Loja incendiada durante protestos em Ferguson, Missouri (Michael B. Thomas/AFP)
Da Redação
Publicado em 26 de novembro de 2014 às 13h55.
Ferguson - A cidade de Ferguson, no estado americano do Missouri, foi sacudida por distúrbios na terça-feira, com manifestantes ateando fogo a prédios, saqueando lojas e atirando contra a polícia, após o anúncio de que o policial branco que matou um jovem negro desarmado não será julgado.
Doze prédios foram incendiados e pelo menos 150 tiros, disparados contra os agentes da ordem, afirmou o chefe de polícia do condado de St. Louis, John Belmar.
A polícia não respondeu aos tiros e 29 manifestantes foram detidos, sem o registro de vítimas, revelou o chefe de polícia.
O governador do Missouri, Jay Nixon, determinou o envio de mais homens da Guarda Nacional a Ferguson para restaurar a ordem na cidade.
"No total, teremos mais de 2.200 membros da Guarda Nacional na região. As vidas e as propriedades devem ser protegidas. Esta comunidade merece ter paz", disse Jay Nixon à imprensa.
O governador destacou que a decisão triplica os 700 homens das forças da ordem que patrulhavam as ruas de Ferguson quando começaram os protestos, na noite de segunda-feira.
"A equipe da Guarda Nacional está preparada para agir no momento em que surgirem os problemas".
Em Nova York, várias pessoas foram detidas na noite desta terça-feira, quando tentavam bloquear o tráfego na região de Times Square e no túnel Lincoln, que liga Manhattan à vizinha Nova Jersey.
"Várias pessoas foram detidas, mas ainda não temos um número preciso", assinalou à AFP um porta-voz do departamento da Polícia de Nova York.
O presidente Barack Obama condenou com firmeza a violência que tomou conta da cidade de Ferguson, afirmando que "queimar prédios, incendiar carros, destruir propriedades, colocar as pessoas em perigo não têm desculpas, são atos criminais".
Obama salientou que "jamais viu uma lei de direitos civis ou um projeto de reforma da saúde ou migratória avançar porque um carro foi incendiado". "Isto avança porque votamos, o povo se mobiliza, as pessoas se organizam. Ocorre porque vemos quais são as melhores políticas para se solucionar o problema".
O policial branco Darren Wilson, de 28 anos, matou no dia 9 de agosto o jovem negro Michael Brown, de 18, com seis tiros, quando a vítima estava desarmada e em plena luz do dia em uma rua de Ferguson.
Em entrevista nesta terça-feira, Wilson revelou que temia por sua vida quando disparou a arma - pela primeira vez em serviço em Ferguson - contra Brown.
"A razão para ter a consciência limpa é que sempre agi da maneira correta", disse Wilson à ABC News. "Ele era um homem forte, que poderia me matar".
O advogado da família da vítima denunciou nesta terça-feira "uma decisão injusta".
"Nós nos pronunciamos contra esta decisão porque em toda a América, seja em Nova York, Los Angeles, Califórnia ou Cleveland, jovens meninos negros são mortos por policial", afirmou o advogado Benjamin Crump durante uma coletiva de imprensa.
O caso reavivou as tensões raciais e provocou manifestações que muitas vezes terminaram em distúrbios.
A família de Brown não escondeu o desapontamento com a decisão do júri, mas pediu calma aos manifestantes.
"Estamos profundamente decepcionados que o assassino do nosso filho não tenha que sofrer as consequências de seus atos", declarou a família de Brown em um comunicado, no qual pediu "respeitosamente que qualquer manifestação seja pacífica".
Pouco depois do anúncio da decisão, manifestantes passaram a atirar objetos contra os policiais, aos gritos de "sem justiça não há paz".
A polícia informou que foi alvo de coqueteis molotov e lamentou o incêndio em uma de suas viaturas.
Protestos pelo país
Os gritos de protesto foram ouvidos em Times Square, Nova York, e na capital Washington, onde centenas de manifestantes criticaram a decisão da justiça.
Em Nova York, manifestantes exibiram cartazes com frases como "o racismo mata" e "não permaneceremos calados". Duas pessoas foram detidas nos protesto por agressão às fprças de segurança.
Na capital, centenas de pessoas protestaram diante da Casa Branca aos gritos de "mãos para cima, não atire", que virou um slogan das manifestações convocadas por diversas organizações.
Outras cidades do país, como Denver, Salt Lake City, Chicago, Los Angeles, Boston, Filadélfia e Oakland, também protestaram contra o não indiciamento do policial.
"O dever de um grande júri é separar os fatos da ficção", afirmou o promotor de St. Louis, Robert McCulloch.
"Os juízes determinaram que não há razão suficiente para apresentar acusações contra o policial Wilson", completou.
"Não há dúvida de que o policial Wilson provocou a morte de Michael Brown", disse, ao mencionar um "falecimento trágico".
Os 12 jurados, nove brancos e três negros, realizaram um trabalho "completo e profundo", escutaram 70 horas de depoimentos de quase 60 testemunhas, examinaram centenas de fotografias e ouviram três médicos legistas.
O procurador geral dos Estados Unidos, Eric Holder, declarou que prosseguirá com uma investigação federal independente sobre a morte de Brown e a atuação da polícia de Ferguson.
Por sua vez, um dos advogados da família do jovem assegurou que a decisão do júri era "uma acusação contra o sistema". "Este sistema permite que a polícia fira a mate nossos filhos sem que nada aconteça. Temos que mudar esta dinâmica", declarou Benjamin Crump à CNN.
O veredicto foi anunciado após a morte, no fim de semana em Ohio (norte do país), de um adolescente negro de 12 anos. A vítima foi atingida por tiros de policiais quando estava com uma pistola de brinquedo, o que provocou o temor de novos protestos violentos.
O episódio da morte de Brown aconteceu após a denúncia de um roubo em uma loja de Ferguson.
As testemunhas afirmam que Brown, um estudante do ensino secundário, estava com os braços para o alto quando foi baleado. Wilson alegou que agiu em legítima defesa por temer um ataque.
Senado fará audiência sobre situação dos direitos civis
O Senado americano organizará no próximo dia 9 de dezembro uma audiência sobre a situação dos direitos civis no país, anunciou o senador democrata Richard Durbin, precisando que a subcomissão sobre direitos humanos, Constituição e direitos cívicos analisará as práticas policiais e as disparidades raciais persistentes no sistema penal.
"Os acontecimentos deste ano em Ferguson destacam a necessidade contínua de se reavaliar e reformular as práticas policiais, especialmente a militarização das forças da ordem", disse Durbin.
Em Ferguson, quase 70% da população é negra, mas as autoridades políticas e policiais são majoritariamente brancas.