Francisco se confessa com a imprensa espanhola
Francisco fala de sua vida pessoal, principalmente de sua vontade de continuar comportando-se como um "pastor" e não como um "sumo pontífice"
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2014 às 18h03.
O papa Francisco concedeu uma entrevista exclusiva ao jornal espanhol La Vanguardia na qual falou de inúmeros temas, da violência em nome de Deus até sua segurança pessoal e sua noção de igreja .
Na entrevista reproduzida nesta sexta-feira por inúmeros jornais italianos, Francisco fala de sua vida pessoal, principalmente de sua vontade de continuar comportando-se como um "pastor" e não como um "sumo pontífice".
"'Era um cara legal, fez o que pôde, não foi tão ruim'. Com isso, eu me conformo", afirmou, com modéstia, a respeito de como gostaria de ser lembrado pela História.
Na entrevista, Francisco voltou a criticar o modelo econômico atual, que "alimenta uma cultura do descarte", principalmente contra os jovens e os idosos.
"A economia se move pelo afã de ter mais e, paradoxalmente, alimenta uma cultura do descarte. Os jovens são descartados quando se limita a natalidade. Os idosos também são descartados porque não servem mais, não produzem", afirmou.
"No centro de todo sistema econômico deve estar o homem, o homem e a mulher, e tudo o mais deve estar a serviço deste homem. Mas nós colocamos o dinheiro no centro, o deus dinheiro. Caímos em um pecado de idolatria", afirmou o pontífice.
O líder espiritual católico se mostrou muito preocupado com o desemprego entre os jovens que afeta a economia europeia, com países como a Espanha com mais da metade dos jovens sem trabalho.
Na entrevista concedida um dia depois do histórico encontro no Vaticano com o presidente israelense, Shimon Peres, e o líder palestino, Mahmud Abbas, o Papa revelou as dificuldades internas para conseguir organizar essa reunião.
"No Vaticano, 99% das pessoas diziam que não seria possível e depois o 1% foi aumentando (...) Não era um ato político, isso eu sempre senti, e sim um ato religioso: abrir uma janela para o mundo", explicou.
Quanto ao fato de romper padrões, assim como as rígidas medidas de segurança que cercam o Papa, ele revelou que não está disposto a mudar de atitude.
"Sei que pode me acontecer algo, mas está nas mãos de Deus", garantiu.
"Não posso saudar um povo e dizer o que quero dizer de dentro de uma lata de sardinhas, mesmo que seja de vidro. É verdade que algo pode acontecer, mas sejamos realistas, na minha idade não tenho muito a perder", brincou ele.
Violência, separação e Deus
Para o pontífice argentino, a violência em nome de Deus que vigora no Oriente Médio é "uma contradição".
Também lamentou a reação insuficiente das grandes potências em relação ao holocausto judeu durante a Segunda Guerra e defendeu o Papa Pio XII, acusado de manter uma posição passiva diante do drama que assolava o continente.
Francisco tem como projeto abrir os arquivos do Vaticano sobre esse período histórico, algo que, segundo ele, "trará muita luz".
"Não quero dizer que Pio XII não tenha cometido erros - eu mesmo cometo muitos -, mas seu papel deve ser entedido de acordo com o contexto da época", enfatizou.
Na mesma entrevista, o pontífice disse que está preocupado com os movimentos separatistas na Europa, em particular em Escócia (Reino Unido) e Catalunha (Espanha).
"Toda divisão me preocupa", afirmou o Papa.
Francisco diferenciou as independências por emancipação das ex-colônias dos impérios europeus, como aconteceu nos países americanos, e as independências por secessão como no caso da ex-Iugoslávia.
"Obviamente, há povos com culturas tão diversas que nem com cola poderiam ser unidos. O caso iugoslavo é muito claro, mas eu me pergunto se é tão claro em outros casos, em outros povos que até agora estiveram juntos", disse Francisco.