Petrobras sofre com calote em contratos de energia
A inadimplência recorde vista nas liquidações financeiras do mercado de curto prazo de eletricidade nos últimos meses tem pesado sobre a estatal
Da Redação
Publicado em 16 de outubro de 2015 às 17h19.
São Paulo - A inadimplência recorde vista nas liquidações financeiras do mercado de curto prazo de eletricidade nos últimos meses tem pesado sobre a petroleira estatal Petrobras , que costuma ter elevados valores a receber na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), segundo especialistas ouvidos pela Reuters.
Na liquidação dos contratos referentes a julho e agosto, realizada na quinta-feira pela CCEE, a inadimplência alcançou 2,4 bilhões de reais, ou 56 por cento dos 4,2 bilhões envolvidos na operação, que acerta diferenças entre a geração ou consumo das empresas em relação aos contratos de compra e venda de energia.
Os atrasos e inadimplências nas liquidações da CCEE têm acontecido desde agosto, quando diversas empresas de energia começaram a obter liminares na Justiça para evitar prejuízos com o déficit de geração registrado pelas hidrelétricas devido à seca.
Munidas de decisões judiciais que evitam que arquem com pagamentos relacionados ao déficit --a CCEE contabilizou 92 liminares envolvidas na liquidação de quinta-feira--, algumas companhias acabam deixando sem receber empresas como a Petrobras, que teriam valores a embolsar na liquidação.
"A Petrobras é um agente que está sendo bastante impactado por conta disso. (A petroleira) tem muitas usinas térmicas nessa situação --elas são chamadas a gerar e não recebem a totalidade de sua receita (devido à inadimplência na CCEE)", apontou o gerente de Regulação da Safira Energia, Fábio Cuberos.
Parte da exposição da Petrobras à inadimplência deve-se ao fato de a empresa possuir termelétricas sem contratos de venda de energia --conhecidas no mercado como "usinas merchant", que vendem toda a produção no mercado de curto prazo-- além de outras plantas ligadas a toda carga, gerando sobras de energia.
Empresas com valores a receber na liquidação da CCEE têm descontada da receita uma parcela equivalente ao percentual de inadimplência registrado. "Essas usinas não estão recebendo os créditos por sua geração de maneira integral... estão recebendo aproximadamente metade", explicou o pesquisador Roberto Brandão, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Gesel-UFRJ). A Petrobras possui 21 termelétricas próprias ou alugadas, com capacidade instalada de 6,6 gigawatts, o que faz da empresa a sexta maior geradora de energia do país, de acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A Petrobras também sofre efeitos indiretos da inadimplência, uma vez que muitas térmicas afetadas pelo calote compram combustível da petroleira.
Em junho, no início das negociações das geradoras com a Aneel para resolver o déficit das hidrelétricas, a Petrobras enviou carta em que levantava preocupação com eventuais problemas no fluxo de pagamentos na CCEE.
"Os agentes termelétricos utilizam os créditos da liquidação (da CCEE)... para o pagamento dos custos associados à aquisição do combustível", argumentou a petroleira.
A Petrobras alegou à época que, caso a disputa em torno do déficit hídrico impedisse os pagamentos na CCEE, haveria "desequilíbrio para os agentes termelétricos", que teriam sérias dificuldades em honrar seus contratos de combustível e garantir sua continuidade operacional. Para Brandão, da UFRJ, há muitas termelétricas que são de outras empresas, mas compram o combustível da Petrobras e podem ter dificuldades para honrar os compromissos por esse fornecimento sem receber a totalidade da receita na CCEE.
"Elas não vão ter como pagar o combustível. Não sei se isso ganha uma dimensão a ponto de ser um risco para a Petrobras, mas é um problema para ela, sem dúvida alguma. Seja no que ela tem a receber diretamente, seja indiretamente", apontou.
Um estudo do Gesel-URFJ aponta os pagamentos para térmicas "merchant" ou que geraram acima do previsto representaram cerca de 41 por cento dos créditos na liquidações da CCEE ao longo de 2014.
Procurada, a Petrobras não pôde comentar imediatamente.
PREJUÍZO QUE SE ARRASTA
Na liquidação de junho, que aconteceu em agosto, já havia sido registrado um calote de 1,4 bilhão de reais, ou 47 por cento dos 3 bilhões de reais movimentados.
A operação referente a julho devia ter acontecido no início de setembro, mas foi adiada duas vezes e realizada em conjunto com a de agosto devido a uma guerra judicial entre os participantes do mercado.
Nas liquidações dos últimos três meses, a CCEE registrou inadimplência próxima de 50 por cento, prejuízo esse que pode começar a ser acertado nas próximas operações da câmara, desde que as empresas retirem as ações judiciais.
"A judicicialização foi num nível tamanho que a solução para o problema não é trivial. Retiradas as ações judiciais, o elemento principal para desatar esse nó está dado, mas não é uma coisa tranquila e nem vai ser muito rápido", disse Brandão, da UFRJ. A Aneel tem tentado fechar um acordo para compensar parcialmente as hidrelétricas pelas perdas, mas a demora para se chegar a um entendimento com as empresas travou o mercado.
Com a indefinição, especialistas chegaram a especular que a inadimplência na CCEE poderia bater até 90 por cento.
"Não chegou a tanto, então a situação não está tão ruim como parecia. Mas, por outro lado, a situação ainda é horrível, porque não há ainda a menor perspectiva de se resolver isso", ponderou o sócio da comercializadora de energia Federal, Erick Azevedo.
São Paulo - A inadimplência recorde vista nas liquidações financeiras do mercado de curto prazo de eletricidade nos últimos meses tem pesado sobre a petroleira estatal Petrobras , que costuma ter elevados valores a receber na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), segundo especialistas ouvidos pela Reuters.
Na liquidação dos contratos referentes a julho e agosto, realizada na quinta-feira pela CCEE, a inadimplência alcançou 2,4 bilhões de reais, ou 56 por cento dos 4,2 bilhões envolvidos na operação, que acerta diferenças entre a geração ou consumo das empresas em relação aos contratos de compra e venda de energia.
Os atrasos e inadimplências nas liquidações da CCEE têm acontecido desde agosto, quando diversas empresas de energia começaram a obter liminares na Justiça para evitar prejuízos com o déficit de geração registrado pelas hidrelétricas devido à seca.
Munidas de decisões judiciais que evitam que arquem com pagamentos relacionados ao déficit --a CCEE contabilizou 92 liminares envolvidas na liquidação de quinta-feira--, algumas companhias acabam deixando sem receber empresas como a Petrobras, que teriam valores a embolsar na liquidação.
"A Petrobras é um agente que está sendo bastante impactado por conta disso. (A petroleira) tem muitas usinas térmicas nessa situação --elas são chamadas a gerar e não recebem a totalidade de sua receita (devido à inadimplência na CCEE)", apontou o gerente de Regulação da Safira Energia, Fábio Cuberos.
Parte da exposição da Petrobras à inadimplência deve-se ao fato de a empresa possuir termelétricas sem contratos de venda de energia --conhecidas no mercado como "usinas merchant", que vendem toda a produção no mercado de curto prazo-- além de outras plantas ligadas a toda carga, gerando sobras de energia.
Empresas com valores a receber na liquidação da CCEE têm descontada da receita uma parcela equivalente ao percentual de inadimplência registrado. "Essas usinas não estão recebendo os créditos por sua geração de maneira integral... estão recebendo aproximadamente metade", explicou o pesquisador Roberto Brandão, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Gesel-UFRJ). A Petrobras possui 21 termelétricas próprias ou alugadas, com capacidade instalada de 6,6 gigawatts, o que faz da empresa a sexta maior geradora de energia do país, de acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A Petrobras também sofre efeitos indiretos da inadimplência, uma vez que muitas térmicas afetadas pelo calote compram combustível da petroleira.
Em junho, no início das negociações das geradoras com a Aneel para resolver o déficit das hidrelétricas, a Petrobras enviou carta em que levantava preocupação com eventuais problemas no fluxo de pagamentos na CCEE.
"Os agentes termelétricos utilizam os créditos da liquidação (da CCEE)... para o pagamento dos custos associados à aquisição do combustível", argumentou a petroleira.
A Petrobras alegou à época que, caso a disputa em torno do déficit hídrico impedisse os pagamentos na CCEE, haveria "desequilíbrio para os agentes termelétricos", que teriam sérias dificuldades em honrar seus contratos de combustível e garantir sua continuidade operacional. Para Brandão, da UFRJ, há muitas termelétricas que são de outras empresas, mas compram o combustível da Petrobras e podem ter dificuldades para honrar os compromissos por esse fornecimento sem receber a totalidade da receita na CCEE.
"Elas não vão ter como pagar o combustível. Não sei se isso ganha uma dimensão a ponto de ser um risco para a Petrobras, mas é um problema para ela, sem dúvida alguma. Seja no que ela tem a receber diretamente, seja indiretamente", apontou.
Um estudo do Gesel-URFJ aponta os pagamentos para térmicas "merchant" ou que geraram acima do previsto representaram cerca de 41 por cento dos créditos na liquidações da CCEE ao longo de 2014.
Procurada, a Petrobras não pôde comentar imediatamente.
PREJUÍZO QUE SE ARRASTA
Na liquidação de junho, que aconteceu em agosto, já havia sido registrado um calote de 1,4 bilhão de reais, ou 47 por cento dos 3 bilhões de reais movimentados.
A operação referente a julho devia ter acontecido no início de setembro, mas foi adiada duas vezes e realizada em conjunto com a de agosto devido a uma guerra judicial entre os participantes do mercado.
Nas liquidações dos últimos três meses, a CCEE registrou inadimplência próxima de 50 por cento, prejuízo esse que pode começar a ser acertado nas próximas operações da câmara, desde que as empresas retirem as ações judiciais.
"A judicicialização foi num nível tamanho que a solução para o problema não é trivial. Retiradas as ações judiciais, o elemento principal para desatar esse nó está dado, mas não é uma coisa tranquila e nem vai ser muito rápido", disse Brandão, da UFRJ. A Aneel tem tentado fechar um acordo para compensar parcialmente as hidrelétricas pelas perdas, mas a demora para se chegar a um entendimento com as empresas travou o mercado.
Com a indefinição, especialistas chegaram a especular que a inadimplência na CCEE poderia bater até 90 por cento.
"Não chegou a tanto, então a situação não está tão ruim como parecia. Mas, por outro lado, a situação ainda é horrível, porque não há ainda a menor perspectiva de se resolver isso", ponderou o sócio da comercializadora de energia Federal, Erick Azevedo.