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Como o Pão de Açúcar vai defender a fusão com a Casas Bahia

Grupo deve apresentar seis argumentos ao Cade para aprovar o acordo sem problemas

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h41.

O Grupo Pão de Açúcar já traçou as principais linhas de defesa para aprovar, sem problemas, a compra da Casas Bahia. O negócio envolve a fusão de todas as operações de varejo de bens duráveis da companhia - o Extra Eletro e o Ponto Frio (adquirido em junho) - com a rede fundada por Samuel Klein. A argumentação tem 15 dias úteis para ser apresentada ao Sistema Brasileiro de Concorrência, composto pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE), do Ministério da Fazenda, e Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça. Como o acordo foi anunciado nesta sexta-feira (4/12), o prazo legal para comunicá-lo às autoridades termina em 28 de dezembro. Ainda há várias lacunas na defesa em elaboração pelo grupo de Abílio Diniz, mas seis pontos já foram definidos para servir de base.

Os argumentos constam de um curto briefing de uma página que está orientando os primeiros passos da empresa para defender o negócio junto aos órgãos reguladores. Para que o Cade aprove sem restrições a compra, será necessário que a companhia prove que ela não gerou concentração de mercado capaz de prejudicar os consumidores finais. Para isso, o Pão de Açúcar precisa responder a uma pergunta básica: o impacto da fusão repercute em qual mercado? O argumento inicial é de que a operação ocorre "no mercado de varejo de bens duráveis, nos diversos canais de venda". Por mais vago que pareça, esse enunciado é estratégico para o Grupo Pão de Açúcar, porque, ao deslocar a defesa para o setor e abranger vários canais - como a internet -, o peso da aquisição fica bem mais diluído.

O segundo ponto do Pão de Açúcar será mostrar que o varejo de bens duráveis é "altamente competitivo", com os lojistas brigando intensamente por preço. Um grande número de redes disputa os consumidores, e algumas são fortes regionalmente, como a rede Insinuante no Nordeste. Além disso, o Pão de Açúcar deve observar que grandes redes de materiais de construção ensaiam sua entrada no mercado de bens duráveis, seguindo o exemplo do que ocorre em outros países. (Continua)


Ainda pequeno

Por isso, o terceiro argumento que deve balizar o Pão de Açúcar é que a empresa resultante da fusão terá um peso limitado no panorama concorrencial. Segundo a corretora Ativa, a nova companhia nasce com uma fatia de 23% do mercado de eletroeletrônicos. Mas o Pão de Açúcar vai considerar o setor de bens duráveis como um todo, argumentando que sua participação é inferior a 20%. Essa linha já havia aparecido na entrevista coletiva de sexta-feira, quando o empresário Abílio Diniz, presidente do conselho de administração do Pão de Açúcar, destacou que existem mais de 20.000 pontos-de-venda do varejo no país. Somadas, as redes da nova companhia criada com a fusão do Ponto Frio, Casas Bahia e Extra Eletro terão 1.055 lojas - o equivalente a 5% dos pontos físicos de venda. "A operação não prejudica a concorrência, mantendo intensa rivalidade no mercado", afirma o briefing.

O grupo vai lembrar, ainda, que a internet vem se transformando em um importante concorrente do varejo tradicional. Este é o quarto argumento. Além de ser um canal de vendas, a internet também oferece ferramentas de comparação de preços entre os diversos lojistas. Assim, o consumidor pode direcionar sua compra efetivamente para a loja que lhe propuser melhores condições de preço, financiamento e prazo de entrega. "O comércio eletrônico tem incrementado a concorrência", afirma o breve texto.

Fácil de entrar

Quem entende de concorrência afirma que não basta haver concentração de mercado para que uma operação sofra restrições ou seja reprovada pelo Cade. É preciso, também, que a companhia em análise tenha poder de inibir a entrada de novos rivais no mercado. É o que se chama barreira de entrada. A imagem de um muro mais ou menos alto é exatamente o que as autoridades têm em mente quando analisam os obstáculos para abrir uma empresa no setor - quanto maior a barreira, menos concorrência potencial. Para o Pão de Açúcar, o varejo de bens duráveis é um "mercado com baixas barreiras a entrada". Abrir uma loja no setor, segundo a companhia, é bastante acessível - tanto para concorrentes nacionais, quanto estrangeiros. O argumento se estende ao fato de que, hoje, é fácil também operar em lojas de nichos - como as especializadas em produtos de informática, celulares, cozinha planejada, etc. (Continua)


O último ponto é que a fusão da Casas Bahia com o Ponto Frio e o Extra Eletro vai gerar grandes ganhos de sinergia - estimadas em 2 bilhões de reais. Os analistas de mercado e especialistas em varejo deram reiteradas declarações, desde sexta-feira, de que o negócio realmente faz sentido do ponto de vista operacional. As economias de escala que poderiam ser geradas viriam da racionalização da logística, do maior poder de barganha em compras, do enxugamento do quadro administrativo, entre outros. Para o Pão de Açúcar, esses ganhos "se traduzirão em benefícios aos consumidores", seja em redução de preço, expansão de áreas de atuação ou diversificação do portfólio de produtos.

Contatos iniciais

O Pão de Açúcar já requisitou audiências nos três órgãos que compõe o Sistema Brasileiro de Concorrência, mas ainda não obteve retorno. A expectativa é que a empresa possa se reunir, ainda esta semana, com as autoridades regulatórias para explicar a operação. "A empresa está trabalhando para dar ao Cade todo o conforto para analisar o processo com tranquilidade", afirma uma fonte bastante próxima da negociação.

Segundo esse observador, a empresa não vê necessidade em um Acordo de Preservação da Reversibilidade da Operação (Apro) - uma medida adotada pelo Cade para congelar fusões complexas, com o objetivo de analisá-las com calma. "Há um bom espaço para que o Apro não seja necessário", diz. Muitos especialistas em fusões e aquisições destacam que, nos últimos tempos, o Cade tem sido mais conservador, e determinado o congelamento preventivo das grandes operações. Assim, muitos apostam que, mesmo não sendo necessário, o órgão pode seguir o mesmo caminho. Se isto acontecer, o Pão de Açúcar cumprirá a determinação. Mas a empresa não espera um congelamento radical, restringindo-se ao compromisso de o grupo não vender ou fechar lojas antes da aprovação do processo. (Continua)


Embora o Pão de Açúcar tenda a adotar a linha de que a abrangência do negócio tem de ser vista dentro do mercado nacional - e não local, ou cidade por cidade, etc -, a empresa não descarta mudar sua visão. Se ficar convencida de que mudar a escala do mercado relevante lhe for mais favorável, poderá mudar o enfoque para uma análise cidade a cidade, ou bairro a bairro.

Devido à complexidade da fusão, o Pão de Açúcar não demonstra pressa em apresentar o processo aos órgãos reguladores. A empresa pretende trabalhar com atenção todos os pontos relevantes da defesa - o que pode consumir todo o prazo legal.


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