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Um teste de resistência

Pioneira em sustentabilidade no Brasil, a Natura tem agora o desafio de voltar a crescer apoiada em seus velhos valores

Carlucci, presidente da Natura (--- [])

Carlucci, presidente da Natura (--- [])

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h26.

Poucas empresas brasileiras têm a preocupação com a sustentabilidade gravada em seu DNA desde o nascimento. A fabricante de cosméticos Natura, fundada em 1969, é um dos raros exemplos -- e, naquele tempo, conceitos como "responsabilidade social" e "sustentabilidade" nem sequer haviam sido definidos formalmente. Desde então, a empresa vem construindo sua marca como uma companhia empenhada em questões socioambientais. Neste ano, ela anunciou duas medidas que reforçam essa postura. Uma delas foi a total eliminação de testes em cobaias -- uma prática que era motivo de fortes críticas de entidades que atuam em defesa dos animais. A outra foi o lançamento do projeto de redução de gases geradores do efeito estufa em sua cadeia produtiva. "Essas duas iniciativas eram sonhos antigos, que a Natura conseguiu realizar neste ano", diz Alessandro Carlucci, presidente da empresa.

A primeira iniciativa é a ponta-de-lança de uma mudança mais radical que a Natura vem promovendo em sua linha de produtos. Além de abolir testes em animais, ela está, aos poucos, mudando as fórmulas de seus cosméticos. Saem de cena os ingredientes animais e minerais (provenientes do petróleo) e entram matérias-primas vegetais. Os sabonetes foram a primeira linha de produtos a passar por essa mudança, em 2005, num processo que a companhia chama de "vegetalização". O sebo de boi, a matéria-prima mais usada, foi substituído por óleos vegetais. "Quando o consumidor perceber que, em vez de tomar banho com sebo de boi, terá óleos vegetais, é claro que ele dará preferência ao sabonete vegetalizado", diz Carlucci. Embora a empresa esteja fazendo investimentos em pesquisa para que a troca de materiais não interfira na aparência, na cor e no cheiro dos produtos, algumas mudanças serão inevitáveis. O preço dos cosméticos, segundo o próprio Carlucci, deve subir, embora ainda não seja possível estimar quanto. "Ainda estamos mensurando e tentando mitigar esse impacto." Apesar do risco, especialistas acreditam que a marca se fortalecerá com essa iniciativa. "Certamente, os clientes da Natura de menor poder aquisitivo vão se afastar num primeiro momento", afirma a analista Diana Litewski, da corretora carioca Ativa. "Mas os consumidores mais esclarecidos vão se manter fiéis e novos clientes passarão a consumir a marca devido às ações de sustentabilidade."
 

Neutralização do carbono
Para reforçar essa imagem, a empresa aposta também no projeto Carbono Neutro. A idéia é reduzir ao mínimo as emissões de gases geradores do efeito estufa em toda a cadeia produtiva. Para alcançar o objetivo, a Natura trabalha em várias frentes: trocou os microônibus a diesel que transportavam funcionários dentro da fábrica, em Cajamar, na Grande São Paulo, por carrinhos movidos a gás natural; substituiu o álcool utilizado nas fórmulas de perfumes por álcool orgânico (produzido sem agrotóxicos ou queimadas) e está intensificando o uso de material reciclado nos frascos.

Para a Natura, é vital que essas iniciativas tragam resultados positivos -- não só para sua imagem mas também para suas finanças. Depois de décadas de crescimento acelerado, pela primeira vez a empresa está passando por dificuldades. Nos primeiros nove meses deste ano, o lucro caiu mais de 5% em relação ao mesmo período de 2006. Recentemente, um grupo de funcionários da fábrica da Natura ameaçou entrar em greve. Os empregados reclamavam do excesso de trabalho e reivindicavam aumento de salários. "A situação agora está estável. A Natura manteve todos os canais de diálogo abertos com o sindicato", diz Carlucci.

Avaliação da empresa
Pontos fortes
- O programa de neutralização de carbono é considerado um dos mais eficazes por especialistas.
- Tem parceria com comunidades da Amazônia e da Bahia,que são treinadas para fazer o extrativismo sustentado de produtos como a castanha.
- Baniu o uso de testes em animais em 100% de sua linha de produtos.
Pontos fracos
- Embora não divulgue os custos do programa de neutralização de carbono, a empresa admite tratar-se de um investimento que vai ser repassado aos preços ao consumidor.
- Ainda é muito dependente de matérias-primas oriundas do petróleo.A linha de cremes para a pele,por exemplo, continuará a usar componentes minerais.
- Os funcionários reivindicam aumento salarial e se queixam de metas de produtividade difíceis de alcançar.
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