Zara: varejista espanhola tem 57 lojas em 17 estados do Brasil (Sergio Perez/Reuters)
Carolina Riveira
Publicado em 20 de março de 2019 às 07h34.
Última atualização em 20 de março de 2019 às 17h14.
Em momento descrito pela empresa como “histórico”, a varejista de roupas Zara estreia nas vendas online no Brasil nesta quarta-feira. Hoje com 57 lojas físicas em 17 estados no Brasil, a marca, controlada pelo grupo espanhol Inditex, passa agora a receber pedidos em uma loja virtual em seu site, como já fazem há anos concorrentes nacionais.
O lançamento do e-commerce no Brasil, onde a Zara atua desde 1999, faz parte de uma estratégia global. O presidente da Inditex, Pablo Isla, afirmou que todos os 96 países em que a Zara está presente terão uma plataforma de vendas online até 2020. No ano passado, mercados como Austrália e Nova Zelândia também ganharam a opção de vendas online.
O e-commerce representa 12% das vendas do grupo Inditex pelo mundo, segundo os resultados de 2018 divulgados aos investidores na semana passada. As vendas online cresceram 27% em 2018 na comparação com o ano anterior, totalizando 3,2 bilhões de euros.
A Zara é o carro-chefe dos resultados da Inditex. Sozinha, a marca representa 69% do faturamento do grupo, que totalizou 26,1 bilhões de euros no ano passado. As vendas da Zara cresceram 10% entre 2017 e 2018.
Para Edgard Neto, consultor especialista em varejo de vestuário do Sebrae, é importante para a Zara se posicionar no e-commerce brasileiro. Em um país com mais de 5.000 municípios, a capilaridade da marca, com menos de 100 lojas, ainda é muito pequena — o que pode melhorar com o e-commerce.
“Com uma loja online, a Zara consegue chegar em um público diferente, que não necessariamente compraria nas lojas físicas”, diz Edgard. A distância das lojas não é o único problema. “Às vezes a pessoa está ali na internet, vê uma promoção, decide comprar algo; mas a mesma pessoa não iria até a loja”, explica.
No total de vendas da Inditex, incluindo lojas físicas, as Américas representam uma fatia tímida de 15,5% — embora a empresa não divulgue a fatia do Brasil neste resultado. Sozinha, a Espanha, terra natal do grupo, responde por 16,2%, enquanto o restante da Europa tem 45,1% das vendas.
No Brasil, a categoria de moda e acessórios é a segunda em volume de pedidos no e-commerce, com 14,5% das compras. Os dados são da última versão do relatório WebShoppers, da consultoria de e-commerce eBit/Nielsen, referentes ao primeiro semestre de 2018.
Mas apesar do grande volume de pedidos, a categoria de moda e vestuário é apenas a sétima em faturamento. O setor ainda perde para categorias com maior valor agregado, como celulares e eletrodomésticos, tendo somente 6% do total da receita do e-commerce (1,4 bilhão de reais) no primeiro semestre do ano passado.
Contatada para mais detalhes, a Zara afirmou por meio de sua assessoria de imprensa que não possui porta-vozes para comentar o lançamento do e-commerce e a estratégia da empresa no Brasil. Em nota, a empresa afirmou que “o lançamento do novo site no Brasil é um marco histórico na expansão da integração dos mercados físicos e online da Zara, o que garante que a marca alcance estados e cidades nos quais ainda não tinha presença.”
Na operação brasileira, o cliente terá a opção de receber as compras em casa ou retirar na loja — o que reduz o preço do frete. Consumidores de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba ainda terão a opção de entrega no dia seguinte, para compras realizadas até às 15h. A empresa também afirmou que haverá uma “total integração” entre as lojas e o site.
A loja virtual da Zara fará frente a varejistas de moda brasileiras já estabelecidas no segmento de e-commerce, como Riachuelo, C&A, Marisa e Renner. Além das empresas tradicionais, há ainda as novas varejistas que nasceram na última década e já criadas para operar no e-commerce, como Dafiti e Netshoes.
Iniciando as operações no Brasil perto dos anos 2000, a Zara viveu anos em que a economia brasileira ia bem e a renda crescia, mas ainda assim, enfrentou problemas para se estabelecer aqui. Seus produtos ainda são vistos como de nicho, com um valor médio mais alto que as concorrentes.
O Brasil é o país mais caro do mundo para se comprar peças da Zara: o índice Zara Index, criado pelo banco BTG e que compara preços de 12 peças da marca, mostra que os preços da Zara no Brasil ainda são 18% mais caros que nos Estados Unidos — que nem é o lugar mais barato do mundo, sendo 36% mais caro que na Espanha. Fora do país, a Zara não é uma marca de classe média-alta como é por aqui.
Como a maioria dos produtos é importada (Brasil e Argentina respondem por pouco mais de 1% das 7.210 fábricas da Zara no mundo), a marca enfrenta a alta carga tributária para importações, além de uma logística lenta e complicada nos portos e estradas. O dólar, que subiu 14% desde o último Zara Index, em 2016, também não ajudou.
Mas para o especialista em varejo Jean Rebetez, sócio-diretor da consultoria do grupo Gouvêa de Souza, as concorrentes da Zara não estão necessariamente entre as grandes varejistas brasileiras, mas sim entre as pequenas lojas de grife, que focam em um público mais abastado. “De certa forma, ela navega um pouco sozinha nesse segmento mais premium”, diz.
Criada em 1975, a empresa foi pioneira no mundo no segmento de “fast fashion” (moda rápida, em inglês), que busca oferecer roupas antenadas às tendências, mas com preços menores.
“A Zara consegue ter um grande volume e produção global mas mantendo uma modelagem bacana. A modelagem é de Prada e Gucci, mas o tecido não é”, explica Rebetez.
A empresa também abriu caminho para novas empresas de fast fashion, como a Forever 21, se estabelecerem por aqui, e acabou até mesmo obrigando as concorrentes nacionais a se adaptarem, oferecendo lojas mais bonitas, vitrines mais organizadas e novas coleções.
Marcelo Prado, diretor do instituto de inteligência de mercado IEMI, acredita que não necessariamente o preço das roupas por aqui é elevado a ponto de atrapalhar as vendas. “O preço da Zara ainda não é um impeditivo. Um guarda-roupa tem camisas de 50 reais e camisas de 200, depende de para o que o consumidor vai usar”, diz.
De qualquer forma, Prado ressalta que o e-commerce no Brasil, embora tenha muito potencial, ainda não é tão desenvolvido como nos Estados Unidos e na Europa. “O e-commerce ainda está bem longe de ser uma ameaça ao varejo físico no Brasil”, afirma.
Assim, ainda que as vendas online ajudem a Zara a se aproximar dos milhões de clientes pelo Brasil que ainda não podiam consumir a marca, a empresa ainda levará bons anos para ter uma presença online significativa.