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Para que(m) serve a economia verde?

Refinar o conceito da "economia verde" e definir quem vai pagar a conta dessa transição é um dos nós que mais geram divergências na Conferência da ONU, mas é preciso desatá-lo

Quando se passa em revista as crises que o mundo enfrenta fica difícil ignorar a necessidade de mudança (Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

Vanessa Barbosa

Publicado em 21 de junho de 2012 às 09h17.

Rio de Janeiro - O desenvolvimento sustentável é uma ideia de apenas 25 anos. Não há dúvidas de que houve avanços significativos desde sua criação, mas ainda há muito por se fazer. Agora, já se fala em um novo conceito, tão atraente quanto: a economia verde, tema que norteia as negociações da alta Cúpula na Rio+20 iniciadas ontem.

Ao longo dos últimos dois anos anos, a palavra alçou voos para fora das amarras dos círculos acadêmicos e virou mainstream do discurso político, empresarial e até de apelos ambientalistas. No caminho, surgiram inúmeros relatórios sobre esse novo modelo econômico - que uniria o melhor de dois mundos, crescimento e preservação ambiental - e estratégias para transformá-lo em realidade.

Conforme definido pelo Pnuma, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em relatório lançado em 2011, a economia verde resulta na "melhoria do bem-estar humano e na equidade social, ao mesmo tempo que reduz os riscos ambientais e escassez ecológica". Falta saber se, na prática, trata-se de um conceito mais amplo que o do desenvolvimento sustentável ou complementar. Será a economia verde capaz de tornar o mundo sustentável e socialmente justo além de assegurar o crescimento econômico de todos os paises?

Falta consenso. "Países desenvolvidos, principalmente, os mais pobres, pensam na economia verde como mais uma conceito criado pelos ricos para impedir que eles cuidem de seu próprio desenvolvimento, que precisa ser inclusivo", diz o economista britânico Tim Jackson. "Enquanto as nações desenvolvidas querem transformar a economia verde em crescimento verde, com inovação e tecnologias de baixo carbono para gerar produtos e serviços mais sustentáveis", destaca.

Não por acaso esse é um dos pontos que mais emperram as negociações na Conferência da ONU, mas é preciso desatar esse nó. Afinal, quando se passa em revista a sequência de crises multidimensionais que o planeta enfrenta - a econômica, financeira, climática, de segurança alimentar e políticas - fica difícil ignorar a necessidade de mudança.

"A transição para uma economia verde deve ser vista como uma oportunidade de transformar as estruturas e relações de poder para uma sociedade mais inclusiva e resiliente", sugere Ivan Turok, diretor executivo do Conselho de Pesquisa em Ciências Humanas da África do Sul. "É também uma forma mais eficaz de estimular a economia global do que simplesmente estimular o consumo indiscriminado, que degrada o meio ambiente", destacou durante um evento paralelo à Rio+20.

Ricos x pobres

Refinado o conceito, será preciso responder a uma pergunta ainda mais urgente: quem vai bancar a economia verde? Segundo relatório do Pnuma, para alavancar a transição para um novo modelo, seria necessário investimento de 2% do PIB mundial - ou US$ 1,3 trilhão por ano - em setores estratégicos, que vão da agricultura, construção, energia e pesca ao transporte, indústria e resíduos.


Ninguém discute que os países pobres precisam de ajuda financeira para colocar em prática o desenvolvimento sustentável e fazer a transição para a economia verde de uma maneira que atenda à suas necessidades. A divergência se instala na hora de saber quem vai financiar essa transformação. Para os países pobres cabe às nações ricas o encargo.

Mas há claros sinais de que os mais ricos não fazem questão de cumpri-lo, ainda que isso signifique ir na contramão dos compromissos assumidos na Eco-92. À exemplo do princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas (RCPD), que define que todos os países têm o dever comum de preservar o planeta, sendo que as responsabilidade maior, de concretizar as ações do desenvolvimento sustentável, ficaria com os países desenvolvidos, uma vez que foram eles os que por mais tempo se beneficiaram do atual modelo econômico.

A ideia soa desagradável: a proposta do G-77 (grupo em desenvolvimento) de criar um fundo verde de 30 bilhões de dólares foi rejeitada pelos Estados Unidos, União Europeia, Canadá e Japão. Decepcionados, os negociadores do G-77 abandonaram as discussões sobre economia verde. Se depender das nações ricas, a criação de um fundo pode ser adiada até 2014.

É nessa queda de braço que as reuniões da ONU costumam se desenrolar, anos a pós anos. "Governos não vão nos tirar dessa bagunça. Essa é uma responsabilidade das sociedades que devem liderar seus políticos", afirmou o especialista americano Jeffrey Sachs, diretor do Earth Institut centro de referência em estudo sobre desenvolvimento sustentável, durante um dos Diálogos Sustentáveis, evento oficial da Rio+20 voltado para engajar a sociedade no debate. "Sou totalmente favorável a incentivos que possam ajudar a redirecionar a economia. Mas sei bem que no meu país [EUA] isso é impossível porque o setor de óleo praticamente domina o governo", disse.

Para o professor da Universidade de Columbia, é mais eficaz estabelecer objetivos que a sociedade civil - representada por universidades, empresas, Ongs e insituições - possa ter sucesso, como os Objetivos do Milênio, adotados no ano 2000 pela ONU que inspiraram uma geração pelo mundo a lutar contra pobreza, fome e doenças, pressionado, assim, os governos a agir. "Eles vão ter que nos seguir, porque é isso que eles fazem para se manter no poder", diz.

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Rio de Janeiro - O desenvolvimento sustentável é uma ideia de apenas 25 anos. Não há dúvidas de que houve avanços significativos desde sua criação, mas ainda há muito por se fazer. Agora, já se fala em um novo conceito, tão atraente quanto: a economia verde, tema que norteia as negociações da alta Cúpula na Rio+20 iniciadas ontem.

Ao longo dos últimos dois anos anos, a palavra alçou voos para fora das amarras dos círculos acadêmicos e virou mainstream do discurso político, empresarial e até de apelos ambientalistas. No caminho, surgiram inúmeros relatórios sobre esse novo modelo econômico - que uniria o melhor de dois mundos, crescimento e preservação ambiental - e estratégias para transformá-lo em realidade.

Conforme definido pelo Pnuma, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em relatório lançado em 2011, a economia verde resulta na "melhoria do bem-estar humano e na equidade social, ao mesmo tempo que reduz os riscos ambientais e escassez ecológica". Falta saber se, na prática, trata-se de um conceito mais amplo que o do desenvolvimento sustentável ou complementar. Será a economia verde capaz de tornar o mundo sustentável e socialmente justo além de assegurar o crescimento econômico de todos os paises?

Falta consenso. "Países desenvolvidos, principalmente, os mais pobres, pensam na economia verde como mais uma conceito criado pelos ricos para impedir que eles cuidem de seu próprio desenvolvimento, que precisa ser inclusivo", diz o economista britânico Tim Jackson. "Enquanto as nações desenvolvidas querem transformar a economia verde em crescimento verde, com inovação e tecnologias de baixo carbono para gerar produtos e serviços mais sustentáveis", destaca.

Não por acaso esse é um dos pontos que mais emperram as negociações na Conferência da ONU, mas é preciso desatar esse nó. Afinal, quando se passa em revista a sequência de crises multidimensionais que o planeta enfrenta - a econômica, financeira, climática, de segurança alimentar e políticas - fica difícil ignorar a necessidade de mudança.

"A transição para uma economia verde deve ser vista como uma oportunidade de transformar as estruturas e relações de poder para uma sociedade mais inclusiva e resiliente", sugere Ivan Turok, diretor executivo do Conselho de Pesquisa em Ciências Humanas da África do Sul. "É também uma forma mais eficaz de estimular a economia global do que simplesmente estimular o consumo indiscriminado, que degrada o meio ambiente", destacou durante um evento paralelo à Rio+20.

Ricos x pobres

Refinado o conceito, será preciso responder a uma pergunta ainda mais urgente: quem vai bancar a economia verde? Segundo relatório do Pnuma, para alavancar a transição para um novo modelo, seria necessário investimento de 2% do PIB mundial - ou US$ 1,3 trilhão por ano - em setores estratégicos, que vão da agricultura, construção, energia e pesca ao transporte, indústria e resíduos.


Ninguém discute que os países pobres precisam de ajuda financeira para colocar em prática o desenvolvimento sustentável e fazer a transição para a economia verde de uma maneira que atenda à suas necessidades. A divergência se instala na hora de saber quem vai financiar essa transformação. Para os países pobres cabe às nações ricas o encargo.

Mas há claros sinais de que os mais ricos não fazem questão de cumpri-lo, ainda que isso signifique ir na contramão dos compromissos assumidos na Eco-92. À exemplo do princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas (RCPD), que define que todos os países têm o dever comum de preservar o planeta, sendo que as responsabilidade maior, de concretizar as ações do desenvolvimento sustentável, ficaria com os países desenvolvidos, uma vez que foram eles os que por mais tempo se beneficiaram do atual modelo econômico.

A ideia soa desagradável: a proposta do G-77 (grupo em desenvolvimento) de criar um fundo verde de 30 bilhões de dólares foi rejeitada pelos Estados Unidos, União Europeia, Canadá e Japão. Decepcionados, os negociadores do G-77 abandonaram as discussões sobre economia verde. Se depender das nações ricas, a criação de um fundo pode ser adiada até 2014.

É nessa queda de braço que as reuniões da ONU costumam se desenrolar, anos a pós anos. "Governos não vão nos tirar dessa bagunça. Essa é uma responsabilidade das sociedades que devem liderar seus políticos", afirmou o especialista americano Jeffrey Sachs, diretor do Earth Institut centro de referência em estudo sobre desenvolvimento sustentável, durante um dos Diálogos Sustentáveis, evento oficial da Rio+20 voltado para engajar a sociedade no debate. "Sou totalmente favorável a incentivos que possam ajudar a redirecionar a economia. Mas sei bem que no meu país [EUA] isso é impossível porque o setor de óleo praticamente domina o governo", disse.

Para o professor da Universidade de Columbia, é mais eficaz estabelecer objetivos que a sociedade civil - representada por universidades, empresas, Ongs e insituições - possa ter sucesso, como os Objetivos do Milênio, adotados no ano 2000 pela ONU que inspiraram uma geração pelo mundo a lutar contra pobreza, fome e doenças, pressionado, assim, os governos a agir. "Eles vão ter que nos seguir, porque é isso que eles fazem para se manter no poder", diz.

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