Shopping em São Paulo: mais empréstimos, mais gastos e menos retorno (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 26 de junho de 2013 às 06h00.
São Paulo - Não existe dúvida: para quem pode, aquisições são a forma mais simples de crescer. Empresas com dinheiro em caixa, crédito farto na praça e grandes ambições podem simplesmente “comprar” crescimento abocanhando concorrentes. Chega uma hora, porém, em que mesmo os compradores mais destemidos têm de inventar um jeito de crescer sozinhos.
É a hora de transformar o dinheiro usado nas aquisições em lucro para os acionistas. E aqui as coisas ficam um tanto mais difíceis — conquistar clientes dá bem mais trabalho do que assinar cheques para adquirir rivais. O mercado financeiro brasileiro assistiu, nos últimos anos, a um fenômeno que ilustra bem os desafios inerentes a esse tipo de transição.
Até 2000, o banco espanhol Santander tinha presença pouco expressiva no Brasil. Pagou caro para levar a privatização do Banespa, o maior dos bancos estaduais, e virou gente grande. Após anos de uma lentíssima integração, o banco custou a engrenar — até que, em 2007, mudou de patamar de novo ao comprar a subsidiária brasileira do holandês ABN Amro.
Nessa tacada, passou de sétimo para quarto maior banco do país. De novo, entrou numa laboriosa integração, até que, em 2011, anunciou a entrada em vigor de uma nova estratégia de crescimento. Sem aquisições. Mas o que se viu, de lá para cá, foram resultados decepcionantes.
Seis anos após sua maior aquisição, o Santander no Brasil é menos rentável que os concorrentes e cresce de forma mais lenta. O que acontece com a subsidiária brasileira do maior banco espanhol? Na opinião de executivos do Santander, ex-diretores e concorrentes ouvidos por EXAME, o banco ainda não definiu, de forma clara, seu foco de atuação no país.
E essa, para esses profissionais, é a principal razão dos resultados ruins no Brasil. A operação, claro, é rentável — responde, sozinha, por 26% dos lucros do Santander no mundo. Mas a rentabilidade, de 12%, é a menor entre os grandes bancos do país. Hoje, está 30% abaixo da média de Banco do Brasil (BB), Bradesco e Itaú.
Um indicador que mostra que a capacidade do banco está sendo mal aproveitada, na visão de especialistas, é a relação entre o total de agências e a carteira de crédito: o Santander tem 10% do mercado nacional de crédito e 12% das agências do país — o desejável é que o percentual dos empréstimos seja maior (o Itaú tem 18% dos empréstimos e 17% das agências, e o BB tem, respectivamente, 26% e 24%).
Um acréscimo de 2 pontos percentuais significaria uma carteira de crédito 40 bilhões de reais maior. Em 2011, o banco divulgou quatro metas para os anos seguintes e, como mostra o quadro acima, está longe de atingi-las.
Até julho, um novo presidente, o espanhol Jesús Zabalza, chegará com a missão de melhorar os resultados do Santander no Brasil. Talvez mais importante: dar ao banco uma cara própria. Ainda que os grandes bancos de varejo ofereçam basicamente os mesmos produtos e serviços a seus clientes, cada um costuma ter uma ou duas áreas em que é mais forte.
Grosso modo, o mercado brasileiro se divide assim: os estatais Caixa e Banco do Brasil oferecem, em geral, taxas de juro mais baixas nos empréstimos. O Bradesco é aquele que mais se esforça para atingir a população de baixa renda — chegou a instalar uma agência num barco que percorria o Amazonas em busca de novos clientes.
E o Itaú é o banco com a maior área de investimentos, o que ajuda a fazer dele o líder na alta renda. E o que faz o Santander de diferente? Ninguém sabe ao certo.
Depois que comprou o Banespa, o banco espanhol quis se mostrar um banco mais moderno e menos burocrático do que os outros. Fez algumas campanhas barulhentas — como a que incentivava os clientes a escolher onde queriam receber o salário, em meio a uma disputa com o então banco estadual Nossa Caixa.
Além disso, anunciou que cresceria no crédito imobiliário. Foi um dos primeiros bancos a elevar o prazo máximo do financiamento para 30 anos e reviu processos para agilizar a aprovação dos empréstimos, mas parou de inovar depois disso e acabou perdendo espaço. Também abandonou parte das iniciativas do Real para os universitários e para a alta renda e perdeu, segundo um ex-diretor, 250 000 desses clientes.
Ao enfrentar problemas nesses segmentos, o Santander decidiu mudar. Em busca de espaço, avançou em áreas em que a concorrência era mais fraca. A partir de 2011, aumentou o empréstimo para pequenas e médias empresas e para compra de veículos — dois nichos que os concorrentes estavam deixando justamente por ter se mostrado problemáticos.
Todos os grandes bancos sofreram com o aumento dos calotes, mas os efeitos para o Santander foram piores. Sua taxa de inadimplência subiu de 4,8% para 5,8% em 12 meses — no BB, no Bradesco e no Itaú, os números ficam entre 2% e 4,5%. “O Santander aumentou o risco da carteira de crédito para elevar o retorno, mas isso não aconteceu”, diz André Riva, analista de bancos da corretora GBM.
Paralelamente, o banco resolveu ampliar os serviços para a alta renda, com a criação de uma nova marca, a Select, e também lançou pacotes de tarifa com cobranças diferentes de acordo com o perfil do cliente. Com os investimentos, as despesas respondem por 3,6% dos ativos — nos principais concorrentes, representam menos de 3%. Parece pouco, mas a diferença equivale a 3 bilhões de reais ao ano.
Isso tudo não ajudou no relacionamento com os clientes. Embora seja o quinto maior banco do país, o Santander é o que mais acumula reclamações de clientes no Banco Central. Só em abril, foram 758 queixas, mais do que as de Bradesco e Itaú somados.
Uma pesquisa da consultoria CVA Solutions com quase 7 000 clientes mostra que o Santander é visto como um banco caro e que oferece poucos benefícios na comparação com a concorrência. As ações também estão em baixa: caíram quase 30% desde o início de 2011.
Estratégia mexicana
A favor do Santander, diga-se que ele conseguiu o que nenhum banco estrangeiro foi capaz: entrar para o time dos grandes do mercado financeiro brasileiro. Concorrentes como HSBC e Citi ficaram para trás — aliás, bem para trás. O desafio do novo presidente é fazer com que tamanho se traduza em retorno.
Zabalza assumirá até julho. Hoje, ele é responsável pelas demais operações do Santander na América Latina e conhecido pelo perfil mais agressivo. Com uma receita de corte de custos e alto crescimento, Zabalza e sua equipe deixaram a rentabilidade das subsidiárias do Santander no Chile e no México em 18% — semelhante à obtida pelos maiores bancos brasileiros, mas 50% maior do que a rentabilidade do próprio Santander por aqui.
Nos dois países, uma das grandes apostas foi o financiamento a pequenas e médias empresas, algo que se espera que ele faça aqui também. No México, a participação nesse segmento foi de 18% para 30% em dois anos. Além disso, Zabalza diminuiu o número de funcionários por agência e aumentou a produtividade dos gerentes.
Se seguir essa linha aqui, ele poderá ter mais uma complicação para administrar: a insatisfação dos funcionários. Depois de demitir cerca de 2 000 pessoas no último um ano e meio, o Santander passou a viver em pé de guerra com o sindicato dos bancários.
No ano passado, processou o sindicato alegando ter sofrido “danos irreversíveis à imagem” por causa de manifestações ocorridas em frente às agências em São Paulo. Também é o banco privado com mais processos de dívidas trabalhistas, segundo o Tribunal Superior do Trabalho. Não será fácil a vida de Jesús Zabalza a partir de julho.