Quatro homens de negócios revelam os maiores erros que cometeram -- e contam o que aprenderam com eles
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h27.
Idéias brilhantes, decisões certeiras, estratégias bem construídas, planos impecavelmente implementados. É por coisas desse tipo que qualquer executivo quer ser lembrado. Mas a vida no mundo dos negócios quase nunca é fácil. Dificuldade de execução, confiança exagerada no próprio taco, ingenuidade diante de uma situação desconhecida também fazem parte do dia-a-dia de qualquer empresário ou executivo. Alguns acertam mais do que erram. Outros erram mais do que acertam. É essa diferença que define o sucesso. Falar sobre os próprios deslizes é algo que exige boa dose de maturidade -- e de coragem. Principalmente se o resultado custou alguns milhões de reais para a empresa. EXAME entrevistou quatro homens de negócios que confessaram seus maiores erros e as lições tiradas dos episódios. As histórias foram analisadas pelos professores Fabio Chaddad e Sergio Lazzarini, do Ibmec São Paulo. Eles procuraram explicar como e por que os erros foram cometidos. "O erro faz parte da vida das empresas", diz Lazzarini. "Até a falência pode não ser considerada uma falha se permitir que o empresário se reerga. O mais importante são as lições tiradas desses deslizes."
"Achei que seria simples"
Dimitrios Markakis, presidente e dono da Dicico, rede de material de construção
Markakis: depois do erro, recuperou o conceito e o nome original da Dicico
"Cometi uma sucessão de erros ao comprar a Dicico, em 1999. Eu estava acostumado a marcar gols e a viver de sucesso. Tinha feito uma venda espetacular dos supermercados Cândia para o Sonae e achei que administrar uma empresa como a Dicico seria tarefa simples. Meu primeiro erro foi transformar a Dicico, tradicional varejista de artigos para construção, numa loja completa para a casa. Com essa idéia, mudamos o nome da loja para ConstruDecor. Foi um furo na água. Ninguém entendia o conceito da empresa, não tínhamos espaço físico suficiente para abrigar todos os produtos. Perdemos clientes, mas enxergamos o erro só depois de abrir seis lojas. Tive de reestruturar todas as lojas, voltar ao conceito antigo (que era só vender material de construção) e adotar novamente o nome Dicico. Foi quando descobri que havia cometido outro erro: ao trocar o nome para ConstruDecor, havia subestimado uma marca de 82 anos. No mês seguinte à retomada do nome, nosso faturamento dobrou. Outra derrapada foi só contratar gente que havia trabalhado em supermercados para o negócio. Aprendi que latas de tinta são muito diferentes de latas de leite condensado. Aos poucos, fui buscando profissionais de outros setores para suprir essa falta de conhecimento. Ao comprar a Dicico, a idéia era fechar o ano de 2005 com 30 lojas e 1 bilhão de reais de faturamento. Devemos fechar este ano com 15 lojas e 400 milhões de faturamento. Um pouco mais modesto."
Analise dos especialistas Apesar de o mercado de varejo ter características comuns, os produtos em questão eram bem diferentes. Sendo assim, certos conhecimentos adquiridos no varejo de alimentos não eram tão relevantes para o comércio de material de construção. Faltou ao empresário adquirir conhecimento desse mercado e do seu público.
Luís Norberto Pascoal, presidente da DPaschoal, maior rede de revendas de autopeças
Pascoal: prejuízo de 2 milhões de dólares
"Em meados da década de 80, investi 2,5 milhões de dólares numa fábrica de bolsas de sangue. Chamava-se Hemobag, com sede em Campinas, no interior de São Paulo. Comprei aquilo sem entender do negócio e sem saber aonde queria chegar com aquele empreendimento. Percebi depois que o setor exigia testes de qualidade muito rigorosos. Se uma bolsa apresentasse problemas numa remessa de 10 000 unidades, perderíamos tudo. Fabricávamos e não conseguíamos vender. Descobri que investiguei muito pouco antes de entrar nessa empreitada. Achei que era uma oportunidade de crescer e não dei importância aos detalhes do negócio. Só que acordei para o erro tarde demais. Já tinha perdido 2 milhões de dólares. Acabei vendendo a empresa a alguém do ramo. Quase na mesma época, fiz um plano de negócios com alguns executivos e decidimos abrir uma distribuidora de papel. No projeto de viabilidade do negócio, algo não fechava: havia uma superprodução de papel no país e muita concorrência. Novamente, o excesso de confiança me fez acreditar que conseguiria domar a situação. Você acha que é um bom empreendedor e que, como já acertou cinco vezes, a sexta não tem como dar errado. Mas dá. Acabei fechando a distribuidora de papel três anos depois."
Analise dos especialistas Pascoal tentou diversificar seu negócio fugindo totalmente de sua especialidade. Há estudos mostrando que a diversificação fora do negócio principal apresenta resultados insatisfatórios. Ele buscou um negócio com potencial de rentabilidade, mas deixou de lado o planejamento e a análise das concorrentes e do mercado.
"Descuidei do meu negócio"
Marcelo Abrão, presidente da rede de lojas de roupas Yachtsman
Abrão: "Um passo atrás para não arruinar o negócio"
"No começo da década de 90, decidi transformar minha rede de lojas em franquias. Na época, a rede já tinha três anos e seis lojas próprias. Contratei uma consultoria especializada e decidi abrir a primeira franquia em Belém, no Pará. Cheguei a vender sete franquias em três anos. Aos poucos, comecei a perceber que as lojas franqueadas não tinham o mesmo desempenho das outras. Financeiramente, o negócio não ia bem para os dois lados. Eu mesmo deixei de cuidar do negócio como se ele fosse meu. Marcava reuniões com franqueados e alguns não apareciam. Percebi que era hora de dar um passo para trás. Comprei três lojas e fechei as outras quatro. Percebi a tempo que, se não fizesse isso, prejudicaria minha marca e comprometeria a empresa. Não tenho perfil para franquear, mas demorei um pouco para perceber."
Analise dos especialistas Abrão falhou na escolha do local para a abertura da primeira franquia -- uma cidade muito distante do centro do negócio. Errou também na forma de administrar o relacionamento com os franqueados. Era necessário deixar claro para todos o funcionamento do negócio. Nesse modelo é fundamental saber lidar com os parceiros.
"Deleguei sem responsabilidade"
Mário Grieco, presidente do laboratório farmacêutico Bristol Myers-Squibb
Grieco: "Aprendi a desconfiar mais"
"Ao assumir a presidência do laboratório Searle, em Porto Rico, cometi um erro grave que quase acabou com minha carreira. Ao ser consultado sobre uma campanha de um medicamento para hipertensão, dei carta-branca ao departamento de marketing para fazer o que achasse mais conveniente. Eles acabaram veiculando a propaganda numa emissora de rádio -- algo proibido pelo Food and Drug Administration (FDA), entidade americana responsável pela autorização de venda de remédios. Dias depois, um inspetor do FDA apareceu na empresa para cobrar uma multa. A unidade de Porto Rico foi ameaçada de fechar e tivemos de arcar com o custo de mandar cartas para todos os médicos explicando o ocorrido. Pior ainda -- acabamos denegrindo a imagem do medicamento e estimulando as vendas da concorrência. Os seis executivos de marketing, que tentaram contornar a situação com o inspetor, foram demitidos. Como não participei disso, fui mantido na empresa. "
Analise dos especialistas Grieco deveria ter estudado mais as leis do país, a cultura e principalmente o nível de competência de sua equipe. Delegar não é dar liberdade total. É mostrar o que se quer, estipular as metas e saber quais são os caminhos a ser tomados. A equipe pode ter autonomia para escolher a estratégia que julgar mais adequada, mas o presidente deve estar a par de todas as decisões importantes.