
Escritório do Buscapé em São Paulo: grupo formado após a aquisição pelo Zoom foi um dos pioneiros no uso de venture debt no Brasil (Karin Salomão/Exame)
Durante muitos anos, não faltou às startups dinheiro para crescer. Em um mundo de juros baixíssimos, os investidores procuravam avidamente por negócios inovadores de grande potencial. Mas a pandemia do novo coronavírus está mudando esse ecossistema, e deve ficar mais difícil para os empreendedores conseguir recursos. Na busca por fontes alternativas de financiamento, tem crescido o interesse por uma modalidade ainda pouco conhecida no Brasil: o venture debt, que dá um pouco mais de segurança para quem injeta o capital e tem um custo menor para quem recebe.
O venture debt é um tipo de título de dívida. Oferece ao credor uma combinação de remuneração fixa, na forma de juros, e variável – como um percentual sobre a valorização posterior do negócio. Por geralmente não ter muitos ativos, a startup pode colocar como garantia propriedade intelectual, direitos de marca ou ações da companhia, por exemplo.
Usado nos Estados Unidos desde a década de 1970, só agora o venture debt está chamando a atenção dos empreendedores brasileiros. Transações de vulto começaram a ser fechadas no país no ano passado. A redução da taxa básica de juros Selic para 2,25% ao ano, o menor patamar da história, também está forçando os investidores a procurar aplicações mais rentáveis. O venture debt é considerado de alto risco pelos credores, já que envolve empresas com histórico de operação curto ou inexistente, que podem nunca decolar de verdade. Porém, o retorno esperado fica entre 10% e 25% ao ano.
Segundo o boostLAB, hub de negócios de tecnologia do banco BTG Pactual (controlado pelos mesmos sócios da EXAME), e a consultoria de inovação ACE Cortex, o mercado nacional de venture debt tem potencial de crescer e se tornar, como o americano, equivalente a 10% ou 15% do de venture capital. Em 2019, os investimentos em startups brasileiras na forma de venture capital somaram 2,7 bilhões de dólares, 80% mais do que em 2018, de acordo com levantamento do grupo de inovação Distrito.
“Para o empreendedor, a maior vantagem do venture debt é não precisar entregar ao investidor uma participação grande na empresa, como acontece no caso do venture capital”, diz Frederico Pompeu, sócio do BTG Pactual responsável pelo boostLAB.
Com o venture debt, a startup pode conseguir, em média, de 20% a 35% do montante obtido na rodada imediatamente anterior de captação. Cada operação é personalizada para o caso daquele negócio específico. O venture debt deve ser empregado para equilibrar as fontes de financiamento da empresa entre dívida e participação no capital. Pode servir também de proteção em momentos de turbulência econômica, preservando os recursos em caixa destinados à expansão das operações. Nos Estados Unidos, em cerca de 90% das operações, o dinheiro obtido por meio de venture debt é empregado para acelerar o crescimento da companhia e impulsionar a sua valorização antes de mais uma rodada de captação tradicional.
A maior desvantagem do venture debt é criar uma despesa fixa no orçamento da empresa – os juros pagos aos credores. Além disso, caso a startup não consiga quitar a dívida no prazo, as garantias podem ser executadas.
Entre as grandes empresas internacionais que já lançaram mão do venture debt, estão o buscador Google, a rede social Facebook e a fabricante de carne vegetal Beyond Meat. No Brasil, o grupo de varejo online Zoom/Buscapé é um exemplo. “Das companhias de tecnologia, as do ramo de comércio eletrônico estão entre as que vêm recebendo mais atenção dos investidores”, afirma João Sá, diretor do boostLAB.