Revista Exame

3700% em cinco anos

Com custos em baixa e aquisições em alta, a Lojas Americanas transformou-se no maior destaque da bolsa de valores

Loja em São Paulo: de mico a estrela (--- [])

Loja em São Paulo: de mico a estrela (--- [])

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 12h26.

A tabela abaixo simboliza a mais impressionante reviravolta da história recente do ambiente empresarial brasileiro -- aquela vivida pela Lojas Americanas, um dos maiores varejistas do país. Em cinco anos, a rede deixou a condição de sobrevivente cambaleante da crise que vitimou nomes tradicionais do varejo, como Mappin e Mesbla, para tornar-se uma das maiores estrelas da Bolsa de Valores de São Paulo. A valorização de suas ações no período foi de inacreditáveis 3 700%. Ou seja, quem investiu 1 000 reais cinco anos atrás tem hoje 37 000. O índice Bovespa teve valorização de 237% no período, e apenas 11 ações tiveram desempenho superior ao da Americanas (todas, porém, de empresas com pouca ou nenhuma negociação na bolsa). O incrível sucesso da Lojas Americanas no mercado deu à empresa fôlego para investir pesado em aquisições. Em dezembro, ocorreu a fusão de sua operação digital com o Submarino, que criou a maior varejista da internet no país. Na segunda quinzena de janeiro, foi anunciada a compra das 127 lojas brasileiras da rede de videolocadoras americana Blockbuster, por 186 milhões de reais. "A Lojas Americanas se destacou por enxergar oportunidades de negócio onde os concorrentes vêem problemas", afirma Márcio Kawassaki, analista de varejo da corretora Fator.

A maior estrela da bolsa
Evolução do preço das ações da Lojas Americanas nos últimos cinco anos
Janeiro de 2002(1) R$ 3,30
Janeiro de 2003R$ 6,90
Janeiro de 2004R$ 26,26
Janeiro de 2005R$ 36,54
Janeiro de 2006R$ 88,40
Janeiro de 2007R$ 127,61
(1) Fechamento do dia 26 de janeiro de cada ano
Fonte: Economática

As transformações por que passou a Lojas Americanas nos últimos anos dividem-se em dois grupos. A primeira aconteceu longe dos olhos dos consumidores. Antes conhecida por sua ineficiência, a rede sofreu uma brutal redução de custos e viu seu caótico modelo logístico transformado. "Tínhamos muitos consumidores na loja, o problema é que ninguém sabia se ia encontrar batom na prateleira ou não", diz um executivo que passou pela Americanas. A centralização da distribuição, a venda dos imóveis da rede e o corte no número de fornecedores impulsionaram o incremento na eficiência da companhia. A participação das despesas em relação à receita líquida, que há sete anos era de 27%, caiu para os 20% atuais -- diferença que, num setor com margens tão apertadas quanto o varejo, representa um oceano de dinheiro. "A queda nos custos foi fantástica", diz o consultor Eugênio Foganholo, especialista em varejo. O conseqüente crescimento da rentabilidade foi exponencial. Em 2000, quando era considerada um mico pelos analistas, a Americanas teve prejuízo. Em 2005, lucrou 330 milhões de reais.

O segundo conjunto de transformações por que a companhia passou foi feito sob o olhar do consumidor. A Lojas Americanas deixou de ser uma espécie de loja de departamentos barateira e sem charme para tornar-se a mais elétrica varejista do país. Hoje, como as redes Metro, da Alemanha, e a inglesa Tesco, a Americanas opera em praticamente todos os formatos possíveis -- além das lojas físicas, oferece seus produtos por meio de catálogos, televendas, televisão, quiosques e internet. "Essa é uma tendência mundial do varejo", diz o consultor Marcos Gouvêa de Souza, especialista no setor. "O maior desafio dos varejistas é encontrar um modelo para capturar os consumidores em diversos momentos." A investida no comércio eletrônico é tida como exemplar. Quando a Americanas.com foi lançada, no final de 1999, a internet era a maior ameaça ao varejo tradicional. Esperava-se uma disputa entre as lojas virtuais, como a Amazon, e aquelas de concreto. A Americanas.com foi uma aposta num modelo misto pouco comum à época. Depois de um começo titubeante, a loja virtual vive hoje seu momento de maior expansão, superior a 60% ao ano. E a fusão em dezembro do ano passado com o maior concorrente, o Submarino, foi a demonstração cabal de que a aposta inicial fora correta. Hoje, todos os varejistas tradicionais têm sua operação na internet. Recentemente, a subsidiária brasileira do Wal-Mart anunciou que também vai entrar no comércio eletrônico.

O último passo dessa investida em diversos formatos foi justamente a compra da Blockbuster, empresa líder de um mercado em franca decadência. O negócio de locação de filmes -- da forma como é hoje -- está fadado a desaparecer no futuro. Novas tecnologias já permitem o download de filmes diretamente para o computador ou aparelho de TV. Na Amazon, por exemplo, o usuário paga 3,99 dólares para ficar com o filme armazenado no computador por até um mês. O magnata australiano Rupert Murdoch, controlador da News Corp., também anunciou recentemente a intenção de entrar no mercado de downloads de filmes pela internet. Resistente às mudanças do mercado, a Blockbuster passa por um mau momento no mundo todo. A empresa foi praticamente obrigada a alugar filmes via internet depois de perder espaço para a concorrente Netflix, pioneira no sistema de pedidos pela rede e que está prestes a lançar planos que permitirão assistir entre 6 e 18 horas de filmes online por mês. "Os resultados globais da Blockbuster não são nada animadores e, no Brasil, a operação já não dava lucro havia algum tempo", diz um ex-executivo da videolocadora.

A explicação para a entrada num mercado em declínio é simples, porém. A Americanas fez o que os banqueiros de investimento apelidaram de negócio imobiliário -- no qual o que estava em jogo não era a marca Blockbuster ou um súbi to interesse na locação de filmes, mas sim a privilegiada localização das lojas, quase todas em regiões de alta renda. A aquisição é, também, coerente com a estratégia de expansão por meio de sua rede de lojas de vizinhança, a Americanas Express. As novas unidades vão vender, inicialmente, aparelhos de DVD, TVs, livros, brinquedos e CDs. "Com uma gestão mais eficiente, vamos incrementar o negócio de aluguel de filmes e reverter o resultado deficitário da Blockbuster já em 2007", afirma Roberto Martins, diretor de relações com investidores da Americanas. Entre os planos dos novos donos para expandir o negócio também está a mudança do processo de logística que envolve a retirada e a devolução dos filmes. Em breve, os DVDs alugados poderão ser devolvidos em qualquer loja da rede (e não só no endereço onde o filme foi retirado, como ocorre hoje). Também está sendo avaliada a possibilidade de aluguel pela internet, um movimento que seguiria a tendência do mercado.

As aquisições recentes -- o canal Shoptime, o Submarino e a Blockbuster -- e a estratégia de crescimento em diversos formatos transformam um sem-número de varejistas em alvos potenciais da Americanas. "Pode ser uma rede de farmácia, uma livraria ou qualquer outra coisa que seja interessante para o nosso negócio", diz Martins. Há dois anos, os sócios -- Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira -- iniciaram negociações para comprar o Ponto Frio, segunda maior rede de eletroeletrônicos do país, mas as conversas não foram adiante. A possibilidade de vender a Americanas, aventada há anos, parece ainda distante. Segundo banqueiros de investimento, os três sócios ainda enxergam muito espaço para valorizar a empresa antes de negociá-la. A idéia é repetir na Americanas o sucesso da Ambev. Em 1989, Lemann, Telles e Sicupira adquiriram a Brahma por 60 milhões de dólares. Quinze anos depois, com a venda da Ambev -- resultado da união entre Brahma e Antarctica -- para a belga Interbrew, esse valor foi multiplicado por 70. De acordo com executivos próximos à Americanas, ainda não chegou o momento de fazer o mesmo com a varejista -- mas o sucesso dos últimos cinco anos mostra que um longo pedaço do caminho já foi percorrido.

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