As oito horas que levaram Parente a sucumbir à crise
A decisão de cortar em 10% o preço do diesel como resposta à greve fez as ações da estatal Petrobras despencarem na B3
Mariana Fonseca
Publicado em 24 de maio de 2018 às 18h09.
Última atualização em 24 de maio de 2018 às 19h20.
Em três dias, os caminhoneiros mergulharam o Brasil numa profunda crise de abastecimento. Para Pedro Parente , presidente da Petrobras , oito horas cruciais de reuniões e deliberações resultaram em uma promessa quebrada aos investidores - a de que a estatal não venderia combustível abaixo dos preços de mercado por preocupações políticas. A decisão de cortar em 10% o preço do diesel como resposta à greve fez as ações da estatal despencarem na B3.
Parente acordou na quarta-feira e se deparou uma verdadeira crise logística: voos cancelados em alguns aeroportos em meio à escassez de combustível, ônibus parados no Rio de Janeiro, produtos desaparecendo das prateleiras dos supermercados. A maioria dos postos da cidade-sede da companhia estavam ficando sem combustíveis.
Parente convocou a primeira reunião com a gerência da Petrobras no final da manhã de quarta-feira. Toda a diretoria estava presente, a reunião levou cerca de uma hora. Os oito executivos concordaram que a situação era crítica - e não apenas para o país. Nem a Petrobras estava imune. Algumas das operações da empresa, incluindo suas refinarias, também estavam sendo impactadas pelo fluxo restrito de combustível, bens e trabalhadores.
Os caminhoneiros ganharam influência ao atacar uma das principais vulnerabilidades do Brasil. Mais de 60% dos bens e 90% das pessoas viajam por rodovias, segundo a Confederação Nacional dos Transportes.
A diretoria concluiu que a empresa poderia ter que tomar medidas ainda até o fim do dia para dissipar o impasse e evitar uma crise operacional. Parente e sua equipe decidiram esperar mais algumas horas e acompanhar os acontecimentos, já que a reunião entre o governo e os líderes da greve estava marcada para a tarde, oferecendo algumas esperanças de que as tensões poderiam diminuir.
Mas os caminhoneiros mantiveram-se firmes quando o governo se recusou a atender as demandas para aliviar os preços dos combustíveis. Os bloqueios continuaram.
Parente convocou uma segunda reunião por volta das 17:00. Enquanto isso, a situação piorou ainda mais, com paralisações também de frigoríficos, paradas de fábricas e mais cancelamentos de voos. Pela segunda vez no dia, ficariam pouco mais de uma hora no gabinete de crise.
“A situação estava ficando mais e mais grave, de uma forma muito rápida,” explicou Parente em uma conferência por telefone com analistas.
Numa decisão unânime, a diretoria decidiu que era hora de suspender temporariamente a política de preços de mercado que havia perseguido nos últimos dois anos, sempre elogiada por investidores e analistas de Wall Street.
Daí veio a decisão de cortar o preço do diesel em 10% e congelá-lo por 15 dias, a um custo de R$ 350 milhões, com o objetivo de ganhar tempo. Os executivos começaram a preparar um comunicado e uma coletiva de imprensa, que foi convocada às 18:20 para ser iniciada às 19:00.
Sempre pontual, Parente atrasou a coletiva. Estava no telefone com o presidente Michel Temer, comunicando sua decisão antes de torná-la pública.
O anúncio fez os papéis da empresa em Nova York, que ainda estava com o mercado aberto, despencarem imediatamente.
Para os investidores, voltaram as lembranças do tempo do governo de Dilma Rousseff, quando a estatal tinha de segurar preços e vender combustível com prejuízo, resultando em uma perda estimada de US$ 40 bilhões.
Parente, que foi nomeado pelo presidente Michel Temer para o cargo em 2016, prometeu na época desistir do posto se o governo o pressionasse a vender combustível abaixo do preço de mercado. Mas, a situação agora parecia diferente, com a pressão dos caminhoneiros.
O dano à credibilidade da empresa durará mais de oito horas. "Bem-vindo de volta a 2013, quando a Petrobras retorna ao seu status duvidoso como a única empresa de petróleo que perde dinheiro quando o Brent sobe", disse James Gulbrandsen, gerente de recursos da NCH Capital, com sede no Rio de Janeiro.
Parente foi a Brasília na manhã de quinta-feira, para conversar pela primeira vez pessoalmente com o presidente. Durante sua breve estada na cidade, analistas de pelo menos quatro grandes bancos rebaixaram a recomendação para a empresa.
De volta ao Rio com uma queda de mais de 14% das ações, Parente convocou uma conferência por telefone com analistas às 14:30 na quinta-feira, para estancar as perdas.
“Foi uma situação excepcional, que exigiu uma decisão excepcional," disse. “A Petrobras já fez sua parte, agora é com o governo.”