Revista Exame

A histeria das compras coletivas

Cada vez mais empresas se lançam no Brasil no segmento mais promissor do comércio eletrônico. Haverá espaço para todos?

Os fundadores do Melhor do Pantanal: primeiro site de compras coletivas de Campo Grande (Alexis Prappas/EXAME.com)

Os fundadores do Melhor do Pantanal: primeiro site de compras coletivas de Campo Grande (Alexis Prappas/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h40.

Você provavelmente nunca ouviu falar deles: Sapo Turco; Arara Urbana; Macaco Roxo; Canguru Urbano; Pinguim de Praia. Há algo a mais em comum aqui do que a semelhança entre nomes. Todos são sites que foram ao ar nas últimas semanas. Juntamente com dezenas de outros, eles dão corpo ao maior fenômeno recente da internet brasileira — a proliferação de portais de compras coletivas. Ao oferecer descontos massivos em serviços e produtos a grupos de compradores durante curtos intervalos de tempo, esses sites viraram febre na rede. Segundo o Ibope Nielsen, 7,4 milhões de brasileiros acessaram sites de compras coletivas em outubro. O mercado cresce a um ritmo de 30% ao mês, em média, e deve terminar o ano com faturamento de 500 milhões de reais. A febre, como se vê, não corre apenas entre os consumidores. O primeiro site do gênero foi lançado no Brasil há nove meses. Hoje, há pelo menos 400 negócios de compra coletiva em funcionamento no país.

No início de dezembro, o Groupon, primeiro site de compras coletivas do mundo, causou surpresa ao rejeitar uma oferta de compra do Google, de 6 bilhões de dólares (se concretizada, essa seria a maior aquisição da empresa de Sergei Brim e Larry Page até hoje). No mesmo mês, o apresentador Luciano Huck comprou, por valores não divulgados, 5% do Peixe Urbano, primeiro site do segmento no Brasil. Negociações como essas só fazem crescer a reputação das compras coletivas como modelo de negócio infalível — e como um dos mais lucrativos da história da internet.

Se tudo der errado em uma promoção, em tese, ninguém estaria perdendo dinheiro — elas são válidas apenas quando um número mínimo de compradores for atingido. Já se tudo correr bem, todos seriam beneficiados. Compradores, por garantir o direito de consumir serviços e produtos com descontos de até 90% do valor original; donos de estabelecimentos, por ganhar nova clientela. E os sites, por fim, por receber uma generosa comissão pelas vendas dos cupons, em geral de 50% do total arrecadado. Em todo o mundo, poucas vezes se viu tanta cobiça sobre um segmento do comércio eletrônico. Mas haverá espaço para todos que queiram se lançar?


Muitos acreditam que sim. Entre eles o representante comercial Sérgio Cândia Jr., de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Há anos, Cândia ensaiava montar um negócio próprio. Depois de assistir a uma reportagem na TV, enxergou nas compras coletivas uma oportunidade. “Não havia nada parecido em nossa região”, diz Cândia. Em agosto, ele se associou ao corretor Rogério Casal, seu primo, para criar o Melhor do Pantanal, primeiro site de compras coletivas de Campo Grande. Em novembro, o site foi ao ar com ofertas de descontos em restaurantes. O privilégio de ter exclusividade local em um mercado tão promissor, porém, durou pouco. Em questão de dias, outros cinco concorrentes chegaram à cidade.

Fenômeno parecido ocorre hoje em quase todas as cidades brasileiras com mais de 300 000 habitantes. “O esforço inicial para colocar no ar um negócio de compras coletivas é muito baixo”, diz Gastão Mattos, da consultoria de comércio eletrônico GMattos. Ao contrário de outros negócios de internet, a barreira tecnológica praticamente inexiste. Sistemas automatizados que organizam a venda dos cupons já são vendidos a granel, e podem sair custando, em alguns casos, menos de 1 000 reais. Outra ponta do negócio, que cuida das parcerias, é pouco diferente do trabalho de um representante comercial. Muitos se valem de amizades com donos de restaurantes ou academias de ginástica para dar o pontapé inicial no negócio.

Tal avanço, como é de se imaginar, dificilmente ocorreria sem percalços. A começar por um dos atributos mais celebrados do esquema. Um modelo de negócio infalível? Longe disso. Em um estudo divulgado recentemente pela Universidade Rice, do Texas, ofertas promovidas por sites desse tipo resultaram lucrativas para apenas 66% dos estabelecimentos pesquisados. O percentual é sensivelmente inferior ao que costuma ser propagandeado pelos sites, que apontam níveis de satisfação acima de 90%. Entre os estabelecimentos para os quais a negociação não foi benéfica, ainda, 40% declararam não ter interesse em realizar novas promoções.


Há reclamações também do lado dos consumidores. No Reclame Aqui, site que registra queixas contra 24 000 empresas no Brasil, as compras coletivas também estão em alta. Nos últimos seis meses, mais de 2 200 reclamações foram anotadas. A maior parte diz respeito à qualidade dos serviços prestados no momento de usufruir as promoções. Há quem reclame de preconceito por parte de alguns estabelecimentos, para os quais os portadores dos cupons seriam “consumidores de segunda classe”. Outros se queixam de disparidade entre o que é prometido pelas promoções e o que é, de fato, oferecido. Com tanta concorrência, há mudanças também nos tipos de ofertas que vão ao ar. Recentemente, um site do Rio de Janeiro ofereceu em promoção um serviço que ensinava inadimplentes a tirar o nome de cadastro do SPC e do Serasa (63% de desconto, mínimo de dois compradores).

Cada um dos três maiores sites desse mercado — ClickOn, Peixe Urbano e Groupon, em qualquer ordem — hoje se vale de métricas distintas para se declarar líder do setor. Mas há consenso, entre os maiores, de que o futuro desse mercado deverá ficar nas mãos de poucos. “A questão é saber o tamanho que os negócios de compra coletiva terão no futuro”, diz Sucharita Mulpuru, vice-presidente de pesquisas da Forrester Research. “É provável que eles sejam menores do que se imagina.”

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