Barack Obama: mais alta instância judicial dos EUA pode derrubar um dos pilares da lei, o que levaria, inevitavelmente, à derrocada de toda a reforma (Saul Loeb/AFP)
Da Redação
Publicado em 3 de março de 2015 às 14h26.
Washington - Os olhares se voltarão nesta quarta-feira para a Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos, que tratará da legalidade de um detalhe da lei conhecida como "Obamacare", e decidirá o futuro da reforma do sistema de saúde que o presidente Barack Obama quer deixar como legado.
O dilema não é irrelevante: neste debate eminentemente político, a mais alta instância judicial do país pode derrubar um dos pilares da lei, o que levaria, inevitavelmente, à derrocada de toda a reforma, objetivo da oposição republicana tanto no Congresso quanto no âmbito jurídico.
"Não pensem que será o fim, ainda haverá mais ações contra o Obamacare na Suprema Corte durante décadas", prevê o professor de direito Jonathan Adler.
Em junho de 2012, o presidente da mais alta corte americana, o conservador John Roberts, salvou a lei na última hora, ao somar seu voto ao dos quatro juízes progressistas, para os quais a corte não devia se envolver em disputas políticas.
Em junho de 2014, os críticos da reforma de saúde venceram uma batalha quando a Suprema Corte estimou que nada obrigaria um empresário a pagar por métodos anticoncepcionais para suas funcionárias se isto se opunha às suas convicções religiosas.
Desta vez, assim como em 2012, os nove magistrados têm nas mãos o destino da lei, que já beneficiou mais de dez milhões de americanos.
A questão é se os milhões destes beneficiários que se inscreveram em um seguro de saúde através do site do governo na internet têm ou não direito a exonerações fiscais.
Os membros da corte "analisam um detalhe menor de interpretação da lei e não sobre a constitucionalidade de todo o texto", explicou a advogada constitucionalista Elisabeth Wydra. Mas este ponto poderia "causar danos à lei a tal ponto que teria o mesmo resultado, que a lei ficaria invalidada", observou a advogada.
'Espiral da morte'
Aprovada em 2010, a reforma pela qual o presidente democrata tanto lutou repousa em três pilares:
- a obrigação das seguradoras de dar uma cobertura de saúde ao alcance de todos os americanos, estando saudáveis ou doentes;
- a obrigação de cada pessoa ter um seguro, sob pena de multa, para permitir uma redistribuição a favor dos pobres e dos doentes: este princípio foi ratificado pela Suprema Corte há três anos;
- ajuda fiscal para permitir às pessoas com renda mais baixa ter um seguro de saúde: é este dispositivo que agora é combatido pelos opositores da reforma de Obama.
Desde a entrada em vigor da lei, em janeiro de 2014, os americanos podem aderir a um seguro de saúde em seu estado ou, caso seu estado se negue a fornecê-lo diretamente, no ministério da Saúde, que pôs à sua disposição o site na internet healthcare.gov.
No entanto, dos 50 estados da União, 34 - a maioria governada por republicanos - se negaram a adquirir "bolsas de intercâmbio", um sistema que habilita a concorrência entre companhias e os contratos de seguros.
O "Obamacare" propõe ajudas fiscais aos americanos que adquirem seguros de saúde nestas bolsas "estabelecidas pelos estados". O futuro da lei reside nestas quatro palavras.
Se a Suprema Corte decide interpretá-las em um sentido restritivo, a lei entrará inevitavelmente em uma "espiral da morte", argumenta o Conselho de Cidadãos pela Liberdade da Saúde.
"Os dias do Obamacare estão contados", avalia esta associação favorável à anulação da lei. "Uma vitória dos demandantes significará que toda a infraestrutura virá abaixo. Sem ajuda, milhões de pessoas não poderão assumir os pagamentos e simplesmente decidirão não aderir ao sistema".
Perante os demandantes - David King, um veterano do Vietnã e outros três habitantes da Virgínia -, o governo Obama defenderá nesta quarta-feira "a única leitura possível do texto", segundo ele.
Ao aprovar a lei, "o Congresso teve, sem qualquer tipo de ambiguidade, a intenção de dar uma ajuda fiscal em cada estado", explica a secretaria de Saúde, Sylvia Burwell.
Fazer uma leitura restritiva do texto teria, segundo ela, "consequências desastrosas" pela cobertura de saúde dos americanos. E levaria, segundo o especialista Steven Schwinn, a um "desmantelamento" de todo o sistema.