Equador decreta toque de recolher em torno de prédios públicos
Na última semana, estado de exceção foi decretado no Equador das manifestações contra alta de combustíveis
AFP
Publicado em 9 de outubro de 2019 às 06h51.
Última atualização em 9 de outubro de 2019 às 06h56.
São Paulo — O presidente do Equador , Lenín Moreno, decretou nesta terça-feira o toque de recolher para proteger os prédios públicos dos protestos deflagrados com a alta nos preços dos combustíveis, após tentativas de invasão do Congresso e da Casa de Governo.
A liberdade de trânsito e mobilização fica restrita entre 20H00 e 05H00 locais (22H00 e 07H00 Brasília) para as "áreas próximas a prédios e instalações estratégicas onde funcionam as sedes" do Estado, destaca o decreto firmado por Moreno.
Com base no estado de exceção decretado na quinta-feira passada diante das manifestações contra a eliminação dos subsídios e o consequente aumento dos preços dos combustíveis, Moreno determinou a restrição de trânsito nestes pontos para "manter a ordem pública".
Policiais e militares desalojaram nesta terça-feira manifestantes que invadiram a sede do Congresso, em Quito, onde ao menos 100 indígenas e camponeses conseguiram romper o cordão de isolamento feito em torno do prédio.
Os manifestantes conseguiram chegar ao plenário do Congresso, de onde foram retirados minutos depois, segundo imagens do canal Ecuavisa.
Após retomar o controle do lado de fora do Legislativo, a polícia expulsou os manifestantes de dentro do prédio, de acordo com a Ecuavisa.
"O movimento indígena junto a trabalhadores, estudantes e cidadãos conseguiu sitiar e tomar@AsambleaEcuador", escreveu no Twitter a Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie).
A invasão ocorreu após jovens com escudos de madeira com a inscrição "guarda indígena" tentarem romper o cordão de isolamento em torno da Assembleia Nacional, que já haviam tentado ocupar na véspera.
ONU e Igreja oferecem mediação
As Nações Unidas e a Igreja católica se ofereceram para mediar a crise, informou a ministra do Interior, María Paula Romo.
Com base nesta oferta, "estamos aceitando a mediação das Nações Unidas e da Conferência Episcopal (Equatoriana), que já trabalham neste momento nas aproximações" com as lideranças dos manifestantes, disse a funcionária.
"Estamos comprometidos com um processo de diálogo envolvendo aqueles que têm divergências de critério, diferenças políticas, fazendo sempre um apelo ao respeito à paz".
Pressão
Milhares de indígenas se concentram nesta terça-feira (8) em Quito, na véspera de um grande protesto contra Moreno que, encurralado, ofereceu diálogo aos manifestantes, aos quais chamou de 'irmãos'.
"Há diálogo para os irmãos indígenas, que lastimavelmente têm necessidades, e nisto estamos de acordo", disse o presidente à imprensa em Guayaquil, para onde transferiu a sede do governo devido devido à mobilização prevista para a quarta-feira.
Na sede do governo regional, onde está despachando, o presidente afirmou que "há um dinheiro que vai deixar de ser gasto, que é o que gera a eliminação do subsídio à gasolina".
"Este recurso estará destinado aos mais pobres, que fique nas mãos dos que mais necessitam", declarou.
Na quarta-feira passada, Moreno eliminou subsídios da ordem de 1,3 bilhão de dólares ao ano sobre os combustíveis mais utilizados no país petroleiro, provocando altas como a do diesel, que subiu 123%, e uma comoção social em repúdio aos reajustes econômicos.
As manifestações também afetaram a economia do país. A produção diária de petróleo, de 531.000 barris, caiu 31% devido à ocupação de poços na Amazônia.
Apesar do estado de exceção que vigora desde a quinta-feira e das ofertas de diálogo do governo, os protestos não cedem, e os indígenas que chegaram a Quito mantêm os jornalistas à distância com paus e ameaças.
"O déspota (presidente venezuelano, Nicolás) Maduro ativou, junto com (o ex-presidente equatoriano Rafael) Correa seu plano de desestabilização", disse Moreno cercado do alto comando militar, que até o momento se mantém junto ao governo.
Chamado a eleições
Atingido pelo alto endividamento e pela falta de liquidez, o Equador está envolvido na pior espiral de protestos desde 2007.
Moreno desatou a ira popular com o desmonte dos subsídios acordado com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para obter créditos de 4,209 bilhões de dólares. Consequentemente, os preços dos combustíveis dispararam.
Em pronunciamento na televisão, o chefe de Estado de 66 anos culpou diretamente Correa de tentar derrubá-lo.
No entanto, do exterior o ex-presidente negou nesta terça-feira as acusações e pediu a antecipação de eleições diante do que descreveu como uma "grave comoção social".
"Aqui não há golpismo. Os conflitos na democracia se resolvem nas urnas e é exatamente o que pedimos: antecipar eleições", disse.
Moreno e Correa (2007-2017) mantêm uma disputa pelo poder que mergulhou o governo em uma crise.
O ex-presidente vive na Bélgica e enfrenta uma ordem de captura no Equador por suposto crime que lhe atribui a procuradoria desde antes do início dos protestos, na semana passada.
Segundo as autoridades, os fortes protestos sociais, como não se viam desde que Correa assumiu o poder em 2007, deixaram um civil morto, 73 feridos (inclusive 59 militares) e 570 detidos (a maioria por atos de vandalismo).
Apoio a Moreno e pedidos de moderação
Sete países latino-americanos, entre eles o Brasil, rejeitaram nesta terça "toda ação" do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, e seus aliados para "desestabilizar" o Equador.
"Os governos de Argentina, Brasil, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Peru e Paraguai manifestam seu repúdio categórico a qualquer tentativa desestabilizadora dos regimes democráticos legitimamente constituídos e expressam seu firme apoio às ações empreendidas pelo presidente Lenín Moreno", indicou a chancelaria colombiana em um comunicado difundido em Bogotá.
Os sete países condenaram, ainda, qualquer influência de Maduro, a quem se opõem, e seus aliados para "desestabilizar" o presidente equatoriano.
Mais cedo, a secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos, chefiada por Luis Almagro, condenou os "atos de violência" registrados durante os protestos no Equador e pediu em um comunicado, que "os atores políticos e sociais resolvam suas diferenças pela via pacífica".
A chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, também pediu "moderação" e "diálogo" no país.