Quem é o campeão olímpico russo que rompeu laços com Putin
Aleksander Lesun, medalhista nas Olimpíadas do Rio, em 2016, é um dos poucos atletas russos a criticar publicamente a guerra na Ucrânia. Ele admite que sua carreira "acabou"
Da Redação
Publicado em 23 de abril de 2022 às 08h00.
Era 22 de fevereiro quando Aleksander Lesun decidiu não mais competir pela Rússia e renunciou a suas posições na equipe nacional, em meio às tensões que cresciam no leste europeu. Dois dias depois, o governo do presidente Vladimir Putin iniciaria os ataques à Ucrânia .
Lesun afirma que, naquele momento, entendeu que "o mundo nunca mais seria o mesmo". E sua carreira também não.
VEJA TAMBÉM
- Lewis Hamilton e Serena Williams interessados em comprar o Chelsea
- Secretário-geral da ONU pede encontro com Putin e Zelensky
- Cancelar artistas e atletas russos não leva a lugar nenhum
O atleta de 33 anos do pentatlo moderno, que foi campeão olímpico na Rio 2016, se tornou um dos poucos esportistas de alto nível e personalidades na Rússia a criticar publicamente a guerra. E admite que sua trajetória no esporte parece ter se encerrado por essa decisão.
Em uma entrevista à BBC, ele afirmou que, possivelmente, a decisão significa sua aposentadoria, e que não tinha um "plano B" e nem ofertas para sair da Rússia, tendo agido somente por "impulso". Agora, tem trabalhado fora do esporte, ele diz.
Oficialmente, Lesun não é russo: nasceu soviético, no território que é hoje Belarus (antiga Bielorrússia), quando o país ainda fazia parte da antiga URSS.
Depois, com a separação da URSS, Lesun virou bielorrusso, mas esse status sozinho não duraria muito. Quando começou a praticar esportes na pequena Belarus, que não seguiu o amplo apoio aos esportes que a URSS costumava dar, o atleta percebeu que teria mais condições financeiras e técnicas na carreira se competisse pela Rússia. Quando teve a chance, se naturalizou russo em 2009.
O resto é história. Ao todo, Lesun ganhou 14 medalhas em campeonatos mundiais para a Rússia, sendo quatro vezes campeão mundial. O ouro no pentatlo moderno no Rio foi a maior conquista de sua carreira - o vencedor no pentatlo é o que obter a maior pontuação somando cinco modalidades: hipismo, esgrima, natação, tiro esportivo e corrida.
No Rio, o segundo colocado foi, inclusive, um ucraniano, o pentatleta Pavlo Tymoshchenko.
À BBC Sports, Lesun diz que sua avó é russa e ele tinha desde sempre muitos parentes no país. Por isso, afirma que não se naturalizou apenas pelo apoio esportivo, mas porque se sentia "orgulhoso de competir representando a bandeira russa".
Agora, afirma que muitos atletas estão de mãos atadas, ou sequer entendem o que acontece. "Sinto muito em admitir que os atletas da Rússia não conseguem influenciar a situação. E muitos deles nem sequer entendem o que está acontecendo", disse.
Ao relatar a história de Lesun, a rede britânica aponta como ele "cuidadosamente" não usa durante a entrevista a palavra "guerra", terminologia proibida na Rússia para descrever a situação da Ucrânia. O governo tem chamado a guerra de "operação militar especial", e as penas para presos em protestos contra a guerra podem chegar a três anos ou até 15 a depender da infração.
Alguns outros poucos atletas russos tem falado sobre a situação na Ucrânia, usando estratégias como pedidos de paz, e não mensagens diretas contra as decisões do governo Putin.
Foi o caso dos tenistas Daniil Medvedev e Andrey Rublev, que agora competem sob uma bandeira "neutra", e não mais russa. A lendária tenista Maria Sharapova também disse "rezar pela paz" em uma postagem no Instagram e tentou mandar sua mensagem doando às crianças na guerra.
"A cada dia que passa, estou mais e mais com o coração partido e profundamente triste pelas imagens e histórias de famílias e crianças afetadas pelo escalamento desta crise na Ucrânia", escreveu a tenista.
Na outra ponta, muitos atletas, artistas e personalidades russos têm sido banidos de competições e eventos internacionais. A Copa do Mundo de futebol no Catar, em novembro, também não terá a seleção russa. A questão gera controvérsias e debates sobre o quanto russos devem ser punidos para pressionar o governo.
Enquanto isso, o campeão do pentatlo Lesun diz que alguns atletas têm sido forçados a cooperar com a mensagem de Putin, enquanto outros efetivamente concordam com a situação, em parte porque não tem acesso a informação externa. Como em todos os países, o esporte é uma poderosa máquina de convencimento, e os governos, na Rússia e fora dela, pretendem usá-la.