Revista Exame

A solução para o ensino médio está no técnico

Para Rafael Lucchesi, diretor do Senai, o ensino médio só vai melhorar com mais disciplinas profissionalizantes em sala de aula

Lucchesi, do Senai: “No Brasil, temas de Estado, como a reforma do ensino médio, estão politizados” (Germano Lüders/Exame)

Lucchesi, do Senai: “No Brasil, temas de Estado, como a reforma do ensino médio, estão politizados” (Germano Lüders/Exame)

LB

Leo Branco

Publicado em 13 de setembro de 2018 às 05h12.

Última atualização em 13 de setembro de 2018 às 05h13.

O economista Rafael Lucchesi Ramacciotti é um entusiasta de uma reforma completa no ensino médio no país. Diretor-geral do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, o Senai, Lucchesi, como é mais conhecido, convive com queixas sobre a má formação da mão de obra no país. Para ele, a raiz do problema está numa educação voltada à minoria de jovens que pensam em seguir carreira acadêmica e que deixa uma grande massa alijada de propósitos. Lucchesi está no Conselho Nacional de Educação, órgão do governo federal que discute como colocar em prática a reforma do ensino médio aprovada em 2017. A seguir, ele comenta os desafios para o país ter uma educação de qualidade.

Por que o ensino médio brasileiro é tão ruim?

No Brasil, consideramos que todos os jovens querem ir à universidade. O currículo do ensino médio é único, engessado, voltado à Academia. Mas só 18% dos estudantes chegam à universidade. Não há opção para os demais 82%. O sistema não empodera para depois da escola. Isso só existe no Brasil. Nos países ricos, mais de 50% dos jovens recebem formação técnica junto da regular. Na Finlândia, exemplo de excelência no ensino, em 2005, 30% dos jovens tinham o técnico. Hoje, 70%.

Como a reforma do ensino médio pode mudar isso?

A vida é flexível. A reforma adapta o ensino à realidade do trabalho. Pelas regras da reforma, uma das cinco opções ofertadas será a profissionalizante. É algo que faz parte do desejo de 80% dos jovens brasileiros.

O que falta para a reforma sair do papel?

Falta regulamentação. A base curricular do ensino médio [diretrizes do que deve ser ensinado nessa etapa educacional] não saiu ainda. Por isso, a reforma não deve começar em 2019, como planejado, mas em 2020.

Por que vai demorar tanto?

Porque a reforma tem resistências. No início da discussão do projeto no Congresso, no governo Dilma Rousseff, havia um arranjo suprapartidário favorável às mudanças. Isso está se perdendo. O Brasil está numa politização excessiva de temas de Estado, como a reforma do ensino médio. Virou um “Fla-Flu”.

Onde estão as resistências?

Há a ideia  de que vão faltar professores nos currículos criados com a reforma. Mas, na área profissionalizante, a nova lei fortalece a presença em sala de aula do profissional de notório saber, vindo do mercado de trabalho. É assim que o Senai trabalha há 76 anos. E as escolas Senai funcionam: 83% dos egressos são empregados em até 12 meses. A ideia é expandir o modelo, mas há oposição por questões ideológicas.

Quais as consequências desse atraso para o país?

No passado, o Brasil podia dar-se ao luxo de perder uma geração de estudantes sem qualificação. Éramos um país de jovens — perdida uma geração, haveria outra maior à frente. Isso acabou. O Brasil atingiu o bônus demográfico sem ter alcançado uma educação capaz de expandir a produtividade e a renda per capita. Precisamos lidar com uma demografia de país rico. Lá, o sistema educacional trabalha com o conceito de não perder um estudante sequer. Um jovem despreparado para o trabalho traz um custo social muito elevado.

O Brasil já está consciente desse problema?

Já. Nas pesquisas da Confederação Nacional da Indústria com lideranças empresariais, a qualificação da mão de obra é hoje um desafio maior à competitividade que os problemas historicamente caros para o setor, como a alta tributação e o câmbio desfavorável.

O Senai daria conta de resolver as carências de educação técnica e profissionalizante no país?

O Brasil tem 77 milhões de adultos sem ensino médio numa população de 160 milhões com potencial de ser ativa. Boa parte da formação profissional é para quem estagnou no ensino regular. O Senai atende 3 milhões de alunos. Mas as necessidades são maiores. Hoje há mais de 8 milhões de estudantes no ensino médio. Precisamos de mais oferta de ensino técnico.

Diante das propostas dos candidatos à Presidência, o que esperar para o ensino médio a partir de 2019?

O tema está na mesa em boa parte das propostas de campanha. Mas quem vai definir se a educação é uma prioridade é a sociedade, não os políticos. Os políticos são só servidores públicos. Estou otimista porque os brasileiros estão mais críticos com a educação. Caiu a ficha de que temos um problema na educação. Os projetos políticos precisam atender às demandas da sociedade. A pressão dela vai ser fundamental.

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