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Os fatores mais importantes para a recuperação da economia global em 2021

Mesmo com uma vacina eficaz, o retorno ao normal levará tempo e dependerá das políticas que os principais países seguirem nos próximos meses

Joe Biden, presidente eleito dos Estados Unidos: se os líderes políticos estiverem à altura do desafio, 2021 não precisa ser o pior dos tempos, mesmo que também não seja o melhor (Leah Millis/Reuters)

Joe Biden, presidente eleito dos Estados Unidos: se os líderes políticos estiverem à altura do desafio, 2021 não precisa ser o pior dos tempos, mesmo que também não seja o melhor (Leah Millis/Reuters)

À medida que nos aproximamos do ano novo, algo está muito claro: a covid-19 não vai simplesmente desaparecer, como o derrotado presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, repetidamente sugeriu que aconteceria. Embora tenha havido uma substancial recuperação econômica desde as profundezas dos bloqueios iniciais na primavera passada, as perdas para o PIB e o emprego em todo o mundo são suficientes para tornar esta a segunda ou terceira pior recessão dos últimos cem anos. E isso é verdade mesmo quando parece cada vez mais claro que uma vacina eficaz está para acontecer.

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Mesmo assim, o retorno ao normal levará tempo, o que levanta a questão de quanto dano ocorrerá nesse ínterim. A resposta vai depender das políticas econômicas que os principais países seguirem nos próximos meses. Já existe um significativo potencial para efeitos de histerese (prologados). Os balanços patrimoniais das famílias e das empresas que foram destruídos serão restaurados apenas gradualmente; as empresas que faliram durante a pandemia não se tornarão repentinamente “não falidas” no momento em que o vírus for controlado.

Ao controlar esses efeitos, um grama de prevenção seria igual a um quilo de cura. Ainda assim, a perspectiva de curto prazo continua muito difícil de ser absorvida.

Um dos motivos é a China. Após a crise de 2008, a China desempenhou papel central na recuperação global, alcançando um crescimento anual de cerca de 12% até 2010. Mas, desta vez, o crescimento da China pós-crise é mais moderado, e o aumento de seu superávit comercial implica menos apoio para a economia global do que forneceu no passado. De forma mais ampla, embora as economias avançadas do mundo tenham conseguido incorrer em enormes déficits fiscais para evitar perdas significativas no PIB, os governos dos países em desenvolvimento e dos mercados emergentes não podem fornecer nada perto do mesmo nível de apoio.

Além das incertezas associadas a potenciais ondas futuras de infecções por covid-19 — como a que abateu sobre a Europa e os Estados Unidos no final de 2020 —, haverá duas questões primordiais em 2021. A União Europeia e os Estados Unidos promulgarão programas de recuperação com a necessária magnitude para restaurar a economia global? E a comunidade internacional se reunirá para fornecer ao mundo em desenvolvimento a necessária assistência?

As eleições de 2020 nos Estados Unidos não resolveram essas incertezas. Com o desempenho dos democratas abaixo das expectativas em muitas disputas pelo Senado e pela Câmara, o governo Biden pode não ter o apoio que precisa do Congresso para aumentar seus gastos com incentivos. Antes das eleições, Trump — que nunca viu uma restrição, um orçamento ou qualquer outra coisa, que ele não quisesse violar — estava explorando a possibilidade de outro pacote de incentivo, apenas para encontrar resistência do líder da maioria republicana no Senado, Mitch McConnell. Resta saber se os esforços de Biden para restaurar a cortesia bipartidária serão bem sucedidos.

Tendo já cortado impostos sobre bilionários e corporações, os republicanos parecem dispostos a assumir a austeridade fiscal mais uma vez, a fim de negar aos democratas quaisquer conquistas importantes. Para esse fim, os republicanos proporão um pacote fiscal “magro” que faria muito pouco para ajudar os governos estaduais e locais ou os desempregados. Se esse estímulo limitado for tudo o que o governo federal pode reunir, tanto os Estados Unidos quanto o mundo passarão por um período difícil.

Os europeus, por sua vez, uniram-se de maneira histórica para enfrentar o impacto econômico da pandemia. No entanto, o fundo de recuperação de 750 bilhões de euros (ou 886 bilhões de dólares) da União Europeia não é suficiente, especialmente agora que a região foi duramente atingida por uma segunda onda epidêmica. Será a Europa capaz de se unir novamente para atravessar mais uma rodada de assistência mútua? Do contrário, seu prognóstico — tanto política quanto economicamente — será duvidoso, na melhor das hipóteses.

Isso deixa a arena internacional mais ampliada, onde o presidente dos Estados Unidos tradicionalmente goza de significativo poder. A chefe do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva, já pediu outra emissão de 500 bilhões de dólares em Direitos Especiais de Saque (DES, ativos de reserva em moeda estrangeira mantidas pelo FMI), o que seria enormemente útil para reativar a economia global, especialmente agora que vários países ricos se comprometeram a doar ou emprestar suas verbas para os países que mais precisam deles. Por nenhuma razão aparente além da maldade, a administração Trump se opôs à emissão de novos DES. A esperança agora é que Biden reverta a abordagem dos Estados Unidos, não apenas em relação aos DES, mas também na cooperação internacional em geral.

Da mesma forma, há uma necessidade urgente de mais liderança na reestruturação da dívida. A recessão da covid-19 colocou muitos países em desenvolvimento e mercados emergentes em uma precária situação financeira. O que começou como um problema de liquidez se transformou em um problema de solvência: muitos países simplesmente não têm recursos para pagar dívidas pendentes. Raramente antes o princípio consagrado de força maior — tolerância em face de eventos extraordinários — foi mais relevante. Aqui, novamente, Biden poderia fazer uma grande diferença trabalhando com os líderes dos países credores e lembrando a todos que outra crise global da dívida não seria do interesse de ninguém.

Com a liderança de Biden e alguma cooperação dos republicanos do Congresso e outros líderes mundiais, há uma chance de percorrer rapidamente nosso caminho através da crise da covid-19. A situação exige um compromisso de se fazer "o que for preciso". Se os líderes políticos estiverem à altura do desafio, 2021 não precisa ser o pior dos tempos, mesmo que também não seja o melhor.

A promessa de campanha de Biden de "reconstruir melhor" pode e deve ser mais do que apenas um slogan. Está totalmente em nosso poder construir um mundo pós-pandêmico que seja mais sustentável, justo, cooperativo e competente do que aquele que tínhamos antes da crise.


* Joseph E. Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de economia e professor da Universidade Colúmbia, é economista-chefe do Instituto Roosevelt e ex-vice-presidente sênior e economista-chefe do Banco Mundial. Seu livro mais recente é People, Power and Profits: Progressive Capitalism for an Age of Discontent (Povo, Poder e Lucro: Capitalismo Progressivo para uma Era de Descontentamento), Penguin, 2020. (Do Project Syndicate, 2020, www.project-syndicate.org)

Tradução de Anna Maria Dalle Luche


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