Trump: um dos empresários disse que participar de um projeto dessa natureza é oferecer "um serviço" a seu país (Jose Luis Gonzalez/Reuters)
AFP
Publicado em 16 de março de 2017 às 17h14.
Última atualização em 16 de março de 2017 às 17h56.
Nos Estados Unidos, empresários de origem latina oferecem seus serviços para construir o muro anti-imigrantes prometido pelo presidente Donald Trump na fronteira com o México, apesar da controvérsia e, em alguns casos, da própria consciência.
"Sendo eu um hispânico fica mais difícil", disse Michael Luera, dono de uma empresa de coleta de dados geológicos do Texas, que manifestou interesse em trabalhar no projeto, que se tornou o centro do debate sobre a imigração nos Estados Unidos. Sua decisão não foi fácil.
"Quando essa polêmica afeta todos os mexicanos, isso me afeta porque eu conheço muitos deles que não são pessoas ruins e vêem trabalhar duro", explicou esse empresário de origem mexicana, embora já pertença à terceira geração de americanos da sua família.
Para Luera, como para outros, a possibilidade de aproveitar uma obra colossal como o projeto do muro, com um custo de bilhões de dólares, faz a balança pender.
"Essencialmente, é uma decisão empresarial", opina Mario Burgos, dono de uma construtora no estado do Nuevo México.
"Obviamente quando se vê uma oportunidade ao alcance das mãos, não se pode ignorá-la", acrescentou.
"Vejo o muro da mesma forma como vejo bons vizinhos erguendo cercas", comparou, dizendo que "sempre" se sente "incomodado com tudo que é anti-imigrante".
O peso econômico do projeto atrai grandes grupos como o franco-suíço LafargeHolcim, que disse estar pronto para vender material para "qualquer projeto de infraestrutura" nos Estados Unidos, gesto que provocou o alerta do próprio presidente francês. Até o grupo mexicano Cemex adotou essa postura.
No total, cerca de 650 empresas de todos os tamanhos -incluindo 66 de propriedade de hispânicos- responderam à convocação de 24 de fevereiro do Departamento de Segurança Interior (DHS) de pré-qualificação para a obra.
A chamada formal de ofertas, prevista para esta quarta-feira, foi adiada para uma data ainda não determinada, informou o DHS, garantindo que o interesse pelo projeto é "alto".
Algumas empresas, no entanto, parecem hesitar.
A construtora irlandesa CRH disse que não tinha interesse no projeto. A americana BTP 84 Lumber causou rebuliço com seu anúncio publicitário em que seus operários constroem uma grande porta no muro para uma mãe e sua pequena filha passarem.
No entanto, alguns pequenos e médios empresários americanos, procurados pela AFP, consideraram que este não é o caso para uma crise de consciência.
Um deles, que pediu anonimato porque há "muitos loucos por aí" disse que participar de um projeto dessa natureza é oferecer "um serviço" a seu país.
"Sou hispânico, mas sou americano acima de tudo e quero assegurar-me de que todos cumprem a lei", disse o empresário.
"Se eu tiver que ir à guerra e matar alguém, estarei fazendo apenas meu trabalho. Se o governo precisar de construtores para fazer o muro, farei o meu trabalho", acrescentou o veterano das guerras do Iraque e do Afeganistão.
Outros demonstrar irônicos em relação ao assunto.
"É sério que há uma polêmica? Eu não sabia que tinha pessoas irritadas por causa do muro. Você sabe quem são", disse Marc Uribe, responsável por uma construtora da Califórnia.
Outros alegam que todos os grandes projetos de infraestrutura sempre geram polêmica.
"Todos os projetos, seja de uma central nuclear, uma rodovia, o estacionamento de um aeroporto ou um bairro precário em uma cidade, sempre geram controvérsia", opinou Joe Moreno, que tem com seu irmão Alfonso uma empreiteira no Arizona.
"Se evitássemos cada projeto controverso, não teríamos trabalho", completou.
"Não somos nem a favor nem contra o muro", disse Moreno, explicando que participar do projeto "ajuda a pagar as contas".
E admite que sua origem hispânica pode ser uma vantagem em um projeto que atinge duas culturas."Temos consciência dos problemas que podem surgir em cada lado do muro, entendemos os hábitos e o idioma dos dois lados da fronteira".