Agência de notícias
Publicado em 7 de dezembro de 2024 às 08h39.
Em uma manobra para evitar a deposição do presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, deputados do governista Partido do Poder Popular (PPP) abandonaram a sessão convocada neste sábado para votar o impeachment do mandatário, que decretou lei marcial no começo da semana — uma medida que abalou as estruturas políticas de uma das principais democracias da Ásia. Sem votos do partido da situação, o impeachment de Yoon não pode ser aprovado.
Para que o presidente seja afastado, são necessários 200 votos dos 300 do Legislativo. De acordo com a CNN e a BBC, apenas 194 parlamentares estavam no Parlamento às 6h30 deste sábado (horário de Brasília). Só um parlamentar do Partido do Poder Popular (PPP), Ahn Cheol-soo, permaneceu no local e, depois, a correligionária Kim Ye-ji se juntou a ele — outros 106 governistas saíram antes da votação.
Hoje, além dos 192 votos da oposição, é preciso que oito governistas votem contra Yoon — logo depois do fim do pronunciamento, o líder do partido do presidente sinalizou que seus deputados deveriam aprovar o afastamento.
Em pronunciamento de sete horas, Yoon Suk-yeol pediu desculpas ao povo coreano pela declaração, na terça-feira, da lei marcial no país, um mecanismo normalmente usado em tempos de guerra e graves crises sociais, mas que foi empregado para tentar ajudar o impopular líder a continuar no cargo.
“Sinto muito e peço sinceras desculpas aos cidadãos, que se sentiram muito angustiados.” disse Yoon, em sua primeira aparição pública desde a terça-feira.
Hoje, além dos 192 votos da oposição, é preciso que oito governistas votem contra Yoon — logo depois do fim do pronunciamento, o líder do partido do presidente.
Segundo ele, a decisão de invocar a lei marcial "nasceu do desespero do presidente, que é o responsável final pelos assuntos de Estado, mas que no processo causou ansiedade e transtorno para o povo". Ele negou que poderia fazer uma nova declaração de lei marcial, se referindo a rumores que circulam desde a quinta-feira no meio político sul-coreano.
“Não fugiremos da questão da responsabilidade legal e política em relação a esta declaração de lei marcial” disse Yoon. “Deixarei o futuro plano de estabilidade política, incluindo o meu mandato, para o nosso partido. Mais uma vez inclinamos a cabeça em desculpas por causar preocupação aos nossos cidadãos.”
A fala soou como uma tentativa de apaziguar os sul-coreanos, que acompanharão, às 17h pelo horário local, 5h da manhã em Brasília, a votação na Assembleia Nacional sobre a moção movida pelo bloco de oposição, majoritário, sobre seu impeachment.
“O desempenho normal dos deveres do presidente é impossível sob estas circunstâncias e uma rápida renúncia do presidente é inevitável” disse Han Dong-hoon, líder do Partido do Poder Popular (PPP).
Lee Jae-myung, líder da oposição, afirmou que "não há outra saída senão a renúncia imediata e o impeachment do presidente", segundo a agência Yonhap. Park Chan-dae, outra liderança oposicionista, disse que se a moção não passar, ele irá "imediatamente apresentá-la na sessão extraordinária da Assembleia Nacional".
Pelas regras, se o impeachment for aprovado, Yoon será imediatamente afastado e o primeiro-ministro, Han Duck-soo, assume o cargo de forma interina. Logo em seguida, a decisão será levada à Corte Constitucional, onde seis dos nove ministros precisam confirmá-la para selar o afastamento — se não aprovarem, a Assembleia poderá repetir a votação. Caso aprovem, Han segue no poder e novas eleições deverão ocorrer até 60 dias após o afastamento definitivo.
Caso confirmada a derrota, Yoon Suk-yeol se tornará o terceiro presidente a sofrer impeachment no século XXI. Segundo uma pesquisa do instituto Realmeter, 73,6% dos sul-coreanos defendem sua saída do cargo.
Eleito com uma vantagem de menos de um ponto percentual em 2022, Yoon Suk-yeol se tornou um dos mais impopulares presidentes da História recente da Coreia do Sul, com índices que raramente superavam os 30%. Seu governo mesclou atos populistas — como a saída da Casa Azul, a antiga sede da Presidência, sob pretexto de economia de gastos — com uma condução errática de políticas públicas e, especialmente, da economia. Os altos preços dos imóveis, um fator que contribuiu para sua vitória, persistiram, erodindo o apoio em uma parcela dos sul-coreanos que o apoiaram na campanha.
A postura de enfrentamento com a Coreia do Norte, acompanhada por ameaças de conflito militar com um vizinho que tem armas nucleares, não recebeu grande apoio, e os escândalos em série, inclusive envolvendo a primeira-dama, pareciam pavimentar seu mandato para um fim antecipado, ainda mais com um Parlamento de oposição.
Sob pressão, Yoon usou um mecanismo que não era invocado desde a ditadura militar, no final dos anos 1970, a lei marcial, citando uma suposta ameaça norte-coreana mas, na verdade, se referindo às dificuldades enfrentadas para aprovar projetos e manter no cargo seus ministros — em fevereiro, Lee Sang-min, titular da pasta do Interior, sofreu impeachment, mas ficou no governo após uma decisão judicial. A pressão sobre seu Gabinete foi citada no discurso de terça-feira, quando anunciou a lei marcial.
Sob ordens do presidente, tropas cercaram o Parlamento, mas não impediram que 190 deputados, incluindo do partido de Yoon, derrubassem a lei marcial, dando início a uma discussão sobre sua permanência no cargo, cada vez mais ameaçada. Inicialmente, sua sigla, o Partido do Poder Popular, disse que votaria contra o pedido de impeachment apresentado pela oposição, mas nesta sexta-feira as lideranças partidárias mudaram de ideia. Em entrevista, Han Dong-hoon disse que a decisão se devia a informações de que Yoon ordenou a prisão de políticos durante a lei marcial, inclusive a dele.
“À luz dessas novas revelações, cheguei à conclusão de que é necessário suspender o presidente Yoon de exercer seu mandato para proteger a Coreia do Sul e seu povo” disse Han, afirmando ainda que Yoon “não estava reconhecendo seus erros”. “Se Yoon continuar no cargo temo que haverá um grande risco de ações radicais como esse estado de emergência se repetirem, e ele colocará a Coreia do Sul e seu povo em grande perigo.”
Lee Jae-myung, derrotado por Yoon em 2022 e que também estava na lista de políticos que deveriam ser presos pelas tropas, afirmou que a democracia na Coreia do Sul está "em seu momento mais crítico", e defende que o presidente seja investigado por seus crimes, inclusive por alta traição, um delito que pode levar à pena de morte (suspensa no país desde 1997).
“A Coreia do Sul está em crise devido ao 'conflito interno de Yoon Suk-yeol'” disse Lee nesta sexta-feira a jornalistas. “Yoon é um gênio do crime.”