Luiz Carlos Moraes: "Nossas fábricas são tão modernas quanto lá fora" (Anfavea/Divulgação)
Gabriel Aguiar
Publicado em 9 de junho de 2021 às 12h25.
Última atualização em 9 de junho de 2021 às 14h21.
O acordo bilateral entre Mercosul e União Europeia permitirá que o Brasil exporte – e importe – com mais facilidade para países do Velho Continente. De acordo com a Secretaria de Comércio Exterior, o contrato deve trazer 125 bilhões de dólares ao PIB (Produto Interno Bruto) em 15 anos, mas também levanta dúvidas da indústria por conta de questões tributárias e fiscais.
Mesmo com a assinatura de ambos blocos, o acordo ainda está sob dúvidas por conta dos debates em relação ao desmatamento da Amazônia. Para entender como o meio ambiente se tornou fundamental para a economia na atualidade, a EXAME Academy oferece o curso ESG: A revolução da sustentabilidade.
“O problema é o país e não as montadoras. Nossas fábricas são tão modernas quanto lá fora e temos indústrias 4.0 [que têm inteligência artificial, robótica, internet das coisas e computação em nuvem]. Mas é desafiador. É difícil convencer novos investimentos para um país com dificuldades de resolver problemas estruturais”, diz Luiz Carlos Moraes é presidente da Anfavea.
Em entrevista à EXAME, o executivo explica que, por conta de recursos limitados das matrizes, países mais competitivos levam vantagem na hora de receber aportes e novos modelos, por exemplo. Tanto que já existe uma coalizão (com 15 entidades que representam setores de aço, eletrônicos e plástico) para determinar métricas de como o "Custo Brasil" afeta nossa indústria.
“ Competitividade é um problema do país. Já tínhamos essa questão no passado e ainda temos hoje. E nós estamos endereçando isso. Tanto que a Anfavea pontuou vários obstáculos. E, quanto mais rápido forem resolvidos os problemas, mais chances de investimentos. Em relação à defasagem tecnológicas, analisamos experiências de China, EUA, Europa e Índia”, afirma Moraes.
O mundo segue mudando. Siga em evolução com a EXAME Academy
Para Antônio Jorge Martins, coordenador de cursos da área automotiva na Fundação Getúlio Vargas, o acordo pode reforçar o volume de exportações de veículos com baixo conteúdo tecnológico, enquanto modelos com maior conteúdo deverão ser trazidos de fora. E o pacto entre Mercosul e União Europeia também pode representar uma oportunidade para indústria de autopeças.
“Mas existe uma questão, porque, se abrirmos o leque de importações sem impostos, será difícil que a nacionalização aconteça futuramente. Produzimos caminhões com tecnologias embarcadas porque esse mercado consegue comprar. Mas a renda per capta é baixa e, apesar de termos esperança de aumentar, é difícil visualizar medidas econômicas que melhorem isso”, afirma Martins.
Historicamente, a associação de fabricantes de veículos apoia o contrato comercial – que começou a ser negociado pelos governos em 1999 –, considerado essencial para o fortalecimento dos negócios e para a vinda de novas tecnologias a menores custos por conta da redução tarifária prevista pelo pacto bilateral, além de aumentar o potencial de exportação dos produtos industrializados.
“Queremos ter portfólio que sirva para exportação e que garanta volume. Porque a nossa indústria é de volume. Estamos mapeando as possibilidades e, no futuro próximo, poderemos decidir. Estamos na fase de construção de análise. Nossa indústria é competitiva, mas o problema é o país. Nossas fábricas, assim como nossos produtos, estão atualizadas”, afirma o presidente da Anfavea.
Em coletiva à imprensa, Luiz Carlos Moraes reforçou a importância das exportações para que a indústria contorne os aumentos de preços de peças e componentes dos modelos produzidos aqui. Apenas no mês de maio, foram exportados 37 mil autoveículos – que incluem automóveis e veículos pesados –, ou seja, crescimento de 9,1% em relação a abril. No acumulado, são 166.600 unidades.
“O acordo prevê redução tarifaria gradativa tanto para importação como para exportação. Então, dará para trazer sistemas de tecnologia. Essa integração importa, porque será um grande parceiro comercial, o que ajuda na importação e na exportação. E acordo é muito bom quando é um grande acordo. Países com maiores exportações são aqueles que têm grandes acordos”, diz o executivo.
De acordo com Antônio Jorge Martins, é pouco provável que haja desindustrialização em massa do país após acordo entre ambos blocos, já que a indústria automobilística representa 20% do Produto Interno Bruto (PIB) industrial do Brasil – que, apesar de cair durante a pandemia da covid-19, corresponde a 4% do PIB geral. Por isso, o setor tem peso considerável na economia nacional.
“Seria um desastre em termos de industrialização. E as próprias indústrias não se interessariam, já que, na Europa, a relação é de um veículo por habitante. No Brasil, é de 4,6 habitantes por veículo. Então, há muito potencial de crescimento do nosso mercado. Abrir mão dessa indústria com alta empregabilidade e focar em produtos agrícolas seria muito ruim ao país”, afirma o acadêmico.
Para o coordenador de cursos da área automotiva na Fundação Getúlio Vargas, aumentar a exportação é importante porque garante proteção à indústria em relação às variações do dólar e até do mercado – já que alterações da economia são comuns em países em desenvolvimento. Por isso, passou a ser ponto estratégico para os fabricantes que estão instalados no mercado brasileiro.
“Atualmente, o acordo está em fase de revisão jurídica e tradução para os idiomas de todos os países. Depois, será encaminhado para ratificação dos parlamentos na União Europeia e no Mercosul. Então, quando essas etapas estiverem concluídas, será definida a ‘data zero’. Por conta da complexidade do acordo, talvez seja ratificado em 2023. E depende dos governos”, diz Moraes.
Esteja sempre informado sobre as notícias que movem o mercado. Assine a EXAME.