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CVM vai analisar movimentação das ações do Ponto Frio

Uso de informação privilegiada pode ser punido com multa equivalente a três vezes o lucro obtido e pena de até cinco anos de prisão

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h41.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) comentou a alta anormal das ações do Ponto Frio (GLOB3) nos últimos dias com uma nota bastante lacônica que diz que "examina os negócios realizados com as ações das companhias abertas antes da divulgação de fatos relevantes ao mercado".

Ao anunciar a fusão com a Casas Bahia, Abilio Diniz, controlador do Pão de Açúcar, admitiu que o negócio teve de ser fechado às pressas porque investidores já haviam apresentado consulta à CVM para entender os motivos da forte oscilação dos papéis do Ponto Frio. As ações subiram 35,42% na última quinta-feira, 4,90% na quarta e 7,37% na terça. Nos três dias, o volume de negócios foi bem acima da média.

Além da forte alta dos papéis, outro motivo para a suspeita de que tenha havido vazamento de informações é a escolha das ações do Ponto Frio para o investimento - e não as do Pão de Açúcar, que têm mais liquidez e poderiam sentir menos o efeito de uma sucessão de ordens de compra.

O Pão de Açúcar decidiu usar a Globex, que controla o Ponto Frio, para concentrar suas próprias participações no segmento de bens duráveis (móveis e eletrodomésticos) e também os ativos da Casas Bahia. A Globex seria, portanto, a empresa que poderia capturar melhor as sinergias com a fusão. Logo, quem comprou os papéis da Ponto Frio no mercado poderia conhecer os detalhes da operação em negociação.

Usar informações privilegiadas para negociar ações leva a prejuízos para os investidores que venderam os papéis. Por esse motivo, pela lei cumpre aos acionistas controladores, conselheiros e executivos guardar segredo sobre fatos relevantes a que tenham acesso privilegiado em função do cargo que ocupam até sua divulgação ao mercado.

Ao contrário do que acontecia no passado, hoje é muito difícil encobrir o uso de informações privilegiadas. Tanto a BM&FBovespa quanto as corretoras registram todas as operações realizadas com ações - e a CVM tem poder para solicitá-las. Após identificar quem foram os grandes compradores de ações, a CVM poderá verificar que investidores não tinham o hábito de operar com o papel.

Identificadas as operações incomuns, a autarquia deverá analisar se algum dos investidores possui parentes ou amigos que sabiam das informações fornecidas ao mercado apenas nesta sexta-feira. Caberá então a essas pessoas apresentar justificativas convincentes.

Além de arranhar a reputação do investidor, o uso de informação privilegiada pode levar a punições nas esferas administrativa e criminal. A CVM analisa o caso e, em caso de condenação, aplica multas equivalentes a até três vezes a vantagem financeira obtida com as transações. Outra possível punição é proibir alguém de atuar no mercado brasileiro. Não é incomum que os processos movidos na CVM levem a alguma punição. No entanto, esse tipo de ação não tem um desfecho rápido. Além disso, na maioria dos casos, o próprio réu apresenta à autarquia uma proposta de pagamento de multa para encerrar o processo.

Desde 2001 a Justiça também pode analisar o uso de informação privilegiada, considerado crime contra o mercado de capitais. A condenação é passível de pena de um a cinco anos de prisão. O primeiro caso de informação privilegiada que chegou à esfera judicial envolve dois ex-executivos da Sadia e um do Banco Real, que podem ter comprado ações da Perdigão dias antes de apresentarem uma oferta de compra da empresa. Os executivos já concordaram em pagar uma multa para encerrar os processos administrativos que estavam sendo movidos nos Estados Unidos. O processo judicial, no entanto, ainda não foi finalizado.

Especialistas alertam que a única forma de reduzir a incidência desse tipo de delito no mercado financeiro é com punições. "Reduzir o número de negociações com informação privilegiada é fundamental para o investidor ter confiança no Brasil e continuar a colocar dinheiro aqui", diz Gustavo Grebler, professor da GVLaw e advogado do escritório Grebler Associados.

O caso do Ponto Frio tem uma característica específica que pode levar a um novo debate no mercado. Caso a CVM consiga coletar provas que houve uso de informação privilegiada obtida por pessoas ligadas à Casas Bahia, a autarquia terá de avaliar se esses executivo de empresas fechadas também podem receber punição.

Na maior parte dos casos, quem vaza informações são funcionários menos graduados de bancos e escritórios de advocacia. Diretores das empresas e banqueiros graduados em geral têm muito a perder se ficar provado o envolvimento nesse tipo de delito. Além disso, o valor baixo movimentado em ações do Ponto Frio nesta quinta (959 mil reais) é um indício de que nenhum grande investidor sabia das negociações.
 

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