Com queda no turismo, principal rede de hotéis de Gramado já tem um pedido de Natal: hóspedes
Setor espera retomada de clientes com volta do aeroporto e com o Natal, principal data turística para a cidade
Repórter de Negócios
Publicado em 9 de julho de 2024 às 08h30.
Última atualização em 11 de julho de 2024 às 16h15.
GRAMADO (RS) — Se fosse uma manhã normal de julho em Gramado, na serra gaúcha, a cidade estaria lotada de turistas fotografando o termômetro com temperaturas negativas, comprando casacos, gorros e luvas de lã nas lojas e fazendo filas nos cafés de manhã dos hotéis.
Neste ano, porém, algo está diferente. O frio segue lá. O termômetro, também. As lojas continuam abertas e os hotéis funcionando. Mas o turista sumiu.
Na sexta-feira em que a reportagem da EXAME esteve na cidade, eram poucas as pessoas consumindo ou circulando na Avenida Borges de Medeiros, a principal da cidade.
As enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul no fim de abril e início de maio paralisaram a operação da principal porta de entrada de turistas no Estado: o aeroporto Salgado Filho, de Porto Alegre. Como um efeito em cadeia, a ocupação e a movimentação em Gramado despencou.
Agora, para chegar na cidade, o turista de fora do Rio Grande do Sul precisa passar praticamente por uma maratona. Ou então, desembolsar muito dinheiro.
A base aérea militar de Canoas está operando diariamente, mas com muito menos voos do que havia em Porto Alegre, e com preços muito mais altos — uma passagem de ida e volta saindo de São Paulo pode custar mais de 3.000 reais.
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Tem quem esteja parando em Florianópolis, Santa Catarina, e pegando cerca de 10 horas de ônibus para chegar à serra gaúcha. A opção mais em conta é por Caxias do Sul, cidade também na Serra que fica a duas horas de Gramado. O problema é que no inverno, o aeroporto fecha com mais frequência por causa da neblina que toma conta da região. Além disso, a quantidade de voos também é bem menor do que a que existia em Porto Alegre.
Resumidamente: está complicado para o turista chegar à cidade. Assim, mesmo que o município não tenha sofrido com as enchentes, ele sofre pelos efeitos dela. E muito.
A Laghetto, principal rede de hotéis da serra gaúcha, com 14 operações entre Gramado e Canela, que o diga. Em maio, no pior momento da crise, a ocupação da empresa caiu 80% em relação a maio de 2023. Em junho, a ocupação foi 60% menor.
Qual é a estratégia da Laghetto
Agora, sem aeroporto, a empresa depende majoritariamente de turistas do próprio Rio Grande do Sul ou de estados vizinhos, como Santa Catarina e Paraná.
Em junho, por exemplo, a ocupação foi principalmente aos finais de semana. Mais especificamente, aos sábados.
“Imagina que o turista vem de Porto Alegre, por exemplo, depois do trabalho na sexta-feira, ou então sábado de manhã”, afirma Cristiane Mörs, diretora de Vendas e Marketing da Laghetto. “Nossa ocupação funciona muito bem no sábado, mas durante a semana, está tudo muito parado ainda”.
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Em julho, a expectativa é um pouco melhor. Com as férias de inverno, os gaúchos, que também estão impossibilitados de irem a outros estados por causa do aeroporto, podem escolher Gramado como ponto de descanso.
“Seguimos vendendo, mas estamos com uma estimativa de fechar julho com uma ocupação de 60%”, diz. “Normalmente, julho é um dos nossos melhores meses. Normalmente nossa média era de 90% de ocupação no mês. Não é ruim agora, mas não é o que estávamos acostumados”.
Para atrair turistas, a empresa também precisou diminuir o preço das diárias em cerca de 30% a 40%, o que afeta no tíquete médio do mês, e lançou campanhas para estimular o turismo na região, com reservas mais em conta.
Nos últimos dois meses, ainda tomou estratégias de redução de custos. Em maio e parte de junho, por exemplo, precisou focar nas hospedagens em alguns poucos hotéis. Assim, o turista que chegava num hotel poderia ser direcionado a outro, reduzindo assim gastos como de energia. Mesmo assim, houve demissão de cerca de 35% do total de funcionários.
“E ficamos pensando que, como somos os maiores da região, ainda somos privilegiados porque, quando as coisas retomam, somos os primeiros a serem procurados”, diz. “Imaginamos que várias pousadas e hotéis menores não vão conseguir passar dessa crise”.
A estimativa do setor é que os prejuízos na área turística pelo fechamento do aeroporto cheguem à casa dos 550 milhões de reais. O governo federal trabalha numa linha de crédito específica para o setor, mas o dinheiro ainda não foi liberado.
Como a Laghetto quer dar a volta por cima
A grande questão da Laghetto, assim como de outros negócios de Gramado, é tentar mostrar ao turista que a cidade está segura e operando bem.
De fato, no caminho de Porto Alegre à cidade, que a reportagem fez numa sexta-feira chuvosa, não houve muitas intempéries. Só chegando em Gramado que o trânsito afunila por obras numa das pistas, onde houve um desmoronamento.
Mas qualquer chuva é agora um motivo de tensão para os gaúchos.
“Nos finais de semana que há previsão de chuva, sempre temos um monte de cancelamentos”, afirma Cristiane. “Tentamos informar o cliente que as coisas estão seguras, que é normal chover no inverno no Rio Grande do Sul”.
Na cidade, se não fosse um vazio estranho para a época do ano, tudo estaria normal. Praticamente todos os restaurantes reabriram, assim como as lojas e hotéis. Também não falta mercadoria. O que está faltando são, mesmo, os turistas.
Quais são as expectativas para o Natal
Se julho será destinado ao público gaúcho, a expectativa em Gramado está praticamente toda para o período mais quente da cidade, o Natal.
A cidade é conhecida pelo Natal Luz, um festival natalino com uma série de programações especiais sobre a data comemorativa.
Neste ano, depois de várias edições cobrando para acessar o desfile de Natal, a principal atração do evento, a cidade decidiu colocá-lo de volta no espaço público. Dessa vez, o cliente não precisará pagar para ver o cortejo.
“A ideia é tirar o estigma que ficou de que os espetáculos são muito caros”, diz Cristiane. “O desfile volta agora para a rua coberta, até como um agradecimento para quem está aqui, em Gramado”.
Na verdade, para a Laghetto e para o setor, os hóspedes serão o grande presente de Natal. Mas quem vai trazê-lo não é o Papai Noel, e sim o aeroporto. Há previsão de que o espaço reabra entre outubro e dezembro.
“Não existe a possibilidade do aeroporto não voltar para o Natal Luz”, afirma Cristiane. “Seria um desastre. O mais forte do festival é novembro e dezembro. Já estamos trabalhando com esse foco. Vai ser o sinal da nossa retomada”.
Negócios em Luta
A série de reportagensNegócios em Lutaé uma iniciativa da EXAME para dar visibilidade ao empreendedorismo do Rio Grande do Sul num dos momentos mais desafiadores na história do estado. Cerca de 700 mil micro e pequenas empresas gaúchas foram impactadas pelas enchentes que assolaram o estado no mês de maio.
São negócios de todos os setores que, de um dia para o outro, viram a água das chuvas inundar projetos de uma vida inteira. As cheias atingiram 80% da atividade econômica do estado, de acordo com estimativa da Fiergs, a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul.
Os textos doNegócios em Lutamostram como os negócios gaúchos foram impactados pela enchente histórica e, mais do que isso, de que forma eles serão uma força vital na reconstrução do Rio Grande do Sul daqui para frente. Tem uma história? Mande paranegociosemluta@exame.com.