Operadores de mercado: à espera dos recursos dos fundos de pensão (Germano Luders/Exame)
Da Redação
Publicado em 14 de dezembro de 2017 às 05h42.
Última atualização em 14 de dezembro de 2017 às 05h42.
Uma das grandes surpresas do mercado financeiro foi a valorização da bolsa brasileira em 2017. Apesar das dúvidas que rondam a economia, o Ibovespa teve uma alta de 20% no ano — isso depois de ter subido quase 40% em 2016. As ações de empresas voltadas para o consumo doméstico, como as das varejistas Hering, Magazine Luiza e Via Varejo, subiram mais de 80%.
Muitos investidores deixaram essa oportunidade passar: a maioria demorou para acreditar que a alta da bolsa era para valer e perdeu parte da festa. Mas, hoje, esses mesmos profissionais acham que ainda dá tempo de aproveitar. Os analistas e os gestores de fundos ouvidos por EXAME se dizem convencidos de que investir em ações será um bom negócio — se não em 2018, nos anos seguintes. Até Luis Stuhlberger, um dos melhores gestores de fundos do país, que estava bastante pessimista com a bolsa no começo do ano, voltou a comprar ações. Existem motivos para isso. O que pode atrapalhar é o nada desprezível risco eleitoral.
O grande motor que pode continuar empurrando a bolsa é a queda dos juros. Além de melhorar a situação financeira das empresas, porque reduz o custo de financiamento, a redução dos juros torna investimentos de maior risco mais interessantes. Com as taxas em torno de 14% ao ano, como estavam no começo de 2016, muitos gestores de fundos saíram da bolsa. Os fundos de ações passaram a investir mais em renda fixa, até o limite permitido pelas regras do setor, para tentar melhorar o rendimento.
Os investimentos em bolsa começaram a aumentar em 2017, e os analistas acreditam que deverão crescer mais em 2018. Uma pesquisa feita pela consultoria Aditus com seus clientes — 120 fundos de pensão com patrimônio de 200 bilhões de reais — indica que eles devem aumentar suas aplicações em ações em cerca de 60% em 2018. “Como esses fundos têm metas de rentabilidade, estão se planejando para elevar a aplicação em renda variável para conseguir retornos maiores”, diz Guilherme Benites, sócio da Aditus. Um novo fluxo de recursos contribui para valorizar a bolsa.
Além disso, o país está saindo da recessão. A situação das empresas de capital aberto é a melhor dos últimos três anos. A maioria renegociou dívidas, reduziu o endividamento, cortou custos e reviu processos para se tornar mais eficiente. A expectativa dos analistas é que, se a economia continuar crescendo, as empresas serão capazes de elevar as receitas — e, com despesas menores, o lucro aumentará ainda mais. Nas estimativas do banco Santander, as receitas das companhias abertas deverão crescer 7% em 2018, e o lucro, 20%. “A parte mais positiva de nossas análises é o novo ciclo de resultados das empresas”, afirma Daniel Gewehr, estrategista do Santander.
Projeções sempre embutem dúvidas e riscos, mas as que estão sendo feitas hoje têm uma fragilidade adicional. Elas não dependem apenas do comportamento da economia, ou dos resultados das empresas, para virar realidade. Dependem do resultado da eleição presidencial. O que ajudou a economia brasileira a sair do buraco no último ano foi a agenda de reformas e medidas de ajuste fiscal adotada pelo governo.
Falta muitíssimo para o país conseguir resolver seus problemas mais básicos — gastar menos do que arrecada, por exemplo —, mas o plano injetou confiança nos consumidores e nas empresas. Os investidores passaram a acreditar que a sociedade aceitou que o caminho a ser seguido é o da austeridade e a prever a eleição de um candidato comprometido com a responsabilidade fiscal. Numa entrevista recente, o economista Gustavo Franco, sócio da gestora Rio Bravo e ex-presidente do Banco Central, afirmou que existe a percepção de que mesmo candidatos extremistas evitarão ser radicais na economia.
Por enquanto, porém, o desfecho continua imprevisível. “As pesquisas de intenção de voto começam a fazer sentido seis meses antes da votação”, diz André Carvalho, chefe de análise de ações do banco Bradesco. Às vezes, bem mais tarde do que isso. Pouco antes das eleições americanas, em 2016, uma minoria acreditava que Donald Trump se tornaria presidente.
Se o novo governo vier a interromper o programa de reformas e o ajuste fiscal, a recuperação econômica deverá perder força. Como o mercado vive de expectativas, isso prejudicaria a bolsa já em 2018. O banco BTG Pactual traçou cinco cenários para a bolsa em 2018. No pessimista, que considera a possibilidade de o juro real voltar a subir caso seja eleito um presidente contrário à agenda de responsabilidade fiscal, o Ibovespa cairia cerca de 30% e iria para 50.000 pontos.
Por outro lado, se a maioria dos analistas e investidores estiver certa e o país continuar crescendo, com inflação controlada, juros baixos e reformas em pauta, a bolsa deverá subir mais. “O cenário de continuidade das reformas e o ajuste fiscal ainda não estão refletidos no preço dos ativos. Se isso se mostrar viável, as perspectivas de médio e longo prazos para o mercado brasileiro serão promissoras”, diz Pablo Riveroll, chefe do departamento de ações para a América Latina da gestora britânica Schroders, que tem 9 bilhões de reais aplicados na bolsa brasileira. Para o BTG, a alta do Ibovespa poderá passar de 50% em 2018 se a expectativa se confirmar. Dá para correr o risco de ficar de fora — para muitos investidores, pela segunda vez em um ano?
A estratégia que vem sendo adotada por grandes investidores é aplicar mais na bolsa brasileira aos poucos — e com uma expectativa de conseguir retornos no médio e no longo prazo. A fatia de ações no patrimônio total do setor de fundos aumentou de 4,3% para apenas 4,6% neste ano. Já a participação do Brasil nos índices globais de ações de mercados emergentes ficou estável. Além do risco eleitoral, preocupa esses gestores o fato de a bolsa brasileira já ter subido bastante e algumas ações estarem caras.
Na média, as ações do Ibovespa estão cerca de 10% mais caras hoje do que a média histórica, de acordo com o índice que mede a relação entre o preço dos papéis e o lucro das companhias, nos cálculos do Santander. “Essa é uma análise de mais de curto prazo. Quando olhamos para os próximos três anos, o investimento em bolsa no Brasil continua promissor. O país não está barato, mas tem oportunidades”, diz Pablo Riveroll. “A maneira de reduzir riscos é ter uma carteira diversificada e balanceada de acordo com o risco de cada papel”, completa.
Entre as ações preferidas por 15 bancos e corretoras consultados por EXAME estão as de bancos e empresas de consumo, que se beneficiam da retomada da economia (veja quadro abaixo). A perspectiva de maior crescimento da economia mundial também deve beneficiar exportadoras, como a mineradora Vale e a companhia de alimentos BRF, na opinião dos analistas. Além disso, essas ações poderão ter um desempenho melhor do que a média da bolsa se as perspectivas para o Brasil piorarem e o real desvalorizar. Emoções não faltarão.