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Faca Ginsu: o que aconteceu com fenômeno das propagandas dos anos 1990

Símbolo das televendas no final do século passado, a faca Ginsu virou febre no Brasil pelo telefone 1406

Facas Ginsu: as facas Ginsu foram importadas para o Brasil pelo Grupo Imagem, uma empresa pioneira em televendas (Reprodução)

Facas Ginsu: as facas Ginsu foram importadas para o Brasil pelo Grupo Imagem, uma empresa pioneira em televendas (Reprodução)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 6 de dezembro de 2025 às 07h12.

Nos anos 1990, bastava passar dos 30 minutos de programa que elas apareciam: cortando pregos, canos, tábuas de carne — e ainda vinham com brinde.

As facas Ginsu não eram só utensílios de cozinha, mas um espetáculo de televendas que ocupava madrugadas da televisão brasileira com frases hiperbólicas e o telefone mais famoso do país: (011) 1406.

Criadas nos Estados Unidos nos anos 1970, as facas chegaram ao Brasil pelas mãos do Grupo Imagem, empresa pioneira em televendas no país.

Mais do que um produto, o sucesso estava no pacote: corte afiado, garantia de 50 anos e um roteiro milimetricamente calculado para convencer o consumidor em menos de dois minutos. O bordão era conhecido: “Mas espere, tem mais!”.

A Ginsu virou um fenômeno — e depois sumiu. Ainda existe, vende online, mas sua força cultural ficou no passado.

Sua história é a de um produto comum transformado em ícone pelo marketing direto. E de um modelo de vendas que foi disruptivo.

Hoje, a Ginsu tenta se manter relevante com versões atualizadas das facas e vendas pela internet. Mas já não ocupa o mesmo espaço na cultura — nem nas cozinhas.

O telefone 1406, por sua vez, virou símbolo de uma era de consumo que não existe mais.

A origem das facas Ginsu: de genéricas a celebridade da TV

A história começa nos Estados Unidos, nos anos 1920, com a Quikut, fabricante de facas baratas e sem grande apelo.

Durante décadas, seus produtos ficavam em segundo plano nas prateleiras de lojas comuns.

Tudo mudou em 1978, quando os publicitários Ed Valenti e Barry Becher decidiram criar uma nova marca. Queriam um nome com sonoridade oriental, para dar um ar de precisão — mesmo sem qualquer ligação com o Japão. Batizaram o produto de Ginsu, um nome inventado, sem tradução, mas com o apelo visual certo.

O grande trunfo veio com os comerciais: ágeis, exagerados e cheios de demonstrações. Uma mão cortava uma lata. Um ator usava a faca para abrir um prego ao meio.

Em segundos, a mesma lâmina cortava um tomate com precisão cirúrgica.

“Don’t do that! You need Ginsu!”, dizia um dos narradores, depois que um ator tentava cortar uma lata com a mão.

A ideia era simples: provar que aquela faca fazia o impossível — e podia ser sua por 9,95 dólares, com brinde incluso.

Entre 1978 e 1985, estima-se que de 6 a 8 milhões de kits Ginsu foram vendidos no mundo. A marca virou referência de produto bom, barato e "duro na queda".

Nos Estados Unidos, chegou a ter 80% de reconhecimento espontâneo. Virou piada no Saturday Night Live, menção em talk shows e ícone cultural.

A produção era feita pela Douglas Quikut Division, no Arkansas, com mais de 120 funcionários no auge.

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O Brasil descobriu a Ginsu pelo 1406

No Brasil, o sucesso foi pilotado pelo Grupo Imagem, fundado em 1991. A estreia foi modesta: dois minutos no programa Jô Soares Onze e Meia, no SBT. Mas deu certo.

Rapidamente, a empresa comprava blocos inteiros de programação na madrugada da Band, Manchete, Record e CNT.

O roteiro era o mesmo: uma faca cortava um prego, depois uma lata, um pedaço de cano, e encerrava cortando um tomate. Tudo com narração acelerada, frases impactantes e o número (011) 1406 piscando na tela.

Na prática, o 1406 virou uma marca por si só.

Chegou a receber até 2.100 ligações por dia.

A estrutura contava com 140 atendentes em 40 pontos diferentes de São Paulo. Era um e-commerce antes da internet.

Além das Ginsu, o Grupo Imagem emplacou outros produtos: as meias Vivarina, os óculos Ambervision e o travesseiro Contour Pillow. Mas nada teve o impacto das facas.

O número virou referência cultural. Foi citado em músicas, programas de humor e até nas letras dos Mamonas Assassinas. Mesmo quem nunca comprou, lembrava do “ligue agora” e da promessa de “50 anos de garantia”.

Quando tudo começou a sumir

No começo dos anos 2000, o modelo desmoronou.

A internet começou a ganhar força, e o televendas perdeu apelo. O Grupo Imagem tentou migrar para produtos de bem-estar e emagrecimento, mas sem o mesmo efeito.

As últimas aparições da marca ocorreram em 2004, na CNT. Depois disso, a empresa fechou as portas e o número 1406 saiu do ar.

O Brasil se despedia da era de ouro da venda por telefone.

As facas Ginsu, por sua vez, nunca deixaram de existir. Ainda estão à venda em marketplaces como Amazon e Mercado Livre, geralmente por importadores ou revendedores independentes. Alguns kits nostálgicos da “Ginsu 2000” ainda aparecem, com preços populares — e sem nenhuma garantia de 50 anos.

O que sobrou da Ginsu

Hoje, a Ginsu ainda pertence à Scott Fetzer Company, do grupo Berkshire Hathaway, de Warren Buffett. A operação segue nos Estados Unidos, com linhas atualizadas de facas e foco em e-commerce.

A promessa continua parecida: corte preciso, resistência e versatilidade. Mas a mística criada pelos comerciais da TV nunca mais foi recuperada.

A Ginsu virou case de marketing, lembrança afetiva — e um lembrete de como um bom roteiro de vendas pode transformar um produto comum em um fenômeno cultural.

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