Negócios

Bezos: um novo rei para uma nova era

Não é apenas a troca de quem é o mais rico do momento - a ascensão de Jeff Bezos indica uma mudança de essência no mundo dos negócios

Bezos: não é a primeira vez que Bezos ocupa a posição de pessoa mais rica do mundo (Drew Angerer/Getty Images)

Bezos: não é a primeira vez que Bezos ocupa a posição de pessoa mais rica do mundo (Drew Angerer/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 30 de outubro de 2017 às 19h28.

Última atualização em 30 de outubro de 2017 às 20h36.

Pense em Michael Schumacher e Ayrton Senna. Ainda que a rivalidade tenha sido interrompida pela tragédia que tirou a vida de Senna, a ultrapassagem seria natural. Schumacher era de uma geração mais jovem, e estava em ascensão.

No mundo dos esportes, a chegada de um novo número 1 evidencia a passagem do tempo e, não raro, a elevação dos padrões de competição. Traz consigo também um estilo novo. Ninguém chega à liderança sem ter um estilo próprio.

No mundo dos negócios, há algo a mais. A chegada de um novo número 1 evidencia não apenas uma mudança de estilo (pessoal ou da companhia), mas também – talvez principalmente – uma mudança nas regras do jogo.

Bill Gates foi o empresário mais bem-sucedido do mundo durante vários e vários anos, porque capitaneou uma revolução gigantesca, da qual ainda hoje sentimos os efeitos: o nascimento da era dos computadores pessoais, e dos softwares.

Warren Buffett, que também deteve a coroa de pessoa mais rica do mundo, evidenciava outra característica do mundo dos negócios: a volta da importância da visão de longo prazo, da racionalidade pé-no-chão, depois de um período de explosão criativa (e exageros especulativos). Carlos Slim representava a globalização e o crescimento da indústria das telecomunicações.

Pode-se dizer que as pessoas mais ricas do mundo hoje deveriam ser os sócios majoritários da Apple ou da Alphabet (leia-se Google), mas a diluição de ações nessas companhias é maior do que na Amazon, e isso os torna menos bilionários que Jeff Bezos.

De qualquer forma, a revolução capitaneada por Apple e Google é fantástica, mas segue a mesma linha da de Gates – apenas com máquinas menores e softwares mais sofisticados. Bezos é um bicho diferente. E a chegada dele ao posto de pessoa mais rica do planeta, no final da semana passada, é símbolo de uma nova era.

Ainda não está totalmente clara qual é a natureza, nem a extensão, da revolução da Amazon.

Sabe-se que tem a ver com o comércio digital, com a ascensão das companhias que se assumiram como plataformas em vez de produtoras-vendedoras, com a nova perspectiva de que crescimento é mais importante que lucro, com a tendência de, neste mundo novo, erguer e defender impérios que tendem ao monopólio.

Bezos está na crista de todas essas ondas. Não é de agora. Mas agora a sua onda ficou maior, mais volumosa, mais assustadora que as ondas anteriores.

Os bilionários não podem se queixar

A ultrapassagem ocorreu na sexta-feira, depois que a Amazon divulgou um relatório de resultados trimestrais ainda melhor do que as já otimistas expectativas dos investidores. A receita cresceu 34%, para 43,5 bilhões de dólares (a expectativa era de 41,6 bilhões).

E deve crescer ainda mais. A companhia prevê para o quarto trimestre uma receita entre 56 bilhões e 60,5 bilhões de dólares, 38% acima do mesmo período no ano passado – e também ao norte da expectativa dos analistas.

O lucro é minguado em relação a essa montanha de dinheiro: 256 milhões de dólares. Mas este é o modelo de negócios da Amazon, e os investidores parecem satisfeitos com isso.

Esses números provocaram, obviamente, uma alta no preço das ações da Amazon: 13%, a maior em mais de dois anos. Como tem cerca de 80 milhões de ações da empresa que fundou, a fortuna de Bezos cresceu… 10,4 bilhões de dólares.

Não é a primeira vez que Bezos ocupa a posição de pessoa mais rica do mundo. No final de julho, ele passou Bill Gates… mas por apenas quatro horas.

Naquela ocasião, o relatório da Amazon não foi tão bom quanto se esperava, as ações caíram e Gates voltou a tomar a liderança do ranking de bilionários.

Desta vez, foi diferente. A fortuna de Bezos está estimada em 93,8 bilhões de dólares, uma dianteira de mais de 5 bilhões em relação a Gates – que ocupava a liderança do ranking organizado pela Bloomberg desde 2013.

Não tem sido um ano ruim para Bezos. Ele ficou 28,5 bilhões de dólares mais rico. A média é de 104 milhões de dólares por dia. Ou 4,3 milhões de dólares por hora; ou 72.000 dólares por minuto.

Gates também não ficou parado. A Microsoft também divulgou resultados ótimos, e suas ações subiram. Só que Gates não lucrou tanto quanto Bezos.

Sua fortuna cresceu “apenas” 550 milhões de dólares no trimestre. Claro, Gates poderia ter ganhado mais. Mas, em agosto, ele doou 4,6 bilhões de dólares em ações da Microsoft à Fundação Bill & Melinda Gates.

Larry Page e Sergey Brin, fundadores do Google, tiveram ganhos de 2 bilhões de dólares. Mark Zuckerberg, do Facebook, ganhou mais 2,1 bilhões de dólares, nesta leva de notícias positivas para as empresas de tecnologia.

Aliás, os bilionários como um todo não podem se queixar. Sua fortuna conjunta chegou a 6 trilhões de dólares, de acordo com um relatório da consultoria PwC e da empresa de serviços financeiros UBS. Foi um crescimento médio de 17% no ano passado, bem acima do da população em geral. Mas, nessa turma de privilegiados, Bezos ainda se destaca.

A musculatura de Bezos

Não foi só a fortuna de Bezos que aumentou. Seu corpo está maior. Fotos recentes de paparazzi que tomaram a internet mostram um Bezos musculoso, com camisa polo e um colete, exibindo bíceps que parecem capazes de levantar vários sacos de dólares.

Aos 53 anos, sua imagem contrasta com a do nerd mais puxado para o franzino que fundou a Amazon em 1994. É como se ele estivesse se revigorando para uma segunda etapa de crescimento.

De fato, a Amazon está em vias de escolher sua segunda sede. A cidade de Seattle ficou pequena para a empresa. E Bezos lançou uma espécie de licitação para ver qual cidade teria a honra de abrigar sua expansão.

De olho em algo como 20 bilhões de dólares em investimentos e 50.000 empregos ao longo de duas décadas, 238 cidades dos Estados Unidos, Canadá e México fizeram propostas para abrigar a sede número 2 da Amazon. A escolha deverá ser feita no ano que vem.

A nova sede – não uma filial, mas uma “segunda matriz”, nas palavras da Amazon – marca um período em que a Amazon se espraia por praticamente todos os setores da economia.

Se o jornalista Brad Stone errou em algo no título de seu livro sobre Bezos, A loja de tudo, não foi na parte do tudo, mas no substantivo loja. A Amazon ambiciona ser tudo de tudo.

No final de agosto, ela comprou o mercado Whole Foods, por 13 bilhões de dólares, e está reduzindo preços.

Este mês de outubro, um relatório da consultoria McKinsey sobre o setor bancário adverte: “nós pensávamos que as fintechs seriam a principal ameaça ao setor. Em vez disso, está claro que as companhias de e-commerce como a Amazon e o Alibaba estão remodelando uma indústria depois da outra, borrando fronteiras entre setores.”

O braço da Amazon que financia pequenas empresas já emprestou mais de 3 bilhões de dólares para mais de 20.000 negócios em sua plataforma.

No campo da inteligência artificial, Bezos afirmou que “apenas no último mês nós lançamos cinco aparelhos com o sistema Alexa, anunciamos uma integração da Alexa com a BMW, ultrapassamos a marca das 25.000 habilidades, a integramos com os alto-falantes Sonos, a ensinamos a distinguir entre duas vozes, e muito mais”.

Até no ramo da farmácia a Amazon está pondo o pé. Uma notícia do St. Louis Post Dispatch afirmou este mês que a Amazon já detém licenças de operar farmácias em pelos menos 12 estados americanos. O indício foi o suficiente para fazer as ações dos maiores fornecedores do setor caírem.

A Amazon emprega hoje mais de 540.000 pessoas, um acréscimo de assombrosos 77% do pessoal desde o ano passado (incluindo a compra da Whole Foods).

E a empresa ainda está contratando engenheiros de software, representantes de vendas e técnicos de várias áreas para sua divisão de computação em nuvem.

A expansão chegou ao Brasil. Este mês, a empresa inaugurou a venda de eletrônicos pelo seu site. Também já tem – embora ainda embrionário – o serviço de vídeos Prime Video, abastecido por produções de seus estúdios próprios.

Talvez nem a Terra seja o suficiente para as ambições de Bezos. Em outubro, sua companhia de foguetes Blue Origin testou com sucesso seu primeiro motor de foguete, o BE-4. Quase três vezes mais potente que o motor da SpaceX, do bilionário Elon Musk.

Tudo isso leva a crer que a primeira vez que Bezos subiu ao posto de pessoa mais rica do mundo durou apenas quatro horas. Mas agora o reinado parece que vai se estender por muito tempo.

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