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Resistência à covid-19 nas altitudes dos Andes surpreende especialistas

No Peru, segundo país com mais casos de coronavírus na América Latina, menos de 10% dos contágios foram registrados na serra andina

machu-picchu- (Reprodução/Reprodução)

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AFP

Publicado em 20 de junho de 2020 às 11h05.

Última atualização em 20 de junho de 2020 às 11h10.

Os habitantes de regiões com altitudes elevadas dos Andes da Bolívia e Peru resistiram melhor ao coronavírus que os compatriotas que moram ao nível do mar, o que chamou a atenção dos especialistas. No Peru, segundo país com mais casos de coronavírus da América Latina, atrás apenas do Brasil, a pandemia provocou devastação nas cidades da costa, incluindo Lima, e na região de selva de Loreto, onde nasce o rio Amazonas.

Porém, menos de 10% dos contágios foram registrados na serra andina, acima dos 3.000 metros de altura, como em Cusco, que foi capital do império Inca, onde os casos são comparativamente poucos e o número de mortes mínimo.

"Registramos os casos que existem em cidades (andinas peruanas) como Cusco, Huaraz, Cajamarca, Cerro de Pasco, Abancay, Huancavelica e, efetivamente, existem menos casos", declarou à AFP Augusto Tarazona, diretor da Comissão de Saúde Pública do Colégio Médico do Peru. "Nas cidades elevadas os casos são mínimos e a mortalidade é quase zero. Isto chamou nossa atenção", completa.

Na vizinha Bolívia acontece o mesmo: os contágios se concentram nas regiões de baixa altitude do leste: na tropical Santa Cruz e na região amazônica de Beni, na fronteira com o Brasil. "A frequência de contágios é consideravelmente menor na Bolívia nas regiões de altitude, como La Paz (na zona andina), em comparação com o que se registra nas zonas baixas como Santa Cruz", explica à AFP o diretor de Epidemiologia do ministério da Saúde, Virgilio Prieto.

Os balanços oficiais do coronavírus nos dois países confirmam: na região de selva de Loreto há 7.953 contágios e 321 mortes, enquanto em Cusco, que tem população 50% maior, registra apenas 1.494 casos e 13 mortos.

Em Piura, na costa norte (com 1,8 milhão de habitantes), há 14.659 casos e 661 vítimas fatais, enquanto a andina Arequipa (1,4 milhão) registra 5.454 casos e 145 óbitos.

O índice de mortalidade em Loreto é de 4,04%, enquanto em Cusco é de 0,87%. Em Lambayeque, na costa norte peruana, alcança 5,79%, mas na andina Ayacucho 0,83%. Em Lima, na costa central, é de 2,42%.

Na Bolívia acontece algo similar: Santa Cruz tem 12.988 casos, enquanto La Paz, com quase a mesma população, registra 1.386. Santa Cruz e a amazônica Beni somam 68% das mortes pela pandemia no país.

Beni registra 3.326 casos, enquanto na andina Oruro são 443, apesar de uma população 20% maior.

O Peru, com 33 milhões de habitantes, registra mais de 244.000 casos de coronavírus e 7.461 mortes. A Bolívia, de 11 milhões, se aproxima de 21.500 casos, com 697 vítimas fatais.

Hipoxia permanente

A vida não é fácil na altitude andina, onde se desenvolveu a grande civilização inca. Até o momento não existe uma resposta científica que explique o que acontece com o coronavírus em grandes alturas, mas chave estaria no sistema respiratório das pessoas que vivem em um ambiente com menos oxigênio, segundo cientistas.

"São aspectos ainda teóricos e os estudos profundos estão começando", disse o doutor Tarazona. "As pessoas com hipoxia (falta de oxigênio) crônica podem ter uma quantidade menor de receptores ECA (enzima conversora da angiotensina), que são os receptores de porta de entrada para o vírus", disse o infectologista peruano Eduardo Gotuzzo à AFP.

"O vírus tem menos portas de entrada e pode produzir menos contagiados", completa. Tarazona destaca que"está começando a ser teorizado que os receptores ECA teriam algumas diferenças nas pessoas que moram nos Andes devido a sua hipoxia permanente".

"Isso faz com que se adaptem a um sistema de respiração com menos oxigênio, e isso de alguma forma influencia na fisiopatologia do vírus dentro do corpo humano. Há uma adaptação do corpo para não reter o vírus", acrescenta.

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