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Catalunha declara vitória em referendo de independência

Apesar dos conflitos que marcaram a votação do referendo, na madrugada de segunda-feira, o governo anunciou a vitória do sim com 90% dos votos

Catalunha: de um censo eleitoral de 5,3 milhões de pessoas, foram registradas 2,26 milhões de cédulas, das quais 2,02 milhões (90%) votaram pelo sim (Jon Nazca/Reuters)

Catalunha: de um censo eleitoral de 5,3 milhões de pessoas, foram registradas 2,26 milhões de cédulas, das quais 2,02 milhões (90%) votaram pelo sim (Jon Nazca/Reuters)

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AFP

Publicado em 2 de outubro de 2017 às 06h39.

Madri e o governo regional catalão travavam um diálogo de surdos neste domingo (1), com cada qual reivindicando a vitória após a realização do referendo de independência da Catalunha, interditado pela Justiça e marcado pela violência policial, que deixou mais de 90 feridos na região.

Já na madrugada de segunda-feira (noite de domingo no Brasil), o governo catalão anunciou a vitória do sim com 90% dos votos.

Segundo o porta-voz do Executivo regional, Jordi Turull, de um censo eleitoral de 5,3 milhões de pessoas, foram registradas 2,26 milhões de cédulas, das quais 2,02 milhões (90%) votaram pelo sim.

Durante todo o dia, a Polícia espanhola fez de tudo, inclusive a golpes de cassetete e tiros de balas de borracha, para tentar reprimir este referendo proibido pelo Tribunal Constitucional, em uma região que é um dos principais pulmões econômicos da Espanha.

Por volta das 20h locais (15h de Brasília), logo após o horário anunciado de encerramento das seções de votação, o chefe do governo espanhol, Mariano Rajoy, afirmou em pronunciamento transmitido pela TV do Palácio de La Moncloa, em Madri, que "nosso Estado de direito mantém sua fortaleza e sua vigência".

"Hoje não houve um referendo de autodeterminação na Catalunha", disse, enquanto começava a apuração.

Para ele, as forças de segurança, criticadas pela violência ao reprimir a realização da consulta, "cumpriram com sua obrigação e com o mandado que tinham da Justiça" na Catalunha, organizado por dirigentes separatistas, ao condenar o que chamou de uma "farsa".

Mas com os "milhões" de pessoas que foram votar, "nós ganhamos o direito de ter um Estado independente, que se constitua em forma de República", clamou o presidente regional catalão, Carles Puigdemont.

Ele pediu à União Europeia para se envolver diretamente no conflito que o opõe ao Estado espanhol e afirmou que Bruxelas "não pode mais continuar olhando para o outro lado", pois a situação na Catalunha "é um assunto de interesse europeu".

Diante do impasse e da atitude de Madri, cerca de quarenta organizações sindicais, políticas e sociais da Catalunha lançaram uma convocação de greve geral em toda a região para a terça-feira (3).

- "Nós conseguimos" -

Em uma seção de votação do bairro García, considerado um reduto separatista em Barcelona, centenas de pessoas estavam reunidas por volta das 20h para acompanhar a apuração.

"Nós conseguimos. Agora, vamos fechar a seção de votação, mas devemos todos permanecer. Não nos abandonem", gritou uma mulher em um megafone. A multidão respondeu: "você não está sozinha, você não está sozinha" e "nós votamos, nós votamos".

O governo espanhol "fez de tudo para nos dificultar nossa tarefa, mas finalmente conseguimos votar. As pessoas são determinadas e eles não devem nos subestimar", declarou Meritxell Casademont, um professor de 50 anos.

Desde a hora de abertura das seções, a Polícia e unidades anti-motins da Guarda Civil intervieram para apreender as urnas em Barcelona e Girona, cidade do presidente separatista Carles Puigdemont.

Em diversos locais, policiais com capacetes forçaram as portas das seções diante de militantes que entoavam cânticos separatistas durante este escrutínio que constitui, segundo o jornal El País, o "maior desafio" do Estado espanhol desde a morte do ditador Francisco Franco, em 1975.

Os confrontos deixaram pelo menos 92 feridos, dois deles com gravidade - um homem de 70 anos que teve um infarto e uma outra pessoa ferida no olho -, no total de 844 pessoas que solicitaram assistência de saúde em relação com embates com a Polícia do Estado, segundo o governo regional.

Trinta e três policiais ficaram feridos, segundo o Ministério do Interior. Alguns foram alvos de pedradas.

Em Barcelona, a Polícia investiu contra centenas de manifestantes que interditavam a via, enquanto os oficiais retiravam as urnas confiscadas e dispararam balas de borracha, segundo testemunhas.

A TV regional catalã TV3 exibiu continuamente durante todo o dia imagens de enfrentamentos entre policiais e manifestantes nas proximidades das seções eleitorais, as quais também circularam nas redes sociais.

Milhares de catalães conseguem votar

Puigdemont denunciou o que chamou de "violência injustificada", enquanto o governo central em Madri respondeu que ele e seu governo são os "únicos responsáveis" pelos eventos do dia por terem convocado o referendo, apesar da proibição da Corte Constitucional.

Um total de 319 seções eleitorais que deveriam servir ao referendo de autodeterminação foram fechadas pelas forças de ordem, segundo o governo regional, mas muitos catalães conseguiram votar, apesar de tudo, constataram jornalistas da AFP.

O governo catalão havia anunciado no último minuto da manhã deste domingo a implantação de um sistema universal de censo que permitiria votar sem importar a seção.

Em algumas situações, os eleitores votaram em cédulas impressas em casa ou sem envelope, constataram jornalistas da AFP.

"Ninguém pode roubar meu voto e a satisfação de ter votado, independentemente do que aconteça. Cheguei a chorar porque faz anos que nós lutamos por isto e eu vi na minha frente uma mulher de 90 anos que votou em cadeira de rodas", relatou à AFP Pilar Lopez, de 54 anos, na pequena cidade de Llado.

No bairro barcelonês de Nou Barris, Enrique Calvo, um aposentado de 67 anos, originário de uma região vizinha, não votou porque não quis dar "legitimidade" ao escrutínio. "Está mal administrado, tanto de parte do governo catalão, como do governo central de Madri", afirmou.

Sinal do caráter excepcional da situação em um país apaixonado pelo futebol, o FC Barcelona jogou sem torcida esta tarde. O time, um dos mais populares da Espanha, decidiu jogar a portas fechadas em seu estádio de Camp Nou contra o Las Palmas, pois a Liga de futebol recusou-se a adiar a partida.

O estádio, considerado o maior da Europa com capacidade para 99.000 pessoas, estava assombrosamente silencioso a cada jogada do capitão da equipe, o argentino Lionel Messi, e cinco vezes ganhador do prêmio Bola de Ouro da Fifa.

Uma separação da Catalunha, região com 7,5 milhões de habitantes e que responde por quase 19% do PIB do país, seria um salto no escuro, comparável ao do Brexit, lançado por um referendo realizado em junho de 2016.

Os moradores da região, onde o separatismo ganha terreno desde o início dos anos 2010, estão divididos quase em partes iguais sobre a independência. Mas os catalães apoiam majoritariamente, com mais de 80%, um referendo de autodeterminação legal, segundo as pesquisas mais recentes.

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