Número de refugiados rohingyas em Bangladesh supera meio milhão
Pela primeira vez desde o início da nova onda de violência, representantes das Nações Unidas visitariam hoje o estado birmanês de Rahhine
AFP
Publicado em 28 de setembro de 2017 às 21h22.
O êxodo dos rohingyas de Mianmar ultrapassou, nesta quinta-feira (28), o número simbólico de 500 mil refugiados em Bangladesh desde o final de agosto, segundo a ONU, que não conseguiu acessar a zona como estava previsto.
Pela primeira vez desde o início da nova onda de violência, representantes das Nações Unidas visitariam hoje o estado birmanês de Rahhine (oeste), o mais afetado pela crise. No último minuto, o governo adiou essa visita, porém, evocando oficialmente o mau tempo na região.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu novamente nesta quinta a Mianmar um "cessar das operações militares" no oeste do país e "um acesso sem obstáculos para a ajuda humanitária", especialmente dirigida à minoria rohinya.
Durante um comparecimento no Conselho de Segurança, reunido em uma sessão pública pouco habitual sobre Minamar, Guterres pediu também ao governo birmanês "assegurar o retorno em segurança, voluntário, digno e duradouro" a suas regiões de origem dos refugiados que fugiram para Bangladesh.
"A realidade no terreno pede uma ação - uma ação rápida - para proteger as pessoas, atenuar o sofrimento, impedir mais instabilidade, ocupar-se das raízes do problema e assegurar uma solução duradoura", informou o secretário-geral das Nações Unidas.
A situação se tornou "um pesadelo humanitário e no âmbito dos direitos humanos", destacou.
Em alusão a testemunhos que dão conta de um "recurso excessivo à violência e sérias violações dos direitos humanos", "disparos a ermo", uso "de minas" e "violências sexuais", o chefe da ONU destacou que isso é "inaceitável" e deve "parar imediatamente".
Enquanto isso, Bangladesh testemunhava uma nova tragédia migratória.
Uma embarcação com refugiados que zarpou na noite de quarta-feira (27) de uma aldeia costeira de Rakhine naufragou perto de chegar à margem. Quinze corpos foram encontrados, principalmente de mulheres e crianças.
"Eles afundaram sob nossos olhos e, alguns minutos depois, as ondas trouxeram os corpos até a praia", relata Mohammad Sohel, um comerciante.
Sobrevivente do naufrágio, Nurus Salam estava aos prantos, depois de perder sua mulher e um filho.
"O barco atingiu algo quando se aproximava da praia e, então, ele virou", conta, em estado de choque, a um repórter da AFP.
Guerra de informação
Minoria muçulmana do oeste de Mianmar, os rohingyas fogem de uma campanha de repressão conduzida pelo Exército birmanês após ataques de jovens rebeldes desse grupo, em 25 de agosto passado.
A ONU considera que o Exército birmanês e as milícias budistas conduzem uma limpeza étnica contra esta comunidade no estado de Rakhine.
O êxodo dos rohingyas para Bangladesh, uma nação pobre do sul da Ásia de maioria muçulmana, paralisou o país.
Nos gigantescos campos de refugiados ao longo da fronteira, as autoridades e as ONGs estão sobrecarregadas pela maré humana e se preocupam cada vez mais com os riscos para a saúde. As condições atuais são propícias para o aparecimento de surtos de cólera, disenteria, ou diarreia.
Em Rakhine, do lado birmanês, dezenas de aldeias foram reduzidas a cinzas, e milhares de rohingyas estariam deslocados, ou escondidos nas florestas, sobrevivendo com pouca comida e sem ajuda médica.
Alvo de críticas, Mianmar denuncia um viés pró-Rohingya da comunidade internacional e destaca os quase 30.000 budistas e hindus que também foram deslocados desde o final de agosto, em razão da crise.
Com grande dificuldade, a líder birmanesa, Aung San Suu Kyi, tenta preservar um equilíbrio frágil com um Exército muito poderoso. Em discurso na semana passada, a Prêmio Nobel da Paz garantiu estar aberta a um retorno dos refugiados, mas de acordo com critérios que permanecem ambíguos.
Maior população apátrida do mundo, os rohingyas são tratados como estrangeiros em Mianmar, um país mais de 90% budista. Vítimas de discriminação, não podem viajar, nem se casar sem autorização. E não têm acesso ao mercado de trabalho, ou a serviços públicos, como escolas e hospitais.
Os recém-chegados em Bangladesh se somam aos 300 mil refugiados rohingyas que já haviam buscado abrigo no país em outros episódios de violência e perseguição.
Reconhecendo suas limitações diante dessa crise humanitária, Daca relaxou suas restrições às ONGs e autorizou 13 organizações nacionais e internacionais a atuarem nos acampamentos por uma janela máxima de dois meses.