Equador cancela pacote de austeridade, e lideranças encerram protestos
Acordo do governo com os indígenas revoga a eliminação dos subsídios ao combustível, medida que foi adotada por solicitação do FMI e gerou os protestos
AFP
Publicado em 14 de outubro de 2019 às 06h22.
O governo do Equador anunciou no domingo à noite o fim de uma violenta crise de quase duas semanas graças a um acordo com os indígenas que revoga a eliminação dos subsídios ao combustível, medida que havia sido adotada por solicitação do FMI.
Depois de mais de quatro horas de negociação com a mediação da ONU e da Igreja Católica, as duas partes assumiram um compromisso que atende a exigência do governo indígena: a revogação do decreto que havia liberado o preço do diesel e da gasolina, o que provocou uma alta de até 123%.
Milhares de pessoas, lideradas pelo movimento indígena que protestou durante a semana, voltaram às ruas de Quito para celebrar, apesar do toque de recolher imposto pelo presidente Lenín Moreno.
A comemoração chegou ao lado de fora do Ágora, local em que os indígenas se reuniram na capital do país em uma mobilização respaldada por estudantes e alguns sindicatos.
O líder da Confederação de Nacionalidades Indígenas, Jaime Vargas, anunciou de modo imediato a suspensão dos protestos que deixaram sete mortos, 1.340 feridos e 1.152 detidos, de acordo com o balanço da Defensoria do Povo.
"O decreto 883 fica sem efeito e isto é para todo o país. Viva o Equador! Viva a paz!", declarou Vargas ao final das negociações com Moreno.
O presidente, que reconheceu o "sacrifício de cada uma das partes", escreveu no Twitter: "O governo substituirá o decreto 883 por um novo que contenha mecanismos para concentrar os recursos nos que mais precisam".
O próximo acordo "provavelmente significa que a economia não será mais tão grande quanto se esperava", afirmou à AFP o analista econômico Alberto Acosta Burneo.
Moreno assinou compromissos com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para obter créditos de 4,2 bilhões de dólares destinados a aliviar o pesado déficit fiscal que ele atribui aos gastos, endividamento e corrupção do governo de seu antecessor e ex-aliado Rafael Correa.
Em troca dos créditos, Moreno executa uma política de ajustes que, além de acabar com subsídios, prevê a redução dos direitos dos funcionários públicos, como a diminuição do período de férias (de 30 a 15 dias). O país gasta 1,3 bilhão de dólares ao ano em subsídios ao diesel e gasolina.
"O Equador tem que cumprir os compromissos com o FMI porque ninguém vai emprestar dinheiro se o país continuar gastando e vivendo com dívidas, a estratégia aplicada desde 2014", declarou Acosta Burneo, da consultoria Grupo Spurrier .
A crise chegou ao fim em pleno toque de recolher em Quito. No domingo ainda era possível observar um rastro de destruição na cidade.
No sábado, Moreno acusou seu antecessor, Rafael Correa, e o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, de estar por trás da violência. Ambos debocharam antes de acusações similares.
"Forças obscuras, vinculadas à delinquência política organizada e chefiada por Correa e Maduro - em cumplicidade com o narcoterrorismo, com gangues, com cidadãos estrangeiros violentos - causaram desalento e uma violência nunca antes vista", expressou.
Na Bélgica, onde evita uma ordem de prisão, Correa escreveu no Twitter que "Moreno não só não pode continuar governando, mas "tem que ser julgado por seus crimes!".
No poder desde 2017, o presidente enfrenta a pior crise pelas reformas que acertou com o FMI para aliviar o pesado déficit fiscal que ele atribui ao esbanjamento, ao endividamento e à corrupção no governo Correa.
Além do fim dos subsídios, as medidas preveem cortar direitos de funcionários públicos.
Os indígenas, que representam 25% dos 17,3 milhões de equatorianos, são o setor mais castigado pela pobreza e trabalham sobretudo no campo.