Pittsburgh: "Fui eleito para representar os cidadãos de Pittsburgh, não de Paris", declarou Trump (Justin K. Aller/Getty Images)
AFP
Publicado em 2 de junho de 2017 às 21h08.
Última atualização em 2 de junho de 2017 às 22h43.
Os moradores de Pittsburgh que apressavam o passo para ir ao trabalho nesta sexta-feira já sabiam da notícia: para seu desgosto, o presidente Donald Trump havia usado, na véspera, a cidade como exemplo para justificar a retirada dos Estados Unidos do Acordo de Paris sobre o clima.
"Fui eleito para representar os cidadãos de Pittsburgh, não de Paris", declarou Trump na quinta-feira no jardim da Casa Branca.
"Ele tem na cabeça a ideia de que o acordo prejudicaria as indústrias pesadas e a extração de minério, mas já faz tempo que não nos dedicamos a isso aqui", diz David Sandy, de 36 anos, sob a sombra da grande torre da siderúrgica US Steel, um dos símbolos da antiga capital do aço.
Pittsburgh, de cerca de 300.000 habitantes, é conhecida por suas majestosas pontes de aço que atravessam os dois grandes rios que emolduram o centro urbano.
Mas agora são os bancos, as companhias de saúde e os institutos de pesquisa que empregam seus habitantes, que se deslocam em metrô ou em bicicletas de livre disponibilidade.
"Não conheço nenhum operário da siderurgia", acrescenta David.
Muitos dos moradores mais velhos contam a mesma história: em meados do século XX, a poluição das aciarias era tal que não se podia usar camisa branca sem que esta ficasse preta.
"Era um inferno, muito sujo, altos-fornos por todos os lados", lembra Daniel Fore, advogado de 55 anos que morou em Pittsburgh a vida inteira. "Os empregos eram bem pagos, mas a poluição era horrível. Agora o centro está bonito", diz.
Da sua casa, em uma colina com vista para Pittsburgh, através do rio Monongahela, Bill Bobak, um maquinista aposentado, é categórico: "Meu pai me dizia não se podia ver a cidade daqui" por causa da poluição.
Esta cidade deixou de perder habitantes. Noelle Ivankevich, de 29 anos, veio estudar há dez anos e ficou. Hoje trabalha na Federated Investors, uma grande instituição financeira.
"Meu pai era operário na siderurgia, mas eu acredito nas mudanças de época, é preciso melhorar o mundo", afirma.
No quinto andar do edifício de pedra cinza do município, o prefeito de Pittsburgh não podia acreditar no que estava ouvindo durante o pronunciamento de Donald Trump.
"Entrei no escritório do meu chefe de gabinete e lhe disse: 'Pittsburgh?'", conta o prefeito Bill Peduto à AFP no dia seguinte desse episódio, que deu uma repentina notoriedade mundial à sua cidade.
"Acho que ele tinha na cabeça a Pittsburgh de 40 anos atrás, quando ainda era um centro mundial de produção de aço e da indústria", afirma. "Mas essa época chegou ao fim na década de 1970".
O prefeito narra como a cidade se recuperou da crise econômica dos anos 1970 e 1980 "plantando as sementes" de uma nova economia. A Universidade Carnegie Mellon abriu um laboratório de robótica em 1979.
Os fabricantes de automóveis estabelecem hoje associações de pesquisa, e a Google, Uber, Microsoft e Tesla desenvolvem suas tecnologias do futuro. Bairros inteiros mudaram de fisionomia para acolhê-los.
Com ou sem Trump, o prefeito desta cidade muito democrata assegura que tentará cumprir os objetivos de redução de emissões aprovados localmente, investindo em imóveis ecológicos e transportes públicos.
As the Mayor of Pittsburgh, I can assure you that we will follow the guidelines of the Paris Agreement for our people, our economy & future. https://t.co/3znXGTcd8C
— bill peduto (@billpeduto) June 1, 2017
Essas inovações nem sempre são observadas nos arredores de Pittsburgh, observa Darlene Harris, uma legisladora local de 64 anos. Ela lembra que o oeste da Pensilvânia não é o paraíso tecnológico promovido pelo prefeito.
"Acho que o presidente falou de toda a região, não apenas da cidade", diz.
Pittsburgh recebe nestes dias uma conferência de economistas ambientais. Entre duas sessões, Marc Hafstead, da organização Resources for the Future, expressa sua perplexidade diante dos três trilhões de dólares mencionados por Donald Trump como o suposto custo do acordo climático para os Estados Unidos.
"Eles superestimam muito o custo", aponta. Mas diante das promessas de crescimento verde dos defensores do Acordo de Paris, ele adverte que as regulamentações anti-carbono terão um custo para a economia - menor do que o que Donald Trump disse, mas não nulo.