Caso Odebrecht avança no Peru, mas trava na América Latina
Quatro ex-presidentes do Peru recebiam propina da Odebrecht para favorecer participação de empreiteira em projetos
Estadão Conteúdo
Publicado em 18 de julho de 2019 às 07h39.
Última atualização em 18 de julho de 2019 às 07h48.
A Odebrecht admitiu que pagou US$ 788 milhões (cerca de R$ 3 bilhões) de propina em 12 países, entre 2001 e 2016. Os subornos foram pagos em troca da participação da empreiteira em pelo menos 100 projetos e obras públicas. O escândalo afetou a elite política do Peru, mas vem sendo praticamente ignorado em outros países da América Latina.
Ontem, o ex-presidente peruano Alejandro Toledo foi transferido para o centro de detenção do Edifício Phillip Burton, em San Francisco, nos EUA. A prisão de Toledo foi o último capítulo de mais um desdobramento da Lava Jato no Peru.
Ele é acusado de receber US$ 20 milhões para conceder à Odebrecht a construção da Rodovia Interoceânica, quando foi presidente do Peru, entre 2001 e 2006.
Toledo é um dos quatro ex-presidentes do Peru envolvidos na Lava Jato. Todos receberam mandados de prisão preventiva depois das investigações da Procuradoria. Ollanta Humala chegou a ficar preso por nove meses e foi libertado após decisão judicial.
Pedro Pablo Kuczynski teve a pena transferida para prisão domiciliar em consequência da idade avançada e Alan García cometeu suicídio quando os policiais foram à sua residência prendê-lo, em um desdobramento que chocou o país.
O escândalo afetou até o maior nome da oposição, Keiko Fujimori, acusada de lavar US$ 1,2 milhão provenientes de fundos ilícitos da construtora brasileira para a campanha presidencial de 2011.
Em entrevista ao semanário mexicano Processo, Alejandro Gertz Manero, procurador-geral do México, se referiu ao Peru como o país que teve "mais sucesso" nas investigações do escândalo da Odebrecht.
O México é um exemplo de como o caso não recebeu a mesma atenção judicial. No início do mês, um juiz federal emitiu um mandado de prisão contra Emilio Lozoya Austin, ex-diretor da Pemex, estatal mexicana do petróleo, que teria recebido US$ 10 milhões da empreiteira brasileira. Hoje, ele vive foragido na Alemanha.
O mesmo padrão de subornos se repete na Argentina, Colômbia, República Dominicana, Equador, Guatemala, Panamá e Venezuela. Na maioria dos países, ficou evidente a má vontade das procuradorias.
Mesmo no caso colombiano, país de alto grau de institucionalidade, a investigação foi lenta. Um processo contra a campanha do ex-presidente Juan Manuel Santos, em 2014, prescreveu.
Ao jornal O Estado de S. Paulo, analistas peruanos disseram que a demanda por obras de infraestrutura no Peru, a fragilidade dos partidos, o histórico de corrupção e o revezamento de presidentes que receberam propinas da Odebrecht, aliados à ação agressiva do Ministério Público, explicam por que a Lava Jato atingiu quatro ex-presidentes.
O cientista político Arturo Maldonado avalia que os partidos, enfraquecidos desde a ditadura de Alberto Fujimori, não têm força suficiente para se impor. "Uma vez que os presidentes saem de cena desprestigiados e sem uma organização por trás, se tornam um alvo fácil", disse Maldonado, em entrevista ao O Estado de S. Paulo em abril.
Outro fator determinante foi o boom econômico e o aumento da demanda por obras de infraestrutura. Entre 2002 e 2013, o Peru nunca cresceu menos de quatro pontos porcentuais por ano - exceção feita a 2009, quando a crise financeira fez a economia crescer apenas 1,1%.
A prosperidade, de acordo com e o economista Óscar Dancourt, da Pontifícia Universidade Católica do Peru, expandiu o consumo, os investimentos, atraiu capital externo e, consequentemente, aumentou a corrupção. (Com agências internacionais)