Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, que defende a aprovação do acordo com o Mercosul (Frederik Florin/AFP)
Repórter de internacional e economia
Publicado em 18 de dezembro de 2025 às 05h00.
Última atualização em 18 de dezembro de 2025 às 06h31.
Presidentes e primeiros-ministros dos 27 países da União Europeia fazem uma reunião do Conselho Europeu que definirá o futuro do acordo comercial com o Mercosul. O encontro começou às 10h em Bruxelas (6h em Brasília).
O avanço do acordo é marcado pela incerteza. Tanto que o tema nem foi citado na pauta inicial do encontro, realizado a cada três meses.
Para tentar aumentar as chances de aprovação, na noite de quarta-feira, autoridades europeias aumentaram ainda mais as salvaguardas para proteger mercados europeus de possíveis altas de importação.
Neste modelo, caso os produtores de determinado item avaliem que a importação está subindo muito ou os preços caíram além do ideal, poderá ser aberta uma investigação pela União Europeia, que pode rever a retirada da tarifa ou aplicar outras medidas.
Entre as mudanças, está a criação de um mecanismo de resposta mais rápido. Em casos considerados sensíveis, a investigação terá de ser feita em até 21 dias. Nos demais casos, em quatro meses.
Por outro lado, o percentual que dispara as salvaguardas passou de 5% para 8%. A proteção poderá ser acionada se um produto tiver 8% ou mais de aumento no volume de importação ou uma queda de 8% ou mais no preço do item importado, comparado à média dos últimos três anos.
A UE também se comprometeu a monitorar os preços e aumentos de importação de forma mais ativa, para buscar distorções. A medida passará a valer quando o acordo entrar em vigor.
"Com esta e outras medidas, grandes esforços têm sido feitos para resolver as preocupações e pavimentar o caminho para aprovar o crucial acordo UE-Mercosul. É vital que a UE diversifique nosso comércio e parcerias estratégicas em tempos como estes", disse Lars Rasmussen, ministro das Relações Exteriores da Dinamarca.
Pela agenda divulgada, o primeiro tema do encontro será o apoio do bloco à Ucrânia. O presidente Volodymyr Zelensky fará um discurso e participará do encontro, feito a portas fechadas.
O bloco debate formas de obter recursos para ajudar a Ucrânia em sua luta contra a invasão da Rússia, em um cenário em que os Estados Unidos buscam reduzir seu apoio. Uma das possibilidades é usar ativos da Rússia que foram congelados na Europa para custear a recuperação da Ucrânia.
Em seguida, a pauta trará debates sobre os meios de financiamento da UE, a entrada de mais países no bloco, o contexto econômico global, Oriente Médio, defesa da Europa e migração.
Se for preciso, os debates poderão ser retomados na sexta-feira, 19, no mesmo horário. Segundo o site Politico, há grande possibilidade de a votação sobre o acordo seja feita só na sexta-feira.
Embora o acordo com o Mercosul não esteja na agenda oficial, autoridades disseram que o tema será debatido. "Os chefes de Estado e de governo vão debater o tema na cúpula europeia", disse Olof Gill, porta-voz da Comissão.
Caso o acordo não seja aprovado agora, levará pelo menos mais três meses para ocorrer. A próxima reunião do conselho será realizada apenas em março de 2026, pois o colegiado se reúne a cada três meses.
Na quarta-feira, véspera do encontro, houve muitos indicadores de que o tema enfrenta resistências, e que se não houver uma aprovação agora, o projeto poderá ser enterrado. França e Itália, entre outros, dizem que o tratado poderá prejudicar seus agricultores.
"Seria prematuro assinar o acordo nos próximos dias", disse a premiê da Itália, Giorgia Meloni, em um discurso no Parlamento nesta quarta-feira, 17. "Todas as medidas, embora tenham sido apresentadas, não foram totalmente concluídas."
Em uma mensagem antes da reunião do Conselho Europeu, na quinta e sexta-feira em Bruxelas, Meloni declarou que a Itália tem "trabalhado intensamente com a Comissão" em suas demandas. As medidas desejadas por Roma incluem mecanismos de salvaguarda, um fundo de compensação e mais regulamentações sobre pragas e doenças.
Meloni, no entanto, disse que isso "não significa que a Itália pretende bloquear ou rejeitar o acordo em seu conjunto. Estou muito confiante de que, no início do próximo ano, todas as condições serão atendidas".
Também na quarta-feira, o presidente francês Emmanuel Macron voltou a criticar o acordo.
"Se houver uma tentativa por parte das instituições europeias de impô-lo, a França se oporá veementemente", disse Macron durante uma reunião de gabinete, segundo a porta-voz do governo, Maud Bregeon.
"Já avisei para eles: se a gente não fizer agora, o Brasil não fará mais acordo enquanto eu for presidente", afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"Eu vou pra Foz do Iguaçu na expectativa de que eles digam sim e não digam não, mas também se disser não, nós vamos ser duros daqui pra frente com eles", acrescentou Lula durante uma reunião de balanço anual com seus ministros.
No Conselho Europeu, cada um dos 27 países da UE tem um voto. Para bloquear a aprovação, é preciso reunir ao menos quatro países que representem 35% da população do bloco.
Caso a Itália se alinhe à França, à Polônia e à Hungria, entre outros países, haveria votos suficientes para o bloqueio.
Já o apoio ao acordo é liderado pela Alemanha e pela Espanha, assim como pela Comissão Europeia.
Se não houver apoio suficiente, a votação poderá ser adiada pela Dinamarca, que preside o Conselho atualmente.
Caso a aprovação ocorra, o acordo será assinado no sábado, 20, durante a reunião de cúpula do Mercosul. A presidente da Comissão Europeia, Úrsula von der Leyen, planeja ir à Foz do Iguaçu, cidade do Paraná que recebe o evento, para oficializar o tratado.
Após a assinatura, começaria o processo de implantação do acordo, que prevê a retirada gradual das tarifas de importação, ao longo de 15 anos.
O tratado facilitará a circulação de produtos entre Brasil e Europa. Juntos, os blocos representam cerca de 722 milhões de pessoas e economias que somam aproximadamente US$ 22 trilhões.
Serão eliminadas as tarifas de importação para mais de 90% dos produtos vendidos entre os dois blocos. Para os demais, serão estabelecidas cotas de importação com isenção ou redução tarifária. A implementação das preferências tarifárias será gradual, com prazos de até 15 anos, dependendo do produto.
Se aprovado, o acordo pode gerar um crescimento de 2% na produção do agro brasileiro, o que representa um aumento de US$ 11 bilhões anuais, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
A expectativa é de que esse tratado permita ao Brasil ampliar suas exportações agrícolas para a Europa, com destaque para setores como carnes e óleos vegetais. Ao mesmo tempo, a Europa poderá vender mais produtos, como vinhos, azeites e automóveis. Cada produto terá uma redução de tarifa diferente, aplicada em uma escala de tempo específica.
Atualmente, os produtos mais vendidos do Brasil para a Europa são: petróleo bruto, café e itens relacionados à soja. Do outro lado, o país compra mais vacinas, medicamentos e autopeças