Revista Exame

A nossa banda é 1.0

O baixo índice de acesso à internet e a lentidão na banda larga penalizam a economia e representam um dos maiores atrasos das metrópoles brasileiras

Conexão e mobilidade: na Coreia do Sul, o acesso à internet rápida se dá principalmente pelo celular 3G e já atende 81% da população (Woohae Cho/Iht/Nyt/Latinstock)

Conexão e mobilidade: na Coreia do Sul, o acesso à internet rápida se dá principalmente pelo celular 3G e já atende 81% da população (Woohae Cho/Iht/Nyt/Latinstock)

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Da Redação

Publicado em 22 de março de 2011 às 09h45.

Uma das vantagens que as cidades oferecem, em particular para os negócios, é a facilidade de conexão entre as pessoas. As telecomunicações multiplicam essa facilidade. Felizmente, já vai longe o tempo em que os brasileiros não dispunham sequer de uma rede básica de telefonia — hoje, o número de celulares supera o de habitantes.

Porém, na etapa mais recente dessa evolução, a da conexão rápida pela internet, o Brasil, mesmo em suas maiores metrópoles, como São Paulo e Rio de Janeiro, está muito atrasado. E isso compromete a economia.

Um estudo feito pelo Banco Mundial indica que 10% mais de penetração da banda larga pode gerar crescimento econômico adicional de 1,4 ponto percentual. Ou seja, caso contasse com uma banda larga de qualidade, o Brasil poderia crescer mais e a uma velocidade maior.

No mundo urbanizado de hoje, a internet é simplesmente imprescindível — em especial para as empresas. Ninguém mais concebe enviar um contrato a um cliente e esperar de três a cinco dias úteis para recebê-lo de volta pelo correio.

Nas corporações globais, praticamente todos os processos acontecem pela rede. E a conexão precisa ser cada vez mais veloz. “Nossos maiores clientes, como o McDonald’s, administram, dentro de uma sala, negócios espalhados em 100 países. Ali eles precisam receber dados do mundo todo à velocidade da luz, e a internet rápida é o caminho para isso”, diz o francês Thierry Giraud, presidente da operação brasileira da Sage, uma das maiores fornecedoras de aplicativos de gestão empresarial do mundo.

“Nos grandes centros brasileiros, isso ainda é um problema.” A oferta de internet de qualidade também é decisiva para que uma cidade atraia os melhores profissionais. Hoje, um executivo escolhe trabalhar onde quiser, desde que exista uma boa infraestrutura de banda larga. Cidades sem esse serviço — universalizado e rápido —, portanto, perdem a competitividade na disputa tanto por pessoal de alto nível quanto por investimentos.

Estamos mal

No cenário geral de indicadores da internet, o Brasil apresenta um quadro deplorável. Embora 84% da população viva nas áreas urbanas, 76% dela — 145 milhões de pessoas — está fora do mercado de internet. No ranking dos 133 países mais conectados, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, a Suécia é líder e o Brasil ocupa a 61a posição.


Dos 47 milhões de brasileiros conectados, só 60% contam com banda larga e 20% ainda sofrem com a velha internet discada. O brasileiro paga caro por essa qualidade sofrível. A União Internacional de Telecomunicações, órgão das Nações Unidas, situa o Brasil como o 70o entre 161 países no ranking de preços da banda larga fixa.

O crescimento do 3G, a banda larga fornecida por celular, até agora não mudou significativamente o cenário da conectividade nas cidades brasileiras. Em 2010, segundo o SindiTelebrasil, entidade que reúne as operadoras de telefonia, o número de usuários do 3G passou de 4 milhões para 14,6 milhões. Mas são comuns as reclamações sobre as frequentes zonas de sombra, em que é impossível conseguir conexão. Também nesse caso o preço é outro problema. Um levantamento feito por analistas das Nações Unidas indica que apenas o Brasil e o Zimbábue têm o preço médio do pacote de dados mensal em 3G acima de 120 dólares. A média mundial é de 46,5 dólares mensais nos 78 países avaliados.

Por essas e outras, ainda estamos na fase 1.0 da banda larga, com velocidade média de 1,3 megabit por segundo. Lá fora, muitos países implantam redes 100 e até 1 000 vezes mais rápidas, com velocidade que permite baixar um filme em poucos segundos.

Isso só é possível com uma infraestrutura de fibra óptica, ainda uma raridade por aqui — na maioria das cidades do Brasil, as redes continuam a ser de cobre. Por tudo isso, consertar a banda larga nas cidades brasileiras não será tarefa simples nem barata.

De acordo com um levantamento feito pelas consultorias PwC e Urban Systems para EXAME, apenas para prover as nove maiores cidades do Brasil com rede de fibra óptica que substitua os velhos cabos de cobre e permita alcançar o atual nível médio de acesso dos Estados Unidos, seriam necessários investimentos de 19 bilhões de reais.

Stephen Wilson, analista do instituto britânico Informa Telecoms & Media, afirma que, pelas dimensões do Brasil, os recentes avanços obtidos pela Rússia, país com área, população e recursos de mesma ordem de grandeza, podem ser um exemplo. O caminho do governo russo foi aumentar a competição via entrada de pequenas operadoras no mercado.

“A atuação das operadoras de pequeno porte é intensa e ampliou a oferta do serviço. Além disso, a competição diminuiu os preços”, diz Wilson.

Luta pela ponta

Mas há países muito mais avançados do que a Rússia em termos de conectividade. Na corrida tecnológica, a ponta é disputada por Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão e Suécia. A Coreia promoveu a expansão do índice de penetração do serviço de menos de 40% da população em 2000 para 81% em 2010 — e com velocidades que chegam a 100 Mb por segundo, 100 vezes a média brasileira.

Hoje, basta entrar num táxi em Seul para notar o que isso possibilita no dia a dia — todos contam com vários dispositivos ligados à internet. Nos Estados Unidos, a cidade de Chattanooga, no estado de Tennessee, com cerca de 200 000 habitantes, é a primeira a oferecer banda larga com velocidade de 1 gigabit por segundo a todas as suas 70 000 residências e empresas. O serviço, por meio de fibra óptica, é provido por uma operadora controlada pelo município.

Enquanto nada disso acontece por aqui, pelo menos alguns passos podem ser dados na tentativa de prover nossas metrópoles com uma maior conectividade. A banda larga no Brasil pode ser estimulada também por um projeto de lei em tramitação no Senado.

Se aprovado, permitirá a abertura do mercado de TV a cabo para operadoras de telecomunicação. Com isso, os investimentos na infraestrutura de fibra óptica se tornarão mais interessantes para empresas que buscam receitas adicionais à internet, caso da TV a cabo, um serviço de característica urbana por excelência.

Por ora, o projeto de lei está sob uma batalha de lobbies entre governo, operadoras de telefonia e televisões abertas. Enquanto se desenrolam as disputas, a maior parte do país continua longe do acesso à banda larga. Um problema e tanto para os negócios de nossas cidades — e para a economia do país.

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