentos recebidos pelas empresas brasileiras cresceu 50%, a maior alta entre os países do Bric. Só no primeiro semestre deste ano, os private equities aplicaram 1,5 bilhão de dólares no mercado brasileiro, o triplo do valor destinado à Rússia no período.

"Esse setor está dando os primeiros passos no Brasil. O número de grandes transações ainda vai crescer muito com a chegada de gente nova e com o aumento dos investimentos de quem já está no país", diz John Pfeffer, sócio do americano Kohlberg Kravis & Roberts (KKR), um dos que estão em busca de oportunidades no mercado brasileiro.

Reação à concorrência

Os fundos de private equity não são, obviamente, os únicos a se interessar pelo mercado brasileiro - assim como eles, milhares de investidores estrangeiros nos últimos tempos têm trazido recursos para o país.

O que tem funcionado como chamariz é uma rara combinação de fatores no Brasil de hoje: o crescimento econômico mais robusto desde a década de 70 e a existência de empresas ainda relativamente baratas na comparação com outros países emergentes. "O Brasil virou um mercado prioritário.

Apesar de seu PIB crescer menos que o da China e o da Índia, o país tem regras mais amigáveis de investimento e oportunidades interessantes, especialmente em varejo", diz Juan Carlos Felix, diretor no Brasil do Carlyle - que, três anos após abrir um escritório em São Paulo, iniciou uma temporada de aquisições em série.


Desde dezembro, a gestora pagou cerca de 400 milhões de dólares pela operadora de turismo CVC, investiu 500 milhões de dólares para ficar com o controle da Qualicorp, corretora e gestora de planos de saúde, e comprou a Scalina, fabricante brasileira de meias e lingerie, dona das marcas TriFil e Scala.\ O valor da transação não foi divulgado, mas estima-se que a empresa tenha sido avaliada em 140 milhões de dólares. Fora isso, montou um fundo de private equity de cerca de 230 milhões de dólares em parceria com o Banco do Brasil.

Com a entrada dos estrangeiros, a concorrência entre os fundos tem aumentado. Disputas por companhias que envolvam mais de cinco private equities não são raridade.

À frente da operação brasileira da gestora americana General Atlantic, que aplicou aproximadamente 1 bilhão de dólares no país em cerca de dois anos, Fernando Marques esbarra em propostas de concorrentes em quase todas as visitas a empresas que estão em sua mira, algo que não ocorria no passado, quando boa parte dos empresários locais mal sabia o que ele fazia.

"Na década de 90, era comum eles confundirem private equity com private banking", diz Marques, referindo-se às áreas de grandes fortunas dos bancos. "Às vezes, era difícil explicar que não estava ali para gerir a fortuna de ninguém, mas com a intenção de me tornar um sócio."

Diante do novo quadro, parte dos gestores com anos de experiência no mercado brasileiro está revendo sua estratégia. Há quem aposte que os fundos locais mais tradicionais passarão a buscar oportunidades fora do eixo Rio-São Paulo, onde os estrangeiros tendem a se concentrar.

Para as empresas, a presença de mais fundos é uma ótima notícia. Com o aumento da concorrência, o preço das companhias compradas pelos private equities está subindo. O valor de uma dada empresa depende do setor em que ela atua, de sua saúde financeira, das perspectivas de crescimento e, claro, de quanto os fundos estão dispostos a pagar.

Isso tudo, aliado ao fato de que os preços das transações nem sempre são anunciados, torna imprecisas as generalizações sobre valores praticados no mercado.

Feita a ressalva, os gestores dos maiores fundos em operação no Brasil são unânimes em afirmar que os preços estão definitivamente numa curva ascendente - já há casos de empresas consideradas caras pelos investidores, apesar de, na média, o país estar barato na comparação internacional.

Estima-se que, em 1998, se pagava um valor equivalente a quatro vezes o Ebitda (relação entre a geração de caixa e a receita líquida). Em 2007, o preço já tinha passado para seis vezes e, hoje, a média é de oito vezes.


A recente movimentação dos estrangeiros também deu origem a um novo formato de negócio: o de private equities que compram empresas de outros private equities.

Trata-se de uma prática difundida nos países desenvolvidos, mas ainda pouco vista aqui - nos últimos anos, a situação mais comum foi a de fundos adquirindo participações em companhias diretamente de seus controladores e se desfazendo delas por meio de ofertas de ações na bolsa.

Neste ano, já houve dois exemplos de transações com fundos de ambos os lados do balcão. Em maio, a gestora Apax Partners, com sede em Londres, comprou a empresa de tecnologia da informação paulista Tivit do Pátria e da Votorantim Novos Negócios.

No caso da Qualicorp, adquirida pelo Carlyle, uma fatia de 40% pertencia à General Atlantic. "O curioso é que os fundos estrangeiros estão ativos mesmo em um ano de campanha presidencial, o que poderia gerar alguma insegurança", diz Luiz Fraga, sócio da Gávea Investimentos.

Pode ser sinal de uma mudança estrutural na economia brasileira, cada vez menos exposta ao vaivém de governos. Se confirmada, é provável que o aumento observado na competição por participações em empresas locais seja apenas uma mostra do que ainda virá pela frente. Os tempos do "private o quê?" parecem ter ficado para trás.

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