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Todos os nomes de Donald Trump

Lourival Sant’Anna Sim, parece que Donald Trump está firme na ideia de cumprir algumas de suas principais promessas — para o deleite de seus eleitores e consternação de boa parte da humanidade. É o que indicam os primeiros sinais da composição de sua equipe de governo, marcada por três características: diversidade (mulheres, negro, asiática), inexperiência […]

DONALD TRUMP E JAMES MATTIS: presidente eleito dos EUA deve confirmar o general como secretário de defesa / Drew Angerer/ Getty Images

DONALD TRUMP E JAMES MATTIS: presidente eleito dos EUA deve confirmar o general como secretário de defesa / Drew Angerer/ Getty Images

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Da Redação

Publicado em 26 de novembro de 2016 às 06h18.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h15.

Lourival Sant’Anna

Sim, parece que Donald Trump está firme na ideia de cumprir algumas de suas principais promessas — para o deleite de seus eleitores e consternação de boa parte da humanidade. É o que indicam os primeiros sinais da composição de sua equipe de governo, marcada por três características: diversidade (mulheres, negro, asiática), inexperiência com administração pública — como, de resto, o próprio chefe — e afinidade com algumas das posições mais radicais de Trump durante a campanha.

Começando pelo que mais interessa ao Brasil: de acordo com a imprensa americana, o presidente eleito deve nomear para o Departamento do Comércio o bilionário Wilbur Ross, que o ajudou a elaborar seus planos de erguer barreiras protecionistas contra a China e o México, e também de reduzir os impostos sobre as empresas, de 35% para 15%. Numa linguagem muito parecida com a de Trump, Ross tem dito que “os Estados Unidos precisam se livrar das amarras de acordos comerciais ruins”, e tem também defendido a imposição de tarifas alfandegárias contra produtos chineses. Trump prometeu aplicar tarifas de até 45% sobre os produtos chineses e de 35% sobre os mexicanos, com o intuito de fazer as indústrias americanas voltarem para os Estados Unidos.

Ross, de 78 anos, conhecido como “o rei da falência”, por ter acumulado uma fortuna de 2,9 bilhões recuperando empresas quebradas e depois as vendendo, tem uma casa na mesma rua de Trump, no balneário de Mar-a-Lago, em Palm Beach (Flórida). Além de conversarem bastante, Ross promoveu um jantar de arrecadação de doações para a campanha de Trump, no qual o então candidato pediu sugestões de planos de governo aos endinheirados participantes.

“Parte da razão pela qual estou apoiando Trump é que acho que precisamos de uma abordagem nova e mais radical do governo, em relação ao que tivemos antes”, explicou Ross em uma entrevista em junho à rede de TV CNBC. Ele critica a perda de poder aquisitivo da classe média baixa, e elogia o estilo “politicamente incorreto” de Trump.

O vice de Ross deverá ser outro bilionário: Todd Ricketts, dono do time de beisebol Chicago Cubs e filho de Joe Ricketts, o fundador do banco de investimentos TD Ameritrade. Tod, de 47 anos, tem sido um generoso e influente doador do Partido Republicano, que inicialmente apoiou o pré-candidato Scott Walker, governador de Wisconsin, e depois se voltou para Trump. Ele se reuniu no sábado, 19, durante uma hora com o vice-presidente eleito Mike Pence na casa de Trump em Bedminster, no estado de Nova Jersey.

Donald Evans, secretário de Comércio do republicano George W. Bush, explicou assim a função: “Você é um embaixador da América para o mundo. É decisivamente importante, quando você vai a outros países, que, em primeiro lugar, você demonstre que se preocupa com os cidadãos daqueles países”. Bom, isso era na época em que os governos republicanos gostavam do livre comércio. Durante a campanha, Trump repetiu inúmeras vezes que os americanos tinham sido enganados nos acordos com seus parceiros comerciais e que, em seu governo, “nenhum cidadão americano voltará a sentir que suas necessidades vêm depois das necessidades de países estrangeiros”.

Outra promessa que pode ter um efeito desestabilizador sobre o mundo é a de “acabar logo o serviço” com o Estado Islâmico (EI) na Síria e no Iraque. Para executar essa tarefa, ele deve nomear secretário de Defesa o general James Mattis, de 66 anos, do Corpo de Fuzileiros Navais (cuja patente no Brasil equivale à de almirante). Mattis é a favor do envio de tropas terrestres, se necessário, para derrotar os terroristas, um passo que Obama evitou e que mesmo Hillary Clinton, embora mais linha dura que o presidente democrata, também havia descartado.

Durante a campanha, Trump demonstrou uma impaciência com o ritmo da ofensiva contra o Estado Islâmico que por vezes beirou o desprezo contra o comando das Forças Armadas, sob o governo Obama. Ele ridicularizava o fato de a ofensiva contra Mossul ter sido anunciada de antemão, o que para ele deu chance para os terroristas fugirem da cidade iraquiana.

O último posto de Mattis, antes de ir para a reserva, em 2013, foi no Comando Central, que abrange países como Síria, Iraque, Irã e Afeganistão. Obama o nomeou em 2010 por indicação do então secretário de Defesa Robert Gates, originário do governo Bush, que o presidente democrata manteve do início de seu primeiro mandato, em 2009, até 2011. Mas o mandou para a reserva em 2013, por causa de sua posição em favor de um ataque militar ao Irã, em vez do acordo nuclear que acabou firmado no ano passado — um dos principais feitos da política externa de Obama, ao lado da reaproximação com Cuba.

Apelidado por seus comandados de “Cachorro Louco”, Mattis é autor de frases memoráveis, que falam por si só sobre os rumos que a política de defesa tomará, sob Trump: “A primeira vez que você estoura alguém não é um evento insignificante. Dito isso, existem alguns babacas no mundo que só precisam tomar um tiro” (numa preleção a seus comandados); “Eu venho em paz. Não trouxe artilharia. Mas estou lhes rogando, com lágrimas nos olhos: se vocês me foderem, vou matar vocês todos” (para líderes tribais no Iraque); “Encontrem o inimigo que quer pôr fim a este experimento (a democracia americana) e matem um a um até que eles fiquem tão cansados da matança que deixem a nós e nossas liberdades intactas” (numa preleção).

Para o cargo de secretário de Estado, que conduz a política externa, a equipe do presidente eleito está dividida entre Mitt Romney, o ex-governador de Massachusetts que disputou a eleição com Obama em 2012, e Rudy Giuliani, ex-prefeito de Nova York e fiel escudeiro de Trump durante a corrida presidencial. Trump parece mais inclinado a Romney. Ambos tiveram “uma reunião muito substantiva” no domingo, 20, segundo o vice Mike Pence.

Muitos para culpar 

A principal dúvida parece recair sobre a resistência de Newt Gingrich, ex-presidente da Câmara, um dos primeiros figurões republicanos a aderir a Trump, e ferrenho defensor da nomeação de Giuliani: “Há enormes vantagens para Rudy Giuliani”, disse ele na segunda-feira, 21, ao sair de uma reunião com Trump. “Se você quer alguém que saia para ser um negociador duro para a América e representar o interesse americano da forma como Trump defendeu na campanha, acho que Rudy é provavelmente uma escolha melhor, e tem o temperamento certo.”

Seja como for, Giuliani terá um papel importante no governo Trump, que demonstra o desejo de premiar a lealdade das figuras centrais de sua campanha — quando enfrentava o fogo cruzado dos caciques do Partido Republicano, da imprensa e dos intelectuais. Ao deixar a prefeitura de Nova York, em 2001, Giuliani comprou e depois vendeu uma consultoria de investimentos e se associou a um escritório de advocacia. Disputou as primárias republicanas em 2008 e ultimamente tem viajado, dando palestras e consultorias para empresas e governos (como Colômbia e Catar), sendo pago para fazer defesas polêmicas, por exemplo do grupo esquerdista iraniano Mujahedin e-Khalq, que defende a derrubada violenta da teocracia do Irã, e é listado como organização terrorista pelo Departamento de Estado americano.

“Eu provavelmente viajei nos últimos 13 anos tanto quanto Hillary nos anos em que foi secretária de Estado (2009-2013)”, disse Giuliani em entrevista publicada na sexta-feira, 24, pelo The Wall Street Journal, na qual defendeu seu nome para o cargo. “Meu conhecimento de política externa é tão bom ou melhor do que de qualquer outro com quem estão falando. Estive na Inglaterra oito vezes; Japão, seis vezes; França, cinco vezes; China, três vezes — uma com Bill Clinton, a propósito.”

Além de sua candidatura a presidente em 2012, em que discutiu os grandes temas da política externa, a principal credencial de Romney nesse campo foi sua experiência como presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2002 em Salt Lake City, capital do estado de Utah. Romney construiu uma reputação de bom gestor ao resgatar a organização dos Jogos de uma crise e, na época, teve contato com muitos líderes mundiais.

Para se aproximar dele, no entanto, Trump teve de curar as feridas das primárias, quando Romney bateu muito duro no bilionário, questionando suas qualificações para o cargo de presidente. A rivalidade transbordou para as mulheres de ambos, que se criticaram mutuamente em público. Mas tudo indica que isso ficou para trás e Romney era visto como o favorito para o Departamento de Estado até a noite desta sexta-feira.

Na entrevista que concedeu ao The New York Times, na terça-feira, Trump deu a entender que pretende indicar seu genro Jared Kushner, de 35 anos, para um cargo especial, talvez como mediador do conflito palestino-israelense. “Ele é uma pessoa de qualidade e acho que pode ser muito útil”, declarou o presidente eleito. “Eu adoraria ser a pessoa capaz de fazer a paz entre Israel e os palestinos. Seria um grande feito, porque ninguém foi capaz disso.” Já não era uma tarefa fácil antes de Trump defender o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel — um tabu para os palestinos. Embora o governo israelense mantenha as sedes de seus ministérios em Jerusalém, a ONU e a comunidade internacional reconhecem Tel Aviv como capital, e consideram Jerusalém Oriental uma área sob ocupação israelense.

Marido de Ivanka, a filha mais velha de Trump, Kushner também é um herdeiro e grande empresário do setor imobiliário de Nova York, e participou ativamente da campanha do sogro. De acordo com o Times, ele consultou um advogado sobre a lei antinepotismo, para ver a possibilidade de assumir uma função no governo. A lei impede a contratação de parentes, mas Trump parece considerar o presidente isento desse conflito de interesses: “O presidente dos Estados Unidos pode ter os conflitos que quiser”, disse ele na entrevista. “Mas não quero ir por aí”, acrescentou, sugerindo que seu genro não teria um cargo oficial ou remunerado.

Durante a presidência de Bill Clinton (1993-2001), Hillary foi encarregada, sem sucesso, de negociar com o Congresso a aprovação de uma lei universalizando os convênios de saúde, como a que Obama conseguiu aprovar. Ela também não tinha um cargo formal nem remunerado, mas mesmo assim muitos consideraram isso uma violação do espírito da lei antinepotismo, que arranhou a imagem do casal e contribuiu para a vitória dos republicanos na Câmara e no Senado, nas eleições de meio de mandato de 1994.

Ainda na política externa, Trump escolheu a governadora da Carolina do Norte, Nikki Haley, de 44 anos, para ser embaixadora na ONU. Estrela ascendente do Partido Republicano e popular no seu Estado, Haley também foi uma dura crítica de Trump durante a campanha. Filha de indianos, ela trabalhou na companhia têxtil de sua família, Exotica International, antes de se eleger para seu primeiro mandato de governadora, em 2004. Haley liderou delegações comerciais de seu Estado na Índia, Suécia e Alemanha, entre outros países. Aí termina sua experiência com temas internacionais.

Nas áreas sociais, as escolhas de Trump vão na direção do Estado mínimo — coerente com sua campanha e com a linha republicana. Para o Departamento de Educação, ele anunciou outra bilionária, Betsy DeVos, presidente da Federação Americana para as Crianças, que defende o direito das famílias de obter apoio governamental para escolher escolas fora da rede pública, em duas modalidades: subsídios para “charter schools”, em geral geridas por organizações sem fins lucrativos, e bolsas de estudos, para pagar mensalidades de instituições privadas. Durante a campanha, Trump prometeu investir 20 bilhões de dólares em bolsas de estudos. Para os críticos, essas ideias representam uma ameça para a rede pública de ensino, um dos alicerces do sistema americano de oportunidades iguais e possibilidade de ascensão social para os pobres.

Betsy, grande doadora do Partido Republicano, cujo pai foi dono de uma fábrica de autopeças no Michigan, casou-se com Richard DeVos, herdeiro da rede varejista Amway, e ambos são sócios em uma empresa de energia eólica.

Para a Habitação e o Desenvolvimento Urbano, de acordo com a imprensa americana, Trump escolheu o neurocirurgião negro Ben Carson, autor de vários livros, personagem central do filme Mãos Talentosas, de 2009, e que disputou as primárias até março deste ano. Carson é um crítico da política instituída por Obama, de cobrar das cidades a adoção de medidas para coibir a segregação racial e econômica nos bairros, sob pena de perder verbas federais. Em sua autobiografia, que deu origem ao filme, ele conta que cresceu em um bairro pobre de Detroit ouvindo sua mãe lhe dizer: “Se você não for bem-sucedido, só tem você mesmo para culpar”.

Se Trump não for bem-sucedido, terá muitos para culpar. Mas muitos mais ainda vão lamentar.

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