Revista Exame

A IA e o timing

O momento importa, e muito. Se hoje vemos essa explosão de aplicações da Inteligência Artificial é porque o mercado está pronto para recebê-las

As perguntas que você sempre deve se fazer são: este é o melhor momento para investir na minha ideia? O mercado está pronto para ela? (Boris SV/Getty Images)

As perguntas que você sempre deve se fazer são: este é o melhor momento para investir na minha ideia? O mercado está pronto para ela? (Boris SV/Getty Images)

Publicado em 14 de junho de 2023 às 06h00.

A inteligência artificial (IA) é o assunto do momento. Desde que as últimas versões do ChatGPT começaram a ser testadas — inclusive por pes­soas que não trabalham diretamente com inovação e tecnologia —, o tema ganhou de vez as manchetes. Hoje, basta acessar qualquer portal de notícias ou rede social para ser impactado por uma novidade, análise ou debate sobre ela, a IA.

Por isso, o assunto deste texto não poderia ser outro. Antes mesmo de parar para escrever este artigo, eu sabia que queria compartilhar com vocês minhas impressões e o que ando lendo sobre inteligência artificial. De cara, preciso deixar claro que, como qualquer empreendedor, eu encaro as novidades sempre com muito otimismo. Então, não espere ler aqui nenhuma previsão apocalíptica.

Como alguém que gosta muito de história, também gosto de olhar para trás para encontrar paralelos — e nem é preciso ir muito longe para entender que as grandes inovações, algumas já em museus, sempre foram recebidas com dúvidas e previsões catastróficas.

Há um perfil no Twitter de que eu gosto muito, aliás, chamado Arquivo dos Pessimistas ­(­@­PessimistsArc), que se dedica a fazer uma curadoria de notícias sobre lançamentos tecnológicos. As manchetes sobre o lançamento da máquina de escrever, por exemplo, classificavam o objeto como “arma perigosa” e decretavam que ela seria o fim dos escritores.

Assim, é bastante comum que novidades despertem sentimentos como incerteza, euforia e receio. A IA, sem dúvida, é algo desafiador para toda a humanidade. Vamos precisar aprender a lidar com ela e com suas consequências, como já fizemos antes com outras invenções. De fato, acho que ainda nem é possível prever tudo o que essa tecnologia pode nos proporcionar, tudo o que ela pode transformar, mas acredito que, como outras que vieram antes, ela chega para agregar, para aumentar nossa produtividade e tornar as coisas melhores.

Isso posto, eu gostaria de tratar aqui de outro ponto: timing. Na última semana, li um artigo excelente do Fabrice Grinda sobre inovação e timing — se você nunca ouviu falar de Fabrice, saiba que ele é simplesmente um dos maiores empreendedores e investidores de negócios online, com mais de 250 exits e mais de 700 investimentos-anjo em seu currículo.

No texto, ele coloca em palavras algo que eu pude observar ao longo de toda a minha carreira. O momento importa. Muito! Se hoje vemos essa explosão de aplicações da inteligência artificial é porque o mercado está pronto para recebê-las.Todos os anos, ótimas ideias de negócios são descartadas simplesmente porque estão sendo apresentadas no momento errado.

Se você tem um animalzinho de estimação em casa, por exemplo, é bem provável que compre ração e outros produtos em sites ou aplicativos, mas, como bem lembrou Fabrice, há 20 anos empresas como a Pets.com, que vendiam justamente esses itens online, quebraram.

Quis trazer esse ponto aqui porque empreendedores costumam não só ser otimistas mas ter uma visão clara do futuro. Eles conseguem prever com certa facilidade como um serviço ou produto vai se transformar nos próximos anos ou décadas. No mundo real, no entanto, essa transformação pode levar mais tempo do que o esperado. Por isso, as perguntas que você, como empreendedor, sempre deve se fazer são: este é o melhor momento para investir na minha ideia? O mercado está pronto para ela?

Também não é incomum acontecer o inverso. Vermos uma enxurrada de novos negócios sendo lançados com foco em um mercado que já está muito aquecido — caso da IA. Compartilho da visão de outros empreendedores e investidores de que muitas das aplicações da inteligência artificial que estão sendo lançadas agora foram criadas por empresas que estão simplesmente surfando a onda. Grande parte delas não tem um diferencial. Algo que não necessariamente será sustentável em longo prazo.

Apesar do hype e da especulação, sei que muitas coisas incríveis ainda serão criadas com IA. Vamos combinar que é difícil não ficar otimista com descobertas como a publicada pela Harvard Medical School sobre uma ferramenta de inteligência artificial capaz de identificar pacientes com maior risco de desenvolver câncer de pâncreas até três anos antes do diagnóstico. Ou com a ideia de que um modelo de machine learning pode prever e ajudar a prevenir acidentes em construções.

Sei também que esses novos negócios precisarão de investimento. No Canary, fundo de venture capital do qual sou cofundador, por exemplo, estamos olhando especialmente para aplicações verticais da inteligência artificial a partir do uso de dados proprietários e para empresas que estão explorando a tecnologia para melhorar a experiência oferecida ao usuário.

Confesso que gosto de acompanhar como a inteligência artificial está impactando diferentes mercados. O Google, por exemplo, não era ameaçado havia anos, mas está reagindo ao movimento da Microsoft, que investiu na ­OpenAI, a dona do ChatGPT. Em seu último I/O, evento em que apresenta suas inovações, o Google falou bastante sobre inteligência artificial e sobre como ela pode ser integrada ao ecossistema de softwares e a aparelhos da marca.

Como disse um bom amigo meu, o WhatsApp foi fundado dois anos depois do iPhone. O ChatGPT foi lançado há seis meses. Quanto tempo levará para sabermos quem são os ganhadores dessa nova era?  

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