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A disputa de R$ 2 trilhões

Margem Equatorial promete dominar agenda política e econômica do país em 2026

Plataforma de petróleo: Foz do Amazonas tem potencial de 10 bilhões de barris recuperáveis (Manta Photo/Getty Images)

Plataforma de petróleo: Foz do Amazonas tem potencial de 10 bilhões de barris recuperáveis (Manta Photo/Getty Images)

Lia Rizzo
Lia Rizzo

Editora ESG

Publicado em 18 de dezembro de 2025 às 06h00.

A decisão do Ibama de autorizar, em outubro de 2025, a perfuração exploratória da Petrobras na Foz do Amazonas passou quase despercebida pelo noticiário internacional. Poucos imaginavam que aquela licença técnica se transformaria no estopim de uma discussão capaz de redefinir os rumos do país.

A Margem Equatorial, extensa faixa litorânea entre o Amapá e o Rio Grande do Norte, deixou de ser apenas uma aposta geológica para se tornar o palco de um embate sobre desenvolvimento, justiça fiscal e sustentabilidade que promete dominar o debate público brasileiro em 2026.

As cifras ajudam a entender a dimensão do que está em jogo. A região possui um potencial de 10 bilhões de barris recuperáveis, com cerca de 6 bilhões concentrados na Foz do Amazonas. Tomando como referência o barril de Brent a 70 dólares e o dólar a cerca de 5,40 reais, o ativo bruto superaria 3,8 trilhões de reais. Descontados custos operacionais entre 15 e 30 dólares por barril e estimando margens de 50%, o Brasil poderia capturar mais de 2 trilhões de reais nas próximas três ou quatro décadas — o equivalente a 16% do PIB atual.

Um parâmetro mais concreto para avalizar essas projeções é a Guiana. O pequeno país iniciou sua produção offshore em 2019 e em dezembro de 2024 já extraía 900.000 barris diários. Em 2022, sua economia cresceu 62,3%, a maior expansão mundial. Suas reservas, entre 11 bilhões e 17 bilhões de barris, aproximam-se das reservas provadas brasileiras.

No Brasil, a urgência é também fiscal. A produção nacional deve declinar entre 2030 e 2035, quando os campos do pré-sal perderem capacidade. A arrecadação do setor, que saltou de menos de 1% do PIB em 2015 para 1,6% em 2024, tende a minguar quando o país mais precisa de recursos. Com a Margem Equatorial em operação, analistas estimam que a receita petrolífera poderia se estabilizar entre 2,5% e 3% do PIB, gerando entre 250 bilhões de reais e 350 bilhões de reais anuais.

Durante uma apresentação de resultados do terceiro trimestre de 2025 à imprensa, Sylvia dos Anjos, diretora-executiva de exploração e produção da Petrobras, destacou os desafios técnicos. “A coluna de rocha desse poço é superior à que temos no pré-sal, então tudo isso leva mais tempo, com mais trocas de fases. É um prazo que vemos com mais segurança”, afirmou sobre o poço Morpho, o quinto mais profundo da estatal.

A matriz energética brasileira, com mais da metade de sua oferta vinda de fontes renováveis — ante 14% da média mundial —, coloca o país em posição singular. Cerca de 70% das emissões nacionais decorrem do desmatamento e da pecuária, não da queima de combustíveis fósseis.

Mesmo um aumento expressivo na produção de petróleo teria impacto pequeno sobre as emissões totais. Isso permitiu que ganhasse força a tese de usar a renda da Margem Equatorial para financiar a própria transição energética via fundo soberano robusto, semelhante aos modelos norueguês e guianense.

Apesar das muitas polêmicas, a proposta vem encontrando receptividade crescente na sociedade. Levantamento da Quaest, divulgado em novembro de 2025, mostrou que os brasileiros contrários à exploração caíram de 70% para 49%, enquanto os favoráveis subiram de 26% para 42%. A redução da rejeição sugere amadurecimento do debate, com a população abandonando polarizações simplistas entre desenvolvimento e meio ambiente.

O maior obstáculo, porém, será político: garantir que essa receita financie projetos climáticos de longo prazo, e não seja consumida por demandas imediatas de saúde, educação e segurança.

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