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Ex-Al Qaeda é contratado por universidade nos EUA

Descrito pelo NYT como um dos maiores recrutadores da rede de Osama Bin Laden, Jesse Morton está reabilitado e ajudará em pesquisas sobre radicalização

Jesse Morton, ex-membro da rede Al Qaeda: reabilitado, Morton agora irá ajudar pesquisadores no estudo do fenômeno da radicalização (YouTube)

Jesse Morton, ex-membro da rede Al Qaeda: reabilitado, Morton agora irá ajudar pesquisadores no estudo do fenômeno da radicalização (YouTube)

Gabriela Ruic

Gabriela Ruic

Publicado em 5 de setembro de 2016 às 11h22.

São Paulo – A consagrada Universidade George Washington anunciou nesta semana ter contratado Jesse Morton, um ex-membro da rede terrorista Al Qaeda, para seu programa de pesquisa em terrorismo.

Morton, que nasceu nos Estados Unidos, foi descrito pelo jornal americano The New York Times como um dos mais importantes recrutadores do grupo. Ele foi condenado a 11 anos de prisão em 2012, mas teve sua pena reduzida para 4 anos por conta da sua reabilitação e cooperação com o FBI e a comunidade antiterror.

Formado na Universidade de Columbia, Morton terá agora na George Washington University o papel de auxiliar a pesquisa de especialistas em segurança em dois dos maiores dilemas enfrentados hoje na luta contra o terrorismo: os processos de radicalização de indivíduos e a possibilidade de reabilitação de extremistas. E o objetivo desse programa é justamente o de estudar esses fenômenos.

“Nós ainda não descobrimos como alcançar o indivíduo que está no caminho da radicalização”, explicou o pesquisador Seamus Hughes, que também faz parte do Programa sobre Extremismo da instituição, à CNN. E é justamente por ter entrado nesse mundo e saído dele que Morton foi visto pela universidade como uma possibilidade única de compreender o fenômeno da radicalização da perspectiva acadêmica.

Essa iniciativa, embora pioneira nos Estados Unidos, não é uma novidade na academia europeia, que já inseriram extremistas reabilitados em seus quadros de pesquisadores. Ainda de acordo com a instituição, a contratação de Morton segue recomendações de autoridades americanas, incluindo o presidente Obama, de que é necessário incluir a voz dessas pessoas na batalha contra o terrorismo.

Jesse Morton

Nascido em um lar abusivo, Morton, hoje com 37 anos, foi preso algumas vezes na juventude por crimes relacionados às drogas. E foi numa dessas experiências na prisão que conheceu um radical islâmico. Começava o seu processo de radicalização.

Segundo um perfil seu feito pela CNN, Morton considerava seus colegas na rede Al Qaeda a família que nunca teve e aos poucos foi assumindo papeis cada vez mais importantes nas estruturas do grupo.

Durante uma visita ao Marrocos, contou ele à rede, foi preso e extraditado para os Estados Unidos após uma série de ameaças contra os criadores do desenho “South Park”, conhecido pelo humor ácido e irônico, que retratou o profeta Maomé em um de seus episódios.

Foi sentenciado a 11 anos na prisão, dos quais serviu quatro. Segundo seus relatos, passava horas da biblioteca da prisão e foi nessa época que conheceu uma agente do FBI que o ajudou no processo de reabilitação e o transformou em fonte de inteligência da agência americana.

“Me sinto muito culpado”, disse ele, “vi tudo o que as pessoas fizeram e saber que um dia simpatizei e apoiei isso me enoja”, finalizou.

Extremistas reabilitados

Morton não é o único exemplo de ex-membro de organização terrorista a ter se reabilitado e se tornado uma voz ativa contra o terror. O britânico Maajid Nawaz, fundador da Quillam Foundation, um centro de estudos em radicalização, é outro que seguiu por esse caminho. 

Em entrevista a EXAME.com, Nawaz contou que seu processo começou com as notícias da Guerra na Bósnia, quando foi tomado pelo luto por causa da situação da comunidade muçulmana na época. Esse fator associados a três outros (crise de identidade, o sentimento de deslocamento dentro da sociedade britânica e a ideologia) são os que ele considera como essenciais para a transformação de um jovem em radical.

Preso no Egito num momento em que o mundo lidava com os efeitos dos ataques de 11 de Setembro, Nawaz começou a ler sobre jihadistas que deixaram o extremismo no passado. Aos poucos, foi mudando a sua visão radical.

Ele hoje é ativista, escritor e político que luta contra a narrativa do extremismo islâmico. Sua história virou um livro (Radical – Uma jornada para fora do extremismo islâmico, Editora Leya) onde ele detalha a sua vida, seu papel no grupo terrorista e o caminho percorrido até conseguir se livrar das amarras ideológicas.

“Temos que criar uma marca tão atraente para os jovens quanto o extremismo islâmico se tornou”, explicou ele sobre quais seriam as melhores formas de acabar com a radicalização. “Acho que é possível que a gente consiga vencer o extremismo, mas essa é uma luta que perdurará por gerações. Não podemos contornar esse problema”, finalizou.

Radicalização x Reabilitação

O problema da radicalização ganhou os holofotes nos últimos anos, especialmente por conta do fortalecimento das atividades do grupo Estado Islâmico na Síria e no Iraque. O grupo adotou uma estratégia de recrutamento que envolve o uso redes sociais para atingir um número maior de jovens e potenciais recrutas, algo que alarmou governos em todo o mundo.

De acordo com números do International Centre Study of Radicalisation and Political Violence (ICRS), o EI chegou a contar em seus quadros com mais de 20 mil militantes ocidentais, pessoas que deixaram países como Reino Unido, Alemanha, Estados Unidos, França e Bélgica para lutar pelo estabelecimento de um califado islâmico na Síria e Iraque.

No final do ano passado, no entanto, um novo problema começou a surgir: ao se depararem com a realidade nestes dois países, muitos dos militantes tentam agora escapar e voltar aos seus países de origem.

A maioria deles é presa no momento em que cruzam a fronteira, por exemplo, mas já existem iniciativas que tentam reverter essa radicalização por meio da reinserção do indivíduo na sociedade da qual ele fugiu num primeiro momento.

Exemplo de programa com essa premissa é o conduzido pela cidade de Aarhus, na Dinamarca. Em 2014, autoridades souberam de 30 pessoas que haviam viajado à Síria. Destas, 16 retornaram para a Dinamarca.

Elas primeiro foram alvo de uma investigação para determinar o seu envolvimento em atos terroristas. Com a confirmação de que não se engajaram em atividades ilícitas, estavam aptas a serem inseridas no programa e tiveram acesso à atendimentos psicológicos, moradia e oportunidades de trabalho e estudo.

A ideia do programa, explicou a EXAME.com Jorgen Illum, comissário de polícia de Aarhus, não é a de fazer com que esses jovens deixem a sua religião e crenças para trás, mas que entendam que não há espaço para violência ou discursos de ódio. 

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