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Lives e aulas virtuais: o esforço das academias para sobreviver à pandemia

ClassPass, Velocity e Selfit contam as estratégias para atravessar a crise e manter alunos engajados, mesmo dentro de suas casas

Velocity: mesmo com as unidades fechadas, as bicicletas de spinning foram alugadas aos alunos e continuam sendo usadas (Germano Lüders/Exame)

Velocity: mesmo com as unidades fechadas, as bicicletas de spinning foram alugadas aos alunos e continuam sendo usadas (Germano Lüders/Exame)

Karin Salomão

Karin Salomão

Publicado em 16 de abril de 2020 às 06h00.

Última atualização em 16 de abril de 2020 às 06h00.

Para muitas empresas do setor de exercício e bem estar, a receita com a pandemia do novo coronavírus foi praticamente zerada. As academias estão fechadas há quase um mês e o pagamento das mensalidades foi suspenso por toda a duração do período de isolamento. Dessa forma, as empresas estão buscando alternativas para manter o caixa, preservar empregos dos funcionários e engajar os alunos que estão em casa. 

Aulas online e lives têm sido uma abordagem comum dessas redes, muitas delas distribuídas gratuitamente. O objetivo das academias não é aumentar a receita, mas manter a relevância entre os alunos.

A ClassPass, companhia americana rival da brasileira Gympass e que conecta alunos a academias e outros negócios, tem uma plataforma com cerca de 2.000 aulas pré-gravadas, disponíveis para qualquer pessoa.

Também abriu uma plataforma em que permite que as academias parceiras façam lives e coloquem vídeos de exercícios. Essa plataforma cobra pelo acesso dos alunos, mas a ClassPass não fica com nenhuma comissão. Além disso, criou uma campanha em que os alunos podem fazer doações às suas academias locais - o valor arrecadado vai ser dobrado pela ClassPass.

A Selfit, rede de academias low cost, também tem impulsionado seus canais digitais. São mais de 240 treinos gravados no aplicativo, específicos para serem feitos em casa e divididos de acordo com as modalidades e a familiaridade dos usuários com atividades físicas. 

A empresa também permite consultas online com nutricionistas. É possível pedir um cardápio e até tirar dúvidas sobre alimentos específicos ao escanear o código de barras. Os arquivos digitais da Selfit já receberam 4,5 milhões de acessos.

Mais que levar as aulas para as casas dos alunos, algumas redes estão levando até equipamentos. A rede de academias de spinning Velocity fechou todas as mais de 20 unidades no país e os funcionários receberam férias coletivas. As bicicletas, no entanto, continuam sendo usadas.

Logo no início da pandemia, a Velocity permitiu que alunos se inscrevessem para alugar o equipamento e levá-lo para casa, para manter as atividades. A procura foi enorme e todas as dezenas de bikes foram alugadas em cerca de quatro dias. “É uma receita que nos ajuda, mas é muito mais para nos mantermos como uma marca relevante no mercado", diz Shane Young, fundador e presidente da rede.

A Smart Fit lançou um projeto digital que já estava em produção antes da crise. A empresa disponibilizou gratuitamente uma série de aulas online, usando pesos e materiais encontrados em casa, para estimular a prática de atividade física durante a quarentena. “Atingimos 8 milhões de pessoas no Brasil, são cerca de 800.000 pessoas diferentes por dia usando os treinos”, afirmou Edgar Corona, fundador e presidente do Grupo Bio Ritmo, dono da rede Smart Fit. Ele falou em entrevista ao vivo da série exame.talks, no início da semana.

Os novos negócios digitais devem continuar sendo importantes para as empresas de fitness. "O consumo de produtos digitais vai se multiplicar, desde as atividades físicas em casa ao home office, teleconsultas, entre outros", diz Leonardo Pereira, presidente da Selfit.

Cortes

Apesar dos esforços, as receitas continuam em queda. A ClassPass viu sua receita encolher 95% no mundo desde o início da pandemia. A primeira ação da empresa foi renegociar contratos de marketing e até de provedores de software. Toda equipe executiva cortou o próprio salário. 

"Para qualquer empresa minimamente consciente, a pior coisa que se pode fazer é cortar gente. A equipe executiva zerou seu salário antes de cogitarmos cortar a equipe. Infelizmente não foi o suficiente", diz Dhaval Chadha, diretor de expansão para a América Latina da ClassPass.

A americana demitiu 22% de seus funcionários e deu licença a cerca de 31%. Em janeiro, havia levantado 285 milhões de dólares de aporte, atingindo a marca de 1 bilhão de dólares em valor de mercado, se tornando oficialmente um unicórnio.

A Selfit firmou um compromisso de não demitir funcionários e, com base na medida provisória MP 936, reduziu parte dos salários e da jornada. "A MP nos deu mais fôlego para manter os empregos. É difícil imaginar alguém da nossa equipe sem plano de saúde no momento", diz o presidente.

No caso da Selfit, a companhia tem caixa para passar por esse momento, mas se preocupa com o futuro. O caixa seria usado para financiar sua expansão - antes da quarentena, abria certa de uma unidade por semana, para dobrar de tamanho e receitas todo ano. "Vamos conseguir sair do outro lado, mas a duração da quarentena vai ditar o nosso ritmo de crescimento do futuro", diz Pereira.

Para Young, da Velocity, faltam medidas governamentais de auxílio financeiro para as empresas. Segundo ele, as taxas de juros para empréstimos bancários ainda estão altos, o que poderia prejudicar a saúde financeira da empresa no futuro.

Incerteza e reestruturação

As empresas não sabem quando poderão retomar as atividades, já que, como academias são lugares fechados, em que as pessoas transpiram e respiram mais intensamente, podem ser locais de risco. 

Para Young, essa incerteza é um dos maiores desafios do setor. "Não existe um planejamento perfeito para essa crise. Todos os dias precisamos tomar novas medidas e reavaliar o cenário. Quem não se planeja para enfrentar o pior vai ter mais problemas para frente", diz. Segundo ele, é o momento para empresas reverem processos e o seu momento de negócio. "No nosso caso, não temos um plano A ou B, todas as possibilidades estão na mesa".

Para a ClassPass, pode ser um momento de abocanhar o mercado corporativo. Como empresas estão buscando reduzir o custo, a ClassPass pode ser uma alternativa interessante, pois cobra apenas pelo uso do benefício, no lugar de cobrar pelo número total de funcionários de uma empresa.

Os executivos do setor também apontaram para uma recuperação lenta. Como a crise pode levar ao aumento do desemprego e redução de renda, menos pessoas terão, inicialmente, renda disponível para pagar uma mensalidade.

Exemplo que vem do oriente

As redes brasileiras estão atentas às movimentações que vêm da Ásia, principalmente da China, em relação à flexibilização da quarentena com a redução no número de casos e mortes e à retomada da economia. De acordo com a ClassPass, em países como Cingapura e na região de Hong Kong a retomada está sendo surpreendentemente rápida. 

A reabertura dos mercados também está levando novos usuários às redes de academia na Ásia. Cerca de um terço dos clientes, depois da quarentena, são pessoas que nunca frequentaram academias antes. "As pessoas estão buscando ter mais saúde, fugir da obesidade e ter uma alimentação mais saudável", diz Pereira, da Selfit.

Esse pode ser um bom sinal para o Brasil, país em que apenas 5% da população frequenta academias com regularidade.

Mesmo na pandemia, o setor fitness busca alternativas para tirar os alunos do sedentarismo em suas casas, o que pode ser essencial na retomada.

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