O que Trump não disse sobre a decisão de deixar o Acordo de Paris
O racional para a decisão centrou-se nas aparentes potencialidades negativas que o Acordo traria à economia, mas não considerou outros benefícios
Da Redação
Publicado em 20 de junho de 2017 às 08h01.
Última atualização em 20 de junho de 2017 às 11h53.
O presidente norte-americano, Donald Trump , anunciou no último dia 1º de junho que seu país vai sair do Acordo de Paris e deixar para trás um esforço internacional de diplomacia que levou 20 anos para ser desenvolvido e que 195 países assinaram.
Os EUA não estarão sozinhos. Ele se juntará a dois outros países: Síria – que estava sujeita a sanções europeias – e Nicarágua, que acreditava que o Acordo era muito fraco.
Em preparação para o acordo de Paris, os EUA e a China estabeleceram expectativas para um acordo global de verdadeira cooperação internacional. A decisão do governo norte-americano de deixar o Acordo cria agora um sério vácuo na liderança global.
A China será o único país a levar o mundo a enfrentar os desafios das mudanças climáticas? Ou novas lideranças surgirão? O racional para a decisão dos EUA centrou-se nas aparentes potencialidades de implicações negativas que o Acordo traria à sua economia e aos contribuintes norte-americanos.
A retórica utilizada chegou a chamar o Acordo de "um acordo internacional draconiano" e a afirmar que “custaria” aos Estados Unidos cerca de 2,7 milhões de empregos até 2025. Esses argumentos e números foram contestados por muitos analistas.
Mas o que Trump não considerou foram todos os benefícios que o Acordo de Paris traria ao mundo e, em particular, à economia dos EUA.
1) O Acordo de Paris irá diminuir a ameaça global e diminuir a frequência e a intensidade das inundações e eventos climáticos incomuns, especialmente em zonas costeiras e ilhas, incluindo áreas norte-americanas.
2) O Acordo de Paris cria empregos: somente nos EUA há mais de 2,5 milhões de americanos trabalhando no setor de energia limpa em todos os 50 estados. Isso inclui 1,9 milhão de empregos em eficiência energética e mais de 400 mil pessoas em geração de energia renovável (solar e eólica).
3) O Acordo promove inovação nos negócios. Tesla – uma empresa de 14 anos, criada com base em uma abordagem sustentável – tornou-se em maio de 2017 maior que a General Motors, empresa de 106 anos e a maior montadora nos EUA.
4) O Acordo promoverá o comércio. Os 194 países comprometidos com o Acordo de Paris precisam de tecnologias eficientes em termos de energia renovável. Apenas poucos países estão capacitados para tal fornecimento; e os EUA são certamente um deles. Esta oportunidade de comércio é resultado direto do Acordo de Paris.
5) O setor empresarial quer o Acordo de Paris. A China decidiu investir US$ 360 bilhões em energia renovável e produzir mais de quatro milhões de veículos elétricos. Companhias petrolíferas americanas, como ExxonMobil e ConocoPhillips, reiteraram recentemente seu apoio ao acordo global para reduzir a poluição por gases de efeito estufa. Elas preferem que os EUA participem e influenciem os esforços globais para reduzir as emissões que são amplamente produzidas pelos combustíveis fósseis que geram seus resultados.
O presidente Trump também não disse que sua decisão não entrará em vigor até novembro de 2020, pois o artigo 28 do Acordo de Paris afirma que:
1. A qualquer momento, após três anos a partir da data em que o presente Acordo entrou em vigor para uma Parte, essa Parte pode retirar-se deste Contrato mediante notificação por escrito ao Depositário (Organização das Nações Unidas – ONU).
2. Qualquer decisão de retirada somente produzirá efeitos no prazo de um ano a contar da data de recebimento, pela ONU, da referida notificação de saída ou em data posterior que pode ser especificada na notificação de retirada.
3. Qualquer Parte que se retire da Convenção será considerada como tendo também se retirado do presente Acordo.
Em outras palavras, isto significa que, mesmo que Trump tenha decidido deixar o Acordo de Paris, os EUA ainda são obrigados a cumprir com seus compromissos nacionais voluntários até o momento em que possam encaminhar notificação por escrito ao Secretariado das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, o depositário do Acordo.
Isso acontecerá somente em novembro de 2019, e essa decisão entrará em vigor apenas um ano depois, que é novembro de 2020, ano em que os americanos votarão por um novo presidente.
A decisão dos EUA exige uma nova liderança para enfrentar esta questão global que preocupa a todos. E a liderança está emergindo. 20 cidades americanas, como Boston e Pittsburgh, decidiram manter seus compromissos com o Acordo de Paris.
Muitos estados norte-americanos prometeram continuar e várias empresas e universidades daquele país decidiram tornar-se neutras em carbono.
Há esperança. Com ou sem a liderança dos EUA, a comunidade mundial precisa enfrentar o desafio das mudanças climáticas.